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    POR Redação

    Carla Sozzani em sua galeria com o fotógrafo Helmut Newton ©Divulgação Galleria Carla Sozzani

    Existe algo muito semelhante entre mulheres que criam, que conseguem ver todas as dimensões de expressão de uma vez só. E olham apenas para frente, pra um futuro ainda vazio, que precisa ser completo de coisas belas.

    Carla Sozzani é assim (é a irmã mais velha de Franca Sozzani, diretora da “Vogue” Itália). O mundo já amplo de uma revista de moda não bastava para ela, 22 anos atrás. Era diretora da “Elle” italiana e circulava entre roupas, maquiagens, personagens, imagens, páginas. Queria mais. Então se apossou de um lugar “do avesso” num bairro “errado” de Milão, por onde ninguém interessante passava. Fez então o que chamava de um “jornal vivo”, concreto. E naquele chão de cimento e paredes abandonadas, em vez de páginas, colocou tudo o que podia. Fotografias de autorias célebres. Roupas de designers cobiçados. Livros, flores, cheiros, cores, música, gostos, e mais plantas, café, quartos decorados. Foi varrendo o lugar de beleza.

    Até que a tal rua caída se transformou em um lugar por onde todos querem passar.

    Agora, quando se fala em “10 Corso Como”, pensa-se num cantinho glamouroso e delicioso de Milão, onde se pode apenas beber um cappuccino ou sair com um par de botas Martin Margiela. E borrifado de perfumes improváveis. Mas sempre, sem complicações ou filas, ver exposições de ícones da fotografia, sobretudo as que dialogam com a moda.

    Fomos convidados para um bate-papo com Carla no backstage de sua galeria. A conversa você pode ler abaixo.

    Como é que tudo começou? A loja tem tantas facetas que não dá pra adivinhar qual foi o primeiro passo.

    Abri em 1990 a Galleria Carla Sozzani. Em 1991, a loja. O coração está aqui mesmo, há 22 anos, mas tudo começou com a galeria e a livraria.

    A galeria Carla Sozzani com uma mostra de Helmut Newton, em 1993 ©Divulgação Galleria Carla Sozzani

    É na galeria que está também o teu coração?

    (Risos. Aliás, Carla sorri muito) Ah, meu coração também bate por outras coisas… (risos). A base é aqui. Depois da galeria foi quando abrimos as lojas, onde colocamos tudo. Das velas às joias, os livros e os vestidos. E foi quando o Francesco Morace (sociólogo italiano) disse: “Terminaram as lojas de imagem, agora começaram as lojas de conceito”.  E escreveu o termo “concept shop”, que depois virou uma maneira de definir um modo de apresentar e fazer. Mas o primeiro a dizer alguma coisa a respeito foi ele mesmo.

    Ah, então o batizado do termo foi também na Itália?

    Bravo! Foi um italiano! Bravo! (risos)

    Temos que dizer “Brava!” pra senhora também, que acabou inventando o que hoje se chama concept store.

    Eu fazia apenas aquilo que sentia.

    Mas o que a senhora sentia encaixava com o gosto do momento.

    Pra mim, num certo sentido, não tinha escolha. Eu era jornalista de moda já há 19 anos. Sabia qual era minha paixão e maneira de me expressar. Por isso comecei com a galeria. A fotografia e a arte são fundamentais pra mim. Trouxe também a moda porque sem ela não conseguiria ficar! (risos) E então pensei, ah, faço uma coisa que se pareça com um jornal, mas um jornal vivo. Em vez de colocar uma nova página a cada dia, eu colocava várias coisas e mudava os espaços! E eu continuamente fico girando dentro da loja. É a minha maneira de comunicar. Tiro tudo do lugar o tempo todo. Assim começou um diálogo muito interessante entre visitantes e clientes.

    Teve um momento em que a senhora decidiu “agora faço isso”?

    Depois que eu saí da revista. Eu era diretora da “Elle”, fiz o lançamento da “Elle” italiana. Pensei em abrir uma casa editorial, fazer livros e abrir uma galeria. Depois eu percebi que tinha que fazer uma galeria de fotografia, porque a fotografia naquele momento não era considerada arte. E eu colecionava fotos. E quando olho para trás, vejo que era tudo errado! Não conhecíamos o bairro. O espaço era um corredor, não tinha nem vitrines na loja. O piso era de cimento num momento em que tudo era de mármore. Era tudo errado! (risos) Tudo ao contrário. Mas eu estava tão convencida da ideia, adorava tudo aquilo, que fui em frente, estava animada! E hoje tenho o mesmo entusiasmo de sempre.

    Qual foi a primeira mostra de fotografia organizada na galeria?

    Louise Dahl-Wolfe. Trabalhava com Avedon, trabalhou na “Harper’s Bazaar”. Depois dessa mostra, de uma coisa nasceu outra. Com a Corso Como foi assim, de um trabalho nascia outro trabalho, depois abrimos o restaurante, foi tudo um acontecimento. E tudo veio de um desejo que eu tinha de criar um lugar onde as pessoas se sentissem bem.

    E estar bem é também estar cercado de beleza, não?

    O tipo de elogio mais belo que eu já recebi foi de gente que estava triste, meio deprimida ou de mau humor e ficou bem depois de passar por aqui.

