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    O Brazilcore é realmente uma tendência?

    Durante essa semana, muito se discutiu sobre a existência e força da suposta tendência na moda. Mas será que ela é real como se fez parecer?

    O Brazilcore é realmente uma tendência?

    Durante essa semana, muito se discutiu sobre a existência e força da suposta tendência na moda. Mas será que ela é real como se fez parecer?

    POR Gabriel Fusari

    Durante esta semana, a comunidade de moda brasileira esteve em polvorosa diante do surgimento de uma possível nova trend chamada de Brazilcore. Tudo começou com um tweet alegando que influenciadores de moda internacionais estavam flertando com a combinação de cores da bandeira do Brasil em suas produções e isso era o início da nova  tendência internacional da hora. Seria mais uma “it core” nascendo nas redes sociais. Mas será mesmo? 

    TIKTOKCORE 

    Algo a se levar em consideração é que, quando buscamos pela tendência nas redes sociais, encontramos (até a data desta matéria)  mais conteúdos de criadores explicando a possível tendência do que exemplos dela  acontecendo, de fato, na prática. As referências  para justificar a Brazilcore usavam as mesmas imagens que, se quer, comprovam se são postagens atuais ou de um mesmo período de tempo. Em apuração para esta matéria, 15 das fotos mais utilizadas em que foi possível encontrar a fonte de origem, 10 eram publicações de brasileiras, enquanto as 5 restantes eram gringas.

    Reprodução: Alex Cosani

    Reprodução: Alex Cosani

    Isso é um indicativo de que o tal Brazilcore está ainda debruçado numa suposta tendência que já é apontada como algo certeiro. Harry Ciotto, criador de conteúdo no TikTok desde 2020, diz que isso acontece de forma muito frequente na rede: “É possível apontar o TikTok como o epicentro desse fluxo constante de tendências e seus apontamentos. Ao mesmo tempo sendo causa e consequência de uma necessidade de ser a primeira pessoa a avisar e explicar a descoberta”. Como decorrência desse ciclo, há pouco espaço e tempo para uma informação ser bem apurada e aprofundada. 

    Leia + Entre o esporte e a periferia: a moda se rende as camisas de futebol 

    Para Iza Dezon, pesquisadora de macrotendências comportamentais, a valorização nostálgica dos símbolos do Brasil na moda é algo local e não internacional, uma consequência estética do desejo de mudar o rumo político do país, devido à polarização política dos últimos anos: “Voltar a usar a camiseta do Brasil é voltarmos a atitude do orgulho nacional de antes, apesar do cenário político atual. E junto da amplitude das redes, as pessoas estão se manifestando como nunca antes. Além disso, pela Copa do Mundo, a pura vontade de torcer pelo time do Brasil vai falar mais alto”, pontuou Iza.

    Reprodução: Malu Burnier

    Reprodução: Malu Burnier

    FALANDO EM COPA DO MUNDO

    Desde as Jornadas de Junho de 2013, a camisa da seleção brasileira foi bastante usada em manifestações por todo o Brasil. A partir de 2018, as cores da bandeira e a “amarelinha” foram tomadas por movimentos de direita. A camisa da seleção perdia seu total significado esportivo e se tornava a síntese do ultranacionalismo.

    Excepcionalmente neste ano, presenciaremos o bicentenário da Independência do Brasil, as eleições mais acirradas desde a redemocratização da república e a Copa do Mundo de futebol. Neste mês, a Nike lançou a coleção das camisas da seleção brasileira com a campanha intitulada “Veste a Garra”, estrelada por lendas do esporte, ídolos da cultura pop brasileira e atletas da nova geração que, além de espelhar o orgulho nacional, aparentemente pertencem a polos políticos distintos. Como exemplo, pode-se citar o jogador Ronaldo “Fenômeno”, que esteve em diversas manifestações da direita nos últimos anos e MC Hariel que, assim como Djonga,  se posicionou totalmente contra as políticas do atual governo

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    Imagem: Reprodução (Nike)

