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    Sui Generis
    Sui Generis
    POR Camila Yahn

    via @randreh

    collage-generos-by-©RomeuuuColagem by @romeuuu

    Essa coisa de “gêneros” _que foi pauta para o mais-que-querido-e-competente repórter Luigi Torre aqui no FFW_ sempre esteve muito acesa na minha cabeça. Do ponto de vista clínico, entendo pouco do assunto, quase nada: não sei se o “gênero” é uma condição biológica, uma filosofia, um estado de espírito, uma escolha. Mas sei que, pra mim, a “diferença” sempre foi algo absolutamente natural, parte da minha órbita.

    Tudo isso via cultura pop.

    A minha primeira lembrança do tema vem do Neil Gaiman _escritor norte-americano_ e de sua série de quadrinhos “Sandman”. Um dos personagens, Desejo, era representado por uma figura masculina/feminina. No roteiro, ela(e) é irmã(o) gêmea(o) de Desespero. Desejo vive num lugar chamado “O Limiar”, e é descrita(o) como sendo tudo aquilo que você já quis ter. Seja lá quem você for. Seja lá o que você for. Por isso Desejo não pode ter gênero. Tão simples, mas tão genial: uma entidade assexuada, mas que pode assumir o sexo que quiser, e que habita um local que fica na fronteira de tudo. Uau.

    Também cresci soterrado em pilhas e mais pilhas de mangás e animes, sonhando com sushis, sashimis, bonsais, hideogramas, hentais, yaois. No Japão, a questão do gênero sempre foi abordada com um requinte extra de vanguardismo. O próprio teatro kabuki, em sua gênese no século 16, tinha homens no palco com vestimentas femininas. Tecnicamente, o estilo de desenhar japonês não existe sem a androginia, sem a transvestimenta, sem esse gender bender _para os mangakás, virar o sexo do avesso é via de regra. Até mesmo os mais conservadores, tipo o Osamu Tesuka, criador de “Astro Boy” e apelidado de “o deus do mangá”, escreveu uma história intitulada “A Princesa e o Cavaleiro”. Nela, a personagem feminina precisa fingir que é um homem para ter o direito de ocupar o trono. O desenho passava aqui no Brasil em meados dos anos 1980, e foi um grande sucesso.

    Uma coisa que nunca chegou aqui no Brasil foram os astros do J-POP e do J-ROCK, movimentos musicais importantíssimos no Japão. Uma pena.  Eles dão uma aula de cross dressing, deixam nosso querido _e valente!_ Laerte no chinelo. Mana, guitarrista do grupo Malice Mizer, era macho de respeito que se transvestia de gothic lolita pra tocar. Ficava parecendo uma bonequinha, um bibelozinho possuído por Jimi Hendrix (em suas devidas proporções, claro).

    Descendo a ladeira da memória, vieram Shun em “Cavaleiros do Zodíaco”, Leiga e Hyouga em “Shurato”, “Bronze & Zetsui”, Olho de Peixe em “Sailor Moon”. E a pergunta: Eram homens? Eram mulheres? Eu ainda era muito, muito novo quando vi o Boy George na televisão pela primeira vez. Foi um baque. Pow. E de novo: Era uma mulher? Era um homem? Era um gênio. Daí fui buscar gente que tinha feito isso antes mesmo de eu nascer, tipo Annie Lennox e David Bowie, e outras épocas _como os anos 1970_, onde “todo tipo de amor era válido”.

    Veio também o Marilyn Manson, primeiro em sua fase horrenda, macabra _”Portrait of an American Family” era um pesadelo em forma de disco. E, de repente, ele e sua trupe (destaco aqui Twiggy Ramirez, sempre vestido de boneca assassina) se tornaram praticamente uma religião. “Mechanical Animals” foi lançado bem na época em que eu estava começando o colégio. Todos os colegas de sala tiravam o maior sarro, esbravejavam ódio contra o artista que aparecia na capa do disco nu, sem órgãos genitais, com peruquinha vermelha e seios brotando de uma fisionomia alienígena. A raiva da turma só era maior quando o vídeo de “Dope Show” ficava em #1 lugar no Disk MTV. E foram muitos dias de raiva: o clipe não saía do topo das paradas aqui no Brasil. Na MTV também ouvi sobre o Placebo, “uma banda que tinha um vocalista andrógino”. E o VJ abria um parêntesis pra explicar o que significava androginia: andros (homem) + gyne (mulher).

    “Constantine”, HQ que foi adaptado para o cinema com casting estelar, se tornou uma referência máxima: no cinema, a über andrógina Tilda Swinton interpreta com louvores o arcanjo Gabriel. Porque um anjo, como todos sabem, não tem “gênero”.

    Também é muito fresca a lembrança que eu tenho da Marcelona na porta dos primeiros clubs que frequentei em São Paulo, no comecinho dos anos 2000. Again: Era um homem? Era uma mulher? É uma das pessoas mais queridas que já conheci. O mesmo aconteceu com o Johnny Luxo. Ainda morava em Santo André (cidade que eu carinhosamente apelidei de San Andreas) quando Regina Casé apresentou Johnny no programa “Brasil Legal”. A pergunta que me fiz, você já sabe. Ele se tornou um ídolo, hoje um grande amigo. O mesmo vale para o performer Alisson Gothz, que se aproxima muito dos astros da montação J-POP.

    E essa nova geração de gender benders? A revista “Candy”, Andrej Pejic, Lady Gaga, Lea T., Felipe Abe, Uni Corrêa, Renata Bastos, Caio Tavares, a trupe dos Underaged Heartbreakers (não poderia deixar o vampiro-mirim Adler David de fora dessa lista) até a Katylene, que faz uma transgressão apenas virtual de “gênero”. Não importa se são meninos, se são meninas, se são gays, se são heteros. Que tipo de pergunta é essa??

    Oscar Wilde escreveu num dos seus livros mais legais, “O Retrato de Dorian Gray”, que quem se define, se limita. Isso sim é filosofia pra vida. É um mantra de tolerância que todos deveriam praticar. Essa conversa sobre “gêneros” na moda _no mundo_ não é novidade, mas muito me interessa. Se interesse também.

    Aprendi em casa que as outras pessoas são “gente como a gente, filho”.

    Essas palavras do meu pai ecoam até hoje.

    Muitas vezes num som ensurdecedor.

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