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    A Influência soviética na moda

    Nos 30 anos do fim da União Soviética, entenda o movimento inspirado na estética 

    Por Gabriel Fusari

    Desde o fim da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas há 30 anos, o país continental ainda influencia estilos e movimentos derivados de sua singular história. Visto nas passarelas a partir de 2016, o estilo post soviet é um reflexo da história indumentária russa bem como é considerado o sucessor do vestuário  soviético, desenvolvido durante os primeiros anos de poder do Partido Comunista. Com símbolos gráficos, alfabeto cirílico e figurino normcore, o movimento se inspira no momento de colisão entre o modelo socialista e o início do capitalismo selvagem.  

    A contracultura como protesto

    Nessa época, a contracultura começou a influenciar a moda que antes era ditada pelo governo. Com o início da abertura de mercado, marcas como Adidas começaram a chegar no país e as pessoas começaram a misturá-las com roupas desenvolvidas pelas confecções estatais. De acordo com o historiador Jones Manoel, mesmo havendo muitos soviéticos que não fossem descontentes com o governo, havia aqueles que se manifestavam pela forma de se vestir: “O consumo da contracultura como forma de protestar a cultura vigente era a forma de assimilar uma estética punk ou rock, vinda dos Estados Unidos”. 

    A contracultura foi excepcional para a influência dos estilistas pós sovietes. Agora movidos por um sentimento de nostalgia do socialismo no leste europeu, artistas utilizam de sua voz e criações para protestar contra a supressão de direitos que ex-repúblicas como Rússia, Ucrânia e Chechênia praticam atualmente, em especial contra a comunidade LGBTQIA +, após o fim da União Soviética em 1991. 

    A cena de criadores locais hoje

    O pioneiro dos pós sovietes foi Gosha Rubchinskiy seja com sua linha homônima, seja com sua marca de skate Paccbet. O estilista russo fez sua estreia em Moscou em 2008, mas foi há cinco anos que ele fez seu debut internacional. A coleção da primavera verão 2016 foi inspirada na juventude periférica soviética dos anos de 1980 e 1990, que costumava utilizar trajes esportivos regularmente, em razão das Olimpíadas de Moscou em 1980. Com maquiagem punk, os modelos desfilavam com roupas monogramadas com a foice e martelo, inspirada na mesma criação das artistas da moda construtivista Varvara Stepanova e Lyubov Popova. 

    looks de Gosha Rubchinskiy

    looks de Gosha Rubchinskiy

    Após essa coleção, Burberry, Adidas e Comme des Garçons embarcaram na estética em parceria com Rubchinskiy. Adidas e Burberry já fazem parte da história do país por serem as primeiras marcas internacionais a chegarem pós perestroika. “A estética nostálgica é relacionada com a memória afetiva das pessoas, como símbolo de sua origem e com votos de renovação política”, justifica Rubchinskiy ao trabalhar sua estética internacionalmente. 

    Outro estilista que se lançou no mercado da moda abordando as raízes soviéticas na Vetements é Demna Gvsalia, estilista atualmente à frente da Balenciaga.  Em 2016, Kim Kardashian virou manchete ao usar um moletom vermelho com símbolo do Partido Comunista, produzido por Gvsalia. Depois desse episódio, as referências anti-fashion oriundas de sua juventude na Geórgia estiveram presentes em todas suas coleções. Como exemplo, a coleção da Vetements de primavera verão 2018 quando ele utiliza uniforme de trabalho como outfit e um grande pano de prato com calendário como saia ou na coleção em parceria com empresa de entregas de DHL. Em outras coleções, ele também apresenta a bagagem cultural da grande mãe Rússia, na qual já viveu. Sempre com símbolos que referenciam a figura materna, como vestidos floridos, babushka e sacolas de mercado coloridas. 

    looks da vetements

    looks da vetements

    Também se inspirando na ideia materna popularizada no novo oriente, a marca Berhasm desenvolveu a coleção chamada  “Mãe do Tecno”. Nela, o coletivo formado desde 2018 por jovens artistas da Rússia, Ucrânia e Geórgia aderiu jaquetas de couro em vinil, símbolos têxteis da Geórgia, bem como vestidos com a estampa da bandeira do país. Também foi apresentado roupas oversized  combinadas com lenço babushka, que é a chave que liga ao tema desta coleção. Idealizada por Beso Turazashvili, a marca usa sua voz e prestígio na noite moscovita para se manifestar contra a opressão política e sexual na Rússia e Ucrânia, onde acontecem constantes violências contra a comunidade LGBTQIA+. 

    Desde que a Ucrânia se tornou um país controlado pela extrema direita nacionalista, houveram processos de descomunizacão que promoviam a retirada de símbolos do partido bolchevique e a proibição da “promoção comunista”.  Nesse contexto, quem se posicionou contra esses movimentos foi a estilista Yulia Yefintchuk. Nascida na Ucrânia, Yulia é uma das poucas criadoras que homenageia abertamente a era soviética. Em entrevista ao FFW, Yulia conta que cresceu durante a Perestroika e os símbolos soviéticos faziam parte do seu cotidiano. Desta forma, a arte comunista é o que guia ela: “sou interessada em explorar o passado, analisando e procurando por respostas na moda e arte. É importante trazer informação com as roupas. Toda coleção é carregada com um significado semântico”, comenta.

    looks da berhasm

    looks da berhasm

    No Brasil também chegaram as influências do novo oriente. Na segunda coleção apresentada no São Paulo Fashion Week (N51), a Freiheit de Marcio Mota se inspirou no construtivismo russo desenvolvido na década de 1920. As letras cirílicas que traziam o astral punk e a influência artística soviética foram impressas nos figurinos funcionais da marca. Além de Freiheit, a Class é outra marca de streetwear que apresenta influências pós-soviéticas.  Original de Santo André, no ABC Paulista, a marca surgiu em 2014 pelas mãos de Eric Cesar e Rafaela Sayuri. Bebendo na fonte de Gosha Rubchinskiy, Class apresenta roupas que flertam entre o streetwear e o sportswear, com peças oversized  e uma acidez irônica ao tema da peça. Assim como os artistas do leste europeu, a Class volta seu olhar para a perspectiva da periferia e usa sua voz para falar pelas roupas. 

    Nem tudo é foice e martelo

    Nem todas as marcas inspiradas ou ditas pós-soviéticas fazem o uso da foice e martelo para contar sua história. Algumas marcas utilizam de criações e inspirações culturais que hoje são intrínsecas à cultura russa. Ainda que existam aqueles que homenageiam as imagens e símbolos do passado comunista da Rússia, também existem aqueles que vêem problemas nisso. As críticas apontam o estilo como negativo por vangloriar símbolos da União Soviética sem fazer uma crítica aos defeitos do regimento da época. Também foi alegado que a produção das peças por marcas europeias como Burberry e Gucci, que abordam o estilo pós soviete, se trata de apropriação cultural. O problema, apontado pelos críticos, era que a cultura eslava era resumida em roupas oversized, alfabeto russo e símbolos comunistas. Entretanto, a defesa dos criadores de moda é que eles são até hoje moradores das ex-repúblicas unidas levando sua assinatura pelo mundo. A visão deles é construir de forma irônica a visão ocidental sobre a cultura soviética no streetwear, que considera a moda eslava exótica comparada com à europeia.

    varvara stepanova com sua criação, de 1924

    varvara stepanova com sua criação, de 1924

     

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