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    Neo western: como a cultura pop vem desconstruindo a imagem do caubói?

    Da moda ao modão, elementos western e da cultura interiorana são reimaginados 

    Neo western: como a cultura pop vem desconstruindo a imagem do caubói?

    Da moda ao modão, elementos western e da cultura interiorana são reimaginados 

    POR Gabriel Fusari

    O fascínio pelo universo western tem despertado desejo e curiosidade. Seja nas ruas ou na internet, é cada vez mais presente a estética e seus elementos nas narrativas mais diversas possíveis. O chapéu, bota, espora, calça jeans e cinto com fivela de respeito são alguns dos elementos que vem à mente quando a gente fala sobre a imagem do cowboy que se formou com o cowboy da Marlboro, garoto-propaganda da marca de cigarros, que criou e firmou o imaginário coletivo de masculinidade e rebeldia por trás do visual da figura do cowboy.

    Além dele, o cinema também teve papel estratégico na construção dessa imagem. 

    De O Grande Roubo do Trem (1903) até os dias de hoje, são inúmeros os filmes que derivam do gênero do velho oeste, sejam eles os clássicos bang-bangs ou os que buscam ser disruptivos na abordagem do tema. Primeiro exemplo não poderia deixar de ser O Segredo de Brokeback Mountain (2005). Ele foi um expoente entre os filmes que abordaram esse imagético revolucionário. Incompreendido na época, inspirou mais tarde narrativas e histórias que baseiam-se na mesma linha de raciocínio. 

    O impacto foi tanto que chegou no Brasil pelas novelas. América, novela do mesmo ano, trazia um plot semelhante para a televisão brasileira – quase protagonizando o primeiro beijo entre dois homens na teledramaturgia.

    O impacto retumbante inspirou o diretor espanhol Pedro Almodóvar em seu novo filme Strange Way of Life récem-lançado em Cannes. A trama trata-se de uma resposta a Brokeback Mountain, remontando o conflito amoroso de dois amigos, o rancheiro Silva (Pedro Pascal) e Jake (Ethan Hawke), com o faroeste como plano de fundo e figurinos assinados por Anthony Vaccarello, diretor criativo da Saint Laurent, que assina a co-produção do filme. Além da narrativa, a desconstrução também é feita pela estética. Vaccarello brinca com o visual dos peões ao vesti-los roupas coloridas, gravatas com padronagens e laços.

    Poster de Bacurau (2019)

    OUTRAS NARRATIVAS 

    Desde sempre, tudo que se entende de western é associado ao conservadorismo. O Diplomatique descreve que desde que os sulistas perderam a Guerra Civil Americana, uma “nostalgia impregnada de amargura”, que remonta a um passado idealizado onde a trilha sonora é de um patriotismo norte-americano usado como uma arma e um escudo contra a ameaça à identidade nacional. 

    O filme Ataque dos Cães (2021) de Jane Campion traça esse paralelo. Ganhador do Oscar de melhor direção, o filme conta a história de dois irmãos muito ligados que, quando um deles se casa, o outro fica enciumado com a nova relação. A partir disso ele começa a provocar a cunhada por meio do filho dela, com provocações machistas e se insinuando para ele. Nesse processo, a diretora expõe sua visão crítica a masculinidade tóxica nas relações de poder ao mostrar o contraste oculto que permeia a imagem do caubói. 

    Já a serie Yellowstone (2018), que se encerra agora na quinta temporada, leva a crítica para um tom mais político. A serie da Paramount fala sobre um grande fazendeiro estadunidense que busca proteger seu latifúndio a qualquer custo, passando por cima de  direitos de nativos originários até de empresários. Succession dos fazendeiros, a série espelha muito o que se vê hoje na vida real. 

    No Brasil, ainda que derivada da estética do faroeste, as histórias de vaqueiros mais recentes tiveram seu destaque por conta de Bacurau (2019), filme de Kleber Mendonça Filho que traz o bangue-bangue para o território brasileiro ao abordar populismo e políticas de extermínio. Em outra região, Pantanal (2022) apresentou a valorização do bioma por meio do impasse de terras e seres místicos. Bem como a atual novela das 9,  Terra e Paixão (2023) que tem em sua trama temáticas sobre terra e demarcação de latifúndios. 

    Orville Peck

    MÚSICA

    Apesar dos maiores hits country remetam ao conservadorismo, o ritmo também apareceu em trabalhos subversivos, em que cantores pop davam uma nova roupagem e significado para a estética.  Trabalhos musicais como o de Lady Gaga com Joanne (2016) e Lil’Nas X lançando seu Old Town Road (2019), além de Orville Peck.  Enquanto Joanne apresentava a estética de forma lúdica e intimista, Lil’Nas e Orville brincavam com a sexualidade, fetichismo e essa virilidade do peão. Franjas, brilho, máscaras, couro e chapéu dão o tom.

    Por aqui, o sertanejo já é dominante e sempre esteve no auge, desde 1990. Com uma identidade própria, é um dos mercados fonográficos mais lucrativos do país – e também, de maior investimento. Os novos nomes se dividem entre os “clássicos” sertanejos universitários e aqueles que buscam trazer um novo ponto de vista. Marília Mendonça foi uma delas. Com letras que falavam sobre machismo, camaradagem e vivências femininas, ela ganhou o título de rainha da sofrência que a acompanha até hoje, mesmo depois de sua morte. Além dela, Ana Castela é um nome que, apesar de ser comercial, traz o funk e o eletrônico para o rodeio, sendo louvada por grandes nomes, como Chitãozinho e Xororó, com quem gravou a música Sinônimos.

    O cowboy de thom browne

    a estética na MODA

    A relação entre o western e a moda é antiga. Mais recentemente, na temporada de verão 2023, as marcas desfilaram elementos-chave do velho oeste – mas em uma nova leitura. Prada e Givenchy, de forma comedida, na marca italiana, por exemplo, o xadrez e o look total jeans são mais minimalistas. Enquanto na Givenchy, os acessórios foram o ponto de partida para a construção mais urbana.  

    A estética do cowboy é uma constante no universo da DSquared. Ao propor styling com pegada western mesclado com a cultura pop resulta em um imagem sexy e com um quê weirdcore – que tem muita relação com os gostos e comportamentos urbanos. 

    A LED, marca brasileira de Célio Dias e Priscila Gouthier, na edição N54 da SPFW, trouxe uma interação entre a brasilidade e o modão do velho oeste. Mas claro, os códigos também foram respeitados em sua essência, tendo leves adições de estilo que “desvirtuam” o que se imagina da imagem do cowboy. Recentemente, a marca de João Pimenta trouxe na edição 55 do São Paulo Fashion Week referências vitorianas mescladas com as clássicas franjas e jaquetas de vaqueiros, tudo com muito glamour e essência queer. Thom Browne e Casablanca trouxeram algumas silhuetas repensadas numa nova perspectiva. Look totalmente crochetado e com top cropped foi visto em Thom, enquanto em Casablanca, look jeans totalmente ajustado e com detalhes que tiram o ar de ultra-masculinidade na composição reimaginam, de forma inovadora e respeitosa, tudo aquilo que conhecemos sobre os peões. 

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