Há muito me apaixonei pela música brasileira de tal forma que, em alguns momentos, chego a ter aquele “pré” conceito das músicas vindas “de fora”, rsrs…
Desde moleque, aos 13 anos, eu ouvia e colecionava música popular brasileira e música clássica. A Editora Abril lançava periodicamente uma coleção de compositores clássicos. Apaixonei-me de imediato e passei a ouvir sem parar Mozart, Chopin, Beethoven, Mendelssohn, Bach, Tchaikovsky e todos os outros da coleção, e os brasileiros Carlos Gomes e Villa Lobos, o meu preferido.
Minha adolescência foi construída a partir de um repertório que ia do clássico ao popular.
Morava em S.J.do Rio Preto, uma cidade do interior, de porte médio, mas rica no café, cana de açúcar e laranja, e com muitas faculdades e universidades. Talvez por isso tornou-se um roteiro para a cena do teatro e da música. Tive o privilégio de ouvir e ver ao vivo grandes nomes da MPB da época.
Imagina assistir ao vivo Elis Regina cantando “Essa Mulher”, debruçada ao piano de Cesar Camargo? E, pasmem, numa sala de cinema. Gal Costa no histórico show Gal Tropical em um estádio do Clube Palestra Itália.
Nesse mesmo local, vi pela primeira vez na vida Fafá de Belém, linda, com um vestido até o pé, só de alças, descalça. De repente ela desce do palco e sai correndo pela platéia. O povo vai ao delírio! Pura sedução, volúpia. Uma cena inesquecível. Ali pude ver também Alcione, Paulinho da Viola e vários outros.
Na sede social do Automóvel Clube – na época o mais chique da cidade – quase morri de emoção no show Realce, de Gilberto Gil.
Assim foram meus anos de juventude, dos 13 aos 17. Eu viajava para ver shows. Ribeirão Preto, Bauru, onde fui escondido para assistir ao mito Mercedes Sosa, a cantora da esquerda revolucionária do momento (ainda vivíamos a ditadura). Em São Paulo, numa catarse, assisti Bethânia pela primeira vez no Teatro Tuca. Paixão e emoção eternas! Posso afirmar, sem dúvida, que sou um sortudo. Nasci na hora certa.
Conheci de perto e ao vivo, Tom, Chico, Caetano, Nana, Vinícius, e tantos outros que esta lista não terá fim.
Já morando em São Paulo, no início dos anos 80, não perdia nada que acontecesse na cidade. Tudo! De Elis, minha maior paixão sem dúvida. E vi tudo de tudo. Ney Matogrosso, Ângela Maria, Rita Lee, Cauby, e por aí vai.
Em meados dos 80 começava despontar a nova geração, Marina, Ângela Ro Ro, Zizi Possi, Joana, Cazuza e tantos e tantas outras…. O pop/rock explode com Barão Vermelho, Paralamas, Lulu Santos, Legião Urbana com Renato Russo, Titãs, RPM, e a lista não termina. E Cassia Eller? O primeiro show da Marisa Monte no auditório do MASP.
Depois veio Brown, Daniela, Ivete, Margareth, Vanessa e meu novo amor, Maria Rita. E esse encontro faz 15 anos.
Com Maria fiquei ao seu lado nos dois anos iniciais de sua carreira. Aparecimento fulminante no cenário musical no inicio dos anos 2000. Ficava no camarim cuidando dela, vestindo, despindo, em todos os espetáculos. Como um amigo intimo, um irmão. Num destes momentos de troca no camarim, ao passar as mãos para fechar sua roupa, percebo que sua barriga estava diferente. Na hora fiz até uma brincadeira com ela. Nove meses depois nascia Antônio, seu primeiro filho. E desde lá nunca fiquei longe desta minha paixão.
Há dois anos, meu Irmão, o DJ Zé Pedro, muitas e muitas vezes mais apaixonado que eu por todos esses personagens e por toda história da nossa música, tanto que de bancário virou DJ, historiador e memorialista de todos esses momentos, me apresenta Alice Caymmi – paixão à primeira vista, claro. Sou ariano, com ascendente e lua em Áries. Da platéia, onde estive a vida toda, pulei para dentro do palco, de cabeça, num mergulho que muitos acharam que eu estaria largando a moda, minha antiga e longa paixão e profissão, para me dedicar à direção de espetáculos.
