O ilustrador Albino Papa ©Reprodução
Albino Papa tem 33 anos e é natural de Belo Horizonte, onde se formou em design gráfico na Escola de Design da Universidade do Estado de Minas Gerais. “Venho de uma formação ‘clássica’ de design gráfico, de uma escola onde pouca ou nenhuma importância era dada à moda”, confessa Albino em entrevista ao FFW. Lentamente, e de uma forma orgânica, Albino foi traçando o seu caminho na moda, tentando sempre conectar os seus trabalhos de design com algo que achava mais prazeroso. Hoje, entre outros trabalhos, Papa desenha belas estampas para o estilista Alexandre Herchcovitch desde a temporada de Inverno 2012. “O briefing era relativamente simples, mas de execução extremamente complexa: desenhar uma estampa corrida, que pareça um tapete Persa, só que todo feito com ossos ou pedaços de ossos”, explica ao FFW.
Albino também tem em seu portfólio a cenografia do SPFW Verão 2010, com o tema Passion, e do SPFW Inverno 2010, com o tema Linguagem; e o decór da loja da Valisere na rua Oscar Freire.
A ilustração desenvolvida por Albino Papa e a aplicação em uma das peças de Alexandre Herchcovitch ©Divulgação
Confira abaixo a entrevista completa e saiba mais sobre o trabalho de um dos ilustradores aposta certa para 2013:
Como começou a trabalhar com moda?
Ainda durante a faculdade, tive a sorte de trabalhar na VOLTZ DESIGN, um dos escritórios mais importantes de Belo Horizonte. Foi lá que aprendi tudo o que eu realmente sei sobre design. Nesse período, eles tinham na carteira de clientes Ronaldo Fraga, Lei Básica e a Tecelagem São José. A Voltz foi responsável pela minha formação técnica e ética. Foi uma escola. E ali, direta e indiretamente, tive contato pela primeira vez com o imaginário gráfico de um grande estilista.
Foi difícil?
Depois de formado, comecei a trabalhar como diretor de arte freelancer, fazendo absolutamente tudo dentro do universo do design gráfico: do desenvolvimento de logomarcas a websites, passando por estamparia, campanhas, cenografia, etc. Em Belo Horizonte, tive a oportunidade de fazer a campanha de várias marcas de diversos segmentos e, assim, segui avançando pouco a pouco em um mercado com características super específicas.
Quando aconteceu o que você considera sua grande oportunidade?
A minha grande oportunidade veio com o convite de uma amiga, a Camila Schmidt, que trabalha com a Daniela Thomas e o Felipe Tassara. Eles estavam desenhando a cenografia de uma edição do São Paulo Fashion Week em que o tema era o Brasil. Em seguida vieram as edições Passion e Linguagem. Assim, passava mais tempo em São Paulo do que em Belo Horizonte e acabei me mudando. Depois disso fiz outros grandes trabalhos com a Daniela, como a loja da Valisere nos Jardins e algumas exposições.
Como começou o seu trabalho com Alexandre Herchcovitch?
O trabalho com o Alexandre aconteceu a conta gotas. Sempre fui consumidor da marca. Desde quando comecei a ganhar meu próprio dinheiro me interessava muito pelo produto dele. Quando mudei para São Paulo, o Antônio Gomes (da equipe do Alexandre) começou a me passar trabalhos pequeninos, como reaplicação do logo em botões, assinaturas, algum desenho de metal que se transformaria num acessório, depois um bordado para camiseta ou uma estampa localizada para a parceria que ele tem com a Chilli Beans.