    Um dos espaços da multimarcas italiana 10 Corso Como, de Carla Sozzani ©Divulgação 10 Corso Como

    O fato de colocar muitas coisas diferentes juntas nos faz pensar também no conceito da moda. Que não é a roupa, apenas.

    Não, certamente que não! Teve um momento, principalmente com a descoberta do prêt-à-porter, na metade dos anos 70, metade 80, em que as pessoas pensavam que a moda era o vestido. Isso durou pouco. As mulheres são inteligentes demais pra pensar que a moda gira em torno apenas de um vestido.

    De qualquer forma esse conceito ainda existe por aí. Não será porque existem países onde ainda se está engatinhando no estudo da moda?

    Eu vi muitas mudanças recentes. Como na China, onde acabamos de abrir a 10 Corso Como Shanghai. Vi uma evolução do gosto muito veloz, uma mudança na construção das marcas, no modo de fazer pesquisa, tudo está muito mais rápido.

    E por que ainda não pensaram em abrir uma loja no Brasil?

    Não sei! (risos) Um dos que me falou foi o Francesco! Ele disse que eu tenho que ir pro Brasil.

    Quando pensamos que a moda não é apenas “vestido”, mas abarca muitas coisas, nos vem à mente a questão da moda esbarrar na arte. Qual é o seu conceito de arte hoje? 

    (silêncio)

    … por exemplo, se uma criança te pergunta “O que é arte?”, o que a senhora responderia?

    Se uma criança hoje me pergunta o que é arte eu a levo imediatamente para dar uma volta nas igrejas de Milão. Porque lá tem tudo, tem arquitetura, pintura. A arte é toda forma de beleza em diversas expressões, difícil definir. Mas no meu caso, eu sou italiana, o que você quer? (risos) Sou fascinada pelo Renascimento, pela Idade Média… No fundo tudo o que gostamos acaba sendo arte, não adianta ficar procurando entender muito, não é? Quando uma coisa é bonita, se entende na hora.

    O papel do design também mudou, inclusive se tornou muito mais expositivo e também se cruza com a arte.

    Claro, eu acho que tudo acaba se cruzando. Muitas expressões de moda se aproximam do que é arte. Como a fotografia, por exemplo. E mesmo na fotografia existe uma parte dela que é arte, e outra que não, como o fotojornalismo. Muito difícil. A arte fica num ponto onde a expressão individual se acentua, e é única, é bela. Quem vai definir?

    Nesses anos de galeria a senhora consegue citar cinco mostras que foram as suas favoritas?

    Olha, seguramente penso em Helmut Newton (1920 – 2004),  Horst (1906 – 1999), que foi a primeira fotografia que eu vendi. Depois eu fiz uma mostra de Duane Michaels, que é também uma pessoa maravilhosa. Sarah Moon, fiz três mostras, adoro.

    Carla Sozzani com Azzedine Alaïa, um de seus estilistas preferidos ©Divulgação 10 Corso Como

    Mas com a introdução da parte de moda, você também acabou reencontrando importantes estilistas que já conhecia na época da “Elle”, não?

    Pra mim foi muito bom ter encontros com meus designers favoritos. Como Rei Kawakubo, da Comme des Garçons, Azzedine Alaïa… São ícones, são os pilares. Como Miuccia Prada, com quem tivemos um encontro interessantíssimo, porque vi todas as mudanças da marca, vi o crescimento. Somos da mesma geração. Os encontros foram muitos.

    A sua irmã, Franca Sozzani, que também circula pelo mundo estético, é alguém com quem você compartilha ideias de trabalho?

    Com a minha irmã eu tenho uma relação emotiva muito grande. Nos encontramos sempre, vamos almoçar com a família, nos damos muito bem. Claro que podemos comentar se vimos algo bonito ou interessante, mas não em termos profissionais, é tudo meio por acaso, mais solto, é uma relação de irmã, com o coração.

    Pra entender como era Milão décadas atrás, sem internet, em que situação as pessoas da moda se encontravam mais? Por exemplo, entre a senhora e Miuccia Prada, onde é que vocês se encontravam?

    Mas nós nos conhecíamos há taaaaaantíssimo tempo! Nem me lembro! E eu era diretora da “Elle”. A Miuccia já tinha aquela loja maravilhosa na Galleria Vittorio Emanuele, no centro de Milão, eu conhecia a mãe dela também, a irmã. Mas o lugar onde nos encontrávamos mais era em Paris, nos desfiles. Não existia um lugar típico de Milão como aconteceu, por exemplo, com o bar Jamaica (bar no bairro Brera), onde todos se encontravam numa época. Nos anos 50, 60 não tinha isso. Tinham muitos bares mais ou menos burgueses, mas não existia “o lugar”.

    Aqui no bairro da 10 Corso Como certamente não…

    Ah, não, ninguém passava por aqui! (risos) As pessoas iam ao centro ou pra Brera. Aqui não acontecia nada.

    Quando olha pra trás, o que pensa que ainda falta?

    Aqui na 10 Corso Como? Falta sempre alguma coisa! (risos). Porque é tudo uma evolução. É como uma viagem que não acaba nunca.

    Os assistentes de Carla vêm pedir ajuda pra pendurar outras fotos e ela sai andando com calma, mas olhando tudo em volta pela mesa, parede, e até o caderno e as folhas de rascunho onde foram anotadas as respostas desta entrevista.

    + Nós também entrevistamos sua filha, Sara Maino, editora sênior da “Vogue” italiana

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