    Segundo o Portal Rap Mais, tudo indica uma possível tentativa de resgatar o real significado e despolitizar a peça a tempo da Copa do Qatar. A influenciadora digital Malu Borges, que soma mais de 3 milhões de seguidores nas redes sociais,  apareceu em diversos conteúdos sobre Brazilcore na rede usando uma jaqueta do Brasil. Para ela, esse é um ótimo momento para os influenciadores usarem sua imagem para promover união por meio dos símbolos: “É legal ver a galera que tem visibilidade fazendo isso porque impacta quem nos segue ao entender que não é de um ou de outro, mas sim nosso. Eu adoro a época de Copa porque é um momento caloroso que junta todo mundo e é muito chato trocar esses momentos de união por desavenças políticas”. 

    POLÍTICA ESTÁ NA MODA

    Foi clara a tentativa de resgate dos símbolos nacionais durante o movimento da Frente Ampla Pela Democracia no último dia 11/08. Durante as manifestações pelo país, as cores verde, amarelo, azul e branco se juntaram às bandeiras vermelhas, cor associada ao campo da esquerda desde a revolução francesa.

    Imagem: Tiago Queiroz

    Imagem: Tiago Queiroz

    Brunno Almeida Maia, pesquisador em filosofia e teoria de moda pela Unifesp, diz que os símbolos, desde a antiguidade, têm significados ideológicos que buscam unificar grupos, dando uma só identidade a uma nação. Ele ainda diz que é possível analisar isso pela perspectiva de Pierre Bourdieu, se entendermos que os dois lados disputam a liderança simbólica pela narrativa do Brasil, só que pelo viés estético. “O simbólico não é algo imposto, ele precisa ser aceito pela sociedade e por parte do grupo à que ela se dirige. Foi o que aconteceu com a esquerda e a extrema direita”, ele conclui.

    Nesse sentido, a camiseta, as cores, as peças que fazem referência à estética brasileira estão em disputa em diversas esferas, e a moda é uma delas. Do Fashion TikTok à Copa do Mundo, impactado pelo streetstyle, o resultado do sucesso dessa onda ainda não é concreto. Para o analista político da CNN Brasil Gustavo Uribe, os resultados após as eleições em novembro serão decisivos quanto à postura diante da camisa brasileira. “Se Jair Bolsonaro for reeleito, mais do que nunca ela deve ser identificada à direita, em uma espécie de comemoração pela reeleição. Caso vença Luiz Inácio Lula da Silva, a possibilidade de uma ressignificação deve ser maior”.

    VERDE E AMARELO NA MODA

    Foto: Reprodução

    Foto: Reprodução

    A Misci, marca do designer mato-grossense Airon Martin, viralizou com os vídeos que divulgam seu boné verde e amarelo “Mátria Brasil” desfilado na última SPFW – que após a onda de posts chegou a esgotar. O designer reflete em suas coleções o Brasil por um ponto de vista interiorano, além de evocar diferentes Brasis. Desde 2019, Airon busca resgatar os ícones brasileiros, por meio da reflexão de quem se choca ao ver essas iconografias num contexto nada óbvio, que é semelhante ao que se viu  nas ruas durante as manifestações a favor da Frente Ampla Pela Democracia.  “Quando coloco a bandeira do Brasil junto do vermelho é para gerar essa reflexão e dar essa ideia de centro”, diz Airon ao FFW. O designer ainda faz uma alusão à política com futebol ao dizer que a camisa e a bandeira são de todos os brasileiros, independente  de qual seja o time de quem a usa.  

    O sucesso de posts, memes e produtos após o caloroso debate é uma resposta do público consumidor sobre a futura receptividade da suposta trend. Fica nítido que Brazilcore pode ser a nossa próxima commodity estética. Mas antes disso, teremos que atravessar numerosos embates (7 de setembro, Eleições, Copa do Mundo e a posse presidencial) até se firmar como uma verdadeira tendência global. Isso só acontecerá se o Brasil seguir em um caminho democrático e claro, se ganharmos a Copa. 

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