A estampa camuflada criada por Albino e a aplicação em uma calça do desfile masculino de Alexandre Herchcovitch Verão 2013 ©Divulgação
Ilustração “Bombardeio Aéreo” que estampou algumas peças da coleção Verão 2013 de Alexandre Herchcovitch ©Divulgação
A estampa de pássaros aplicada em um casaco ©Divulgação
E então começou a fazer as estampas dos desfiles…
Então, surgiu o grande desafio: o Tapete Persa de ossos, que apareceu no desfile de Inverno 2012. O briefing era relativamente simples, mas de execução extremamente complexa: desenhar uma estampa corrida, que pareça um tapete Persa só que todo feito com ossos ou pedaços de ossos. Antes de colocar a mão na massa, fiquei obcecado para entender as diversas e infinitas formas de se tecer um tapete Persa. Deu certo e acho que foi aí que eu conquistei a confiança do Alê e da equipe. Após esse job, o nível de exigência e de dificuldade só aumentou. O segundo grande trabalho foi a coleção de Verão 2013 Pearl Harbour, em que precisava desenhar cinco estampas masculinas. O briefing era uma loucura. O Alê tem essa coisa muito legal de que nada é o que realmente aparenta ser. Você precisa olhar de novo, olhar de novo e olhar mais uma vez para realmente começar a entender do que se trata, e essas estampas têm essa característica. Tem a estampa do Bombardeio Aéreo, por exemplo, que entre fumaça, mísseis e aviões, tem uns peixes voadores. A estampa de Pássaros é super bonita, mas quando você olha bem de perto vê que os pássaros estão todos mortos.
O trabalho de ilustração tem muita pesquisa por trás?
Esse trabalho foi muito desafiador para mim. Antes de começá-lo, pesquisei exaustivamente várias estampas de camisas havaianas. Estudei muito para entender a estrutura, como acontece a repetição, quais os elementos de fundo, quais os de primeiro plano, como simulam a perspectiva… Ao contrário do que muita gente pensa, o desenvolvimento de estamparia não é e não pode ser estático. Não é simplesmente sentar e desenhar qualquer coisa, é minha responsabilidade fazer o melhor trabalho para um dos melhores designers do país.
Ilustrações de Albino Papa para o desfile de Verão 2013 de Alexandre Herchcovitch ©Reprodução
E como é trabalhar com Herchcovitch em um processo tão específico?
Depois da edição de Verão 2013 do SPFW, o Alê me passou outro job mais complexo ainda: a estamparia do prêt-à-porter feminino do Inverno 2013. Ele chegou em casa com uns livros da artista Margaret Mee e uns outros de fotografia de flores exóticas e disse: “Eu quero flores lindas, mas com uma cara meio sombria, uma coisa Margaret Mee from Hell”. Daí pensei: como fazer aquarelas digitais se eu nem aprendi a manipular com precisão aquarelas de verdade? Aquarela é uma das técnicas mais difíceis de pintura. Então fui novamente pesquisar para aprender quais os fundamentos da aquarela artística e aplicá-los na aquarela digital. Esse trabalho demorou muito tempo. O desenho em si começou com uma flor isolada, que se transformava em cachos, que formavam agrupamentos de cachos e, por último, a montagem no quadro de cada estampa. Era orgânico e a repetição deveria também ser orgânica e imperceptível. Nesse trabalho aprendi uma característica do Alê: quando ele gosta muito, ele retorna de cara falando que tá lindo. Se passou um dia e ele não respondeu, pode sentar e recomeçar o trabalho, pois não está bom. O Alexandre é extremamente objetivo, prático e sabe muito bem o que quer.
Ilustração de Albino Papa para o Inverno 2013 de Alexandre Herchcovitch ©Divulgação
Ilustração de Albino Papa para o Inverno 2013 de Alexandre Herchcovitch ©Divulgação
Ilustração de Albino Papa para o Inverno 2013 de Alexandre Herchcovitch ©Divulgação
Em que você pensa quando desenha?
Uma vez ouvi por aí um provérbio oriental que dizia, “se você quer pintar o bambu, que você seja o bambu”. Antes de realizar qualquer empreitada, eu preciso realmente entender a dimensão daquilo a ser desenvolvido. Não é mecânico. Tenho que aprender com o trabalho, caso contrário, não vejo sentido. Desenvolvo sempre com a responsabilidade e o objetivo de que tudo o que desenho não tenha sido visto antes em lugar nenhum. Nesse sentido, é sempre um desafio e um prazer fazer o que faço.
Em que está trabalhando atualmente?
Estou desenvolvendo estamparia localizada pras outras linhas do Alexandre, além de criar também para MCD. Recentemente fiz uma parceria com o Marcelo Rosenbaum que vai chegar aos supermercados em breve. Agora no final do ano volto para Belo Horizonte para dirigir as campanhas dos meus clientes locais.