O cineasta alemão Julian Rosefeldt conheceu a atriz Cate Blanchett há sete anos em uma de suas exposições em Berlim, através de um amigo em comum. De cara, os dois logo quiseram trabalhar juntos em algum projeto e, passado algum tempo, nenhuma ideia surgia. “Três anos depois, quando estava pensando e pesquisando para outro projeto, comecei a reler os manifestos que eu conheci durante meus estudos e imediatamente imaginei que Cate poderia não só lesse esses textos, mas também pensar neles, ‘tornando-se’ eles”, conta Rosefeldt à Another.
Os manifestos em questão são de importantes pensadores (majoritariamente homens e jovens) do século passado, tais como Karl Marx, Guy Debord, Dziga Vertov, Kazimir Malevich, Lars von Trier, entre tantos outros. Ambiciosos, desejavam provocar mudanças estruturais através de seus escritos sobre arte, arquitetura, cinema e literatura, alguns desses especialmente atrelados a diferentes movimentos, como Futurismo, Expressionismo Abstrato, Arte Pop, Surrealismo, Dadaísmo e outros.
Rosefeldt elencou cerca de 53 manifestos e fez um “texto-colagem”, como ele mesmo define, resumindo e juntando diversos excertos e, de quebra, adaptando-os à contemporaneidade. “Perguntei-me se essas ideias são aplicáveis e relevantes ainda hoje e pude perceber que, sim, são absolutamente relevantes”, conta. Então, juntou-se a Cate e começaram a elaborar suas personagens. Num primeiro momento, pensaram em várias, e então foi necessária uma negociação, já que Cate interpretaria todas elas. “Lembro-me que ela disse: ‘Podemos fazer seis personagens?’. Respondi: ‘Podemos fazer 20?’. E no final, fizemos 13”.
Isto porque eles teriam apenas 11 dias para a gravação em Berlim. Dois meses antes, reuniram-se em Nova York para alinhar todas as personagens, decidir qual sotaque seria melhor para cada um, etc. Segundo ele, Cate sempre surpreendeu na forma como ela “esculpia” a ideia das personagens, às vezes até na primeira tomada. “Ela é muito, muito boa!”.
O resulto pôde ser visto primeiramente em 2015, na vídeo-instalação Manifesto, em que se via treze telas, cada uma contando a história de uma personagem: um mendigo, uma agente, uma funcionária de fábrica de incineração de lixo, uma CEO, uma punk, uma cientista, uma oradora fúnebre, uma manipuladora de marionetes, uma mãe de família conservadora, uma coreógrafa russa, uma jornalista e uma professora.
Rosefeldt quis alcançar um público ainda maior com tal projeto. Ele queria transpô-lo para o cinema, porém, não bastava apenas “anexar” um filme ao outro. “Eu e o Bobby Good, editor o filme, pensamos à princípio que seria fácil colocar a filmagem de forma linear depois disso, mas achamos que foi totalmente o oposto”, divide ele, acrescentando que o começo do filme ficou extremamente chato quando editado em capítulos cronológicos.
“Quando você vai ao cinema, você espera ‘ser pego pela mão’ e guiado pela narrativa”, confessa. “No entanto, não tínhamos uma narrativa linear, então inventamos uma narrativa visual, uma viagem visual, para inserir as pessoas nesse universo. Nos primeiros dez minutos do filme, sempre há um grande suspiro, como ‘O que é isso?’, e então parecemos hipnotizar o público, incentivando-os a permanecer até o final”.
Em São Paulo, Manifesto está em cartaz na Galeria Olido, no centro, e na SPCINE Roberto Santos, no Ipiranga.