Criei e dirigi seu primeiro show e DVD. Um lindo trabalho que teve a estréia no histórico Teatro Itália, que um corajoso amigo, Erlon Bispo, havia pegado para restaurar e colocar em operação. Mais uma destas histórias da cidade que ficam perdidas e esquecidas. Com o espetáculo pronto e super bem criticado, viajamos para várias cidades. Rio, Recife e Salvador. E justo ali, na terra que adotei como minha casa, surge um segundo convite, agora do meu amigo dos carnavais de rua, dos ensaios e saraus. Carlinhos Brown me chama para dirigir seu novo Sarau, e em seguida um novo espetáculo para teatro. Duas experiências lisérgicas e até antropofágicas para mim. Uma emoção sem fim.
Novamente surge Zé Pedro com sua conversa picante, envolvente, e desata a falar sem parar para respirar de um novo projeto. Um CD para os 40 anos de Fafá de Belém. Lá fui eu, mergulhar neste universo, que naquele momento seria novo para todos, incluindo ela própria. Romper, esta era a palavra da nossa conversa.
Deste show nasceu um DVD que está saindo do forno, uma turnê que começa ganhar o país. Fafá ganha o Prêmio da Música Brasileira como melhor cantora neste ano. Muita alegria e orgulho por participar deste momento, mais uma vez. Se alguém me dissesse que um dia estaria dirigindo aquele vulcão que assisti aos 16 anos, nem eu acreditaria.
E agora, cá estou eu, mergulhado em um novo projeto que nasce daqui a alguns dias: um novo artista, um novo super talento, Zé Manoel. Um jovem pernambucano nascido e criado nas margens do Rio São Francisco. Novamente e pela quarta vez criar um espetáculo e novamente com a proteção do Teatro Itália. Meu altar, meu recanto. Um laboratório mágico e misterioso.
A partir do CD “Delírio de um romance a céu aberto” eleito pela crítica como um dos 10 mais importantes de 2016, lançado pelo selo Joia Moderna. Zé Pedro me dá de presente, não só Ze Manoel, um artista único, mas um poeta, sensível, especial. E a possibilidade de ter em cena dividindo o palco com ele artistas que sempre admirei. Alguns até conheço pessoalmente, outros não, uns acabei de descobrir.
Fafá que já virou irmã, Célia era do meu círculo de amigos nos anos 80, Virgínia Rodrigues que chorei quando vi e ouvi pela primeira vez! A menina que conheci e virou uma linda mulher e cantora, Mariana Aydar. Ná Ozzetti, Jussara Silveira, Juçara Marçal, Arthur Nogueira, Ava Rocha, Juliana Perdigão, Isadora Melo, Carol Guimarães… Meu Deus, que sorte eu tenho realmente!
Que destino esse me colocar no caminho de tanta gente incrível e especial. Neste novo projeto, de uma só vez, 12 nomes mágicos. E eu ali. Podendo sonhar e fazer as pessoas se emocionarem como eu me emociono.
A moda entrou na minha vida absolutamente por acaso. Quando saí do interior, sonhava ser cientista, trabalhar com o novo, redescobrir o mundo. Estudar ciência da computação seria um caminho, e meu sangue turco já gostava de Comércio Exterior.
E não é que o destino me deu uma rasteira? Puxou-me para o outro lado da rua, e conheci Regina Guerreiro. Com ela e por causa dela, a moda virou minha paixão. Uns dizem obsessão, outros, destino. Mas não importa o que seja. Sei que faço o que faço há mais de 30 anos por puro Amor e sentimento de Alma. Um compromisso.
E sinto que a música está ganhando este mesmo movimento. Um ciclo que começa a se repetir na minha vida. Nasci apaixonado por música, e agora posso viver essa paixão do lado de dentro do coração. Sinto o pulsar que vem de dentro, se espalha e contamina tudo a minha volta. Toma conta da minha cabeça, do meu ar.
Música e moda. Moda e música. Por que não?
A coluna Meu Querido Diário, de Paulo Borges, passa a ser publicada neste espaço. Paulo vai contar histórias de sua vida, sua trajetória, seu amor pela moda e pela música, o encontro com seu filho Henrique, entre outros contos saborosos como exercícios de um livro que está em andamento.