Hoje a Gucci está entre as três primeiras marcas mais poderosas do mercado de luxo e é constantemente elogiada pelo trabalho que Alessandro Michele tem feito como diretor criativo. Esse sucesso fenomenal junto com a habilidade de criar conteúdo quase diário em torno das ações da grife praticamente deleta de sua história o passado da Gucci, que tem uma das histórias mais absurdas entre as casas de luxo. Traições entre irmãos, ambição desmedida, golpes e até assassinato fazem parte do legado da marca fundada por Guccio Gucci em 1921, em Florença.
As reviravoltas são tantas que renderam o livro The House of Gucci: A Sensational Story of Murder, Madness, Glamour and Greed, muito bem escrito por Sara Gay Forden. Como uma boa história de suspense, é daquelas leituras que você só larga quando acaba. Era só uma questão de tempo para que ele virasse um filme.
O diretor Ridley Scott está por trás do longa e vai focar num pedaço da longa história da Gucci: no assassinato de Maurizio Gucci, então chefe da empresa, encomendado por sua ex-mulher, Patrizia Reggiani. E para viver a “viúva negra”, Scott chamou ninguém menos do que Lady Gaga.
Era uma manhã comum no ano de 1995, quando Maurizio, aos 46 anos, chegou em seu escritório. Ao subir as escadas, levou três tiros nas costas e um na cabeça. O porteiro levou dois tiros e sobreviveu. Maurizio era neto do fundador da marca.
A história da Gucci realmente rende um filme do melhor suspense: intrigas, ambição, traição e assassinato.
Em 1995, Maurizio Gucci era o chefe da Gucci – ele havia herdado 50% da empresa após a morte de seu pai Rodolfo em 1983. A marca vinha perdendo prestígio devido ao excesso de licenciamento de seu famoso logotipo G duplo. Maurizio tinha um plano para restaurar seu lugar como marca de luxo, focando no requintado trabalho artesanal com o qual a empresa foi construída. Por anos ele brigou com seu tio e seus primos que, juntos, era donos dos outros 50%, até que ele bolou um plano para compra-los com a ajuda da Investcorp. Mas ele administrou mal os negócios e acabou vendendo a marca totalmente para Investcorp em 1993, por US$ 120 milhões (hoje ela vale US$ 1 bilhão).
Na paralela, ele havia saído de casa para viver com Paola Franchi, uma mulher 10 anos mais nova que Patrizia. Ela não apenas sentia a dor da traição, mas morria de medo dele ter filhos com a nova mulher, com receio que suas filhas teriam que dividir sua fortuna. “Eu estava brava com Maurizio por muitas, muitas coisas naquela época”, diz Reggiani em uma entrevista ao The Guardian. “Mas acima de tudo, isso. Perder os negócios da família. Isso foi estúpido. Foi um fracasso”. Então, ela vira a cabeça e fala em tom tão baixo que a repórter mal conseguia ouvir: “Ele não deveria ter feito isso comigo”.
Reggiani foi a primeira suspeita porque ela já havia ameaçado de matar seu marido outras vezes em discussões ou recados na secretária eletrônica. Mas sem evidências, o crime ficou em aberto por dois anos até que uma denúncia a levou para a prisão – com ela foram os outros participantes: a amiga, o assassino e o motorista.
Obcecada por dinheiro, poder e glamour, Patrizia mostra que esses mais de 10 anos encarcerada não a mudaram muito. Em 2014, ela disse ao jornal italiano La Repubblica que esperava voltar a trabalhar na Gucci. “Eles precisam de mim. Ainda me sinto como uma Gucci – na verdade, a maior Gucci entre todos”.
Ao sair da prisão, ela foi trabalhar como consultora de design numa joalheria de Milão chamada Bozart. Trabalhar era uma condição da justiça para ela poder sair da prisão, mas ela chegou a recusar sua primeira negociação de liberdade em 2011, de acordo com a imprensa italiana, porque a própria ideia de trabalhar a terrorizava. “Nunca trabalhei na minha vida e não pretendo começar agora”, disse ao seu advogado.
Ainda antes, quando os advogados da Gucci propuseram a Reggiani um acordo de divórcio de 2,5 milhões de libras mais 650.000 libras por ano, ela o rejeitou, dizendo que isso era “uma mera tigela de lentilhas” e conseguiu um acordo melhor. Suas filhas, hoje com cerca de 40 anos, herdaram a fortuna milionária de Maurizio, além de propriedades em Nova York, Saint Moritz e Milão. Ainda assim, a viúva negra se declarou falida, “uma pessoa que não tem nada”.
Patrizia também não admite que esteve presa, referindo-se aos seus anos na cadeia “uma estadia na Vittore Residence”.
Realmente, Patrizia é coisa de filme. O longa de Ridley Scott deve chegar aos cinemas no final do ano que vem.