A Carneiro Studio foi lançada logo no início da pandemia por Gabriel Carneiro, 25 como uma resposta a muitas questões que envolvem sua vida e seu entorno.
Assim que a pandemia explodiu no Brasil, com o maior foco na cidade de São Paulo, o stylist e designer viu muitos amigos terem que buscar outras alternativas para sobreviver. Por mais que a ideia de ter um projeto seu que também carregasse o nome de sua família já fosse antiga, ele viu no momento uma oportunidade de fazer a diferença: transformar uma situação de sobrevivência em algo seguro e estável.
”A criação da carneiro é uma somatória da minha vida mais o reflexo do que tá rolando ao meu redor, geográfica e politicamente”, conta ao FFW. A marca tem um propósito bem claro: tudo o que Gabriel faz tem um pensamento por trás que questiona como o mercado funciona. A proposta da Carneiro é ser mais do que uma marca e atuar como uma rede de educação periférica com foco em ajudar na emancipação financeira e intelectual de muita gente que é “diariamente apagada pelo racismo. Tenho como princípios a circulação de informação e dinheiro”.
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“o que me dá mais gás é tentar transformar essa situação de sobrevivência no mercado em algo seguro e estável pra gente, assim como é para os profissionais brancos.”
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Gabriel questiona e derruba estigmas sobre o público consumidor e a questão do preço que é cobrado por cada peça. “Parece ser proibido negócios pretos cobrarem caro. A minha marca produz com qualidade, pagando justamente toda a cadeia produtiva. Ainda assim já comentaram no meu Instagram que pagar R$ 300 num moletom é um absurdo, mas enriquecer marcas megalomaníacas que maltratam constantemente o meio ambiente, além do trabalho escravo né, é ok?”, questiona.
Batemos um papo com Gabriel, Pegge (artista que assinas as estampas) e Hick Duarte (autor das fotos da campanha) pelo whatsapp para falar sobre a nova coleção “do lado leste” e sobre a novíssima campanha que você vê acima com exclusividade.
@augusto: como vocês estão e onde vocês estão?
@carneiro: eu to bem também, em casa agora, finalizando o planejamento de mkt da campanha e fechando arte da próxima já.
@carneiro: e morrendo de babar pelas fotos.
@hickduarte: Tô bem! Tô no meu estúdio em São Paulo, nesse momento editando o vídeo da campanha que sai nos próximos dias também.
@pegge: Tô indo kakaka na medida do possível a gente se carrega pra frente, estou em casa trabalhando nos próximos projetos e telas.
@augusto: Carneiro, como rolou a ideia de convidar o Pegge para criar as estampas da coleção?
@carneiro: hmm, acompanhava o Pegge há um booooom tempo no insta já e virei fã mto rápido do trampo e da linguagem dele. Daí rolou aquele reconhecimento primário de artistas periféricos, trocamos admirações pelo insta até que chamei o Pegge pra pintar uma roupa que tinha desenvolvido pro Zeeba no baile da Vogue. Ficou perfeito ❤️, daí quando comecei a Carneiro, por uma das bases da marca ser levantar artistas de quebrada, ja mandei msg pra ele e fomos nos falando. A curadoria a gente fez meio em conjunto, mais do lado do Pegge na vdd (com o que ele já tinha pronto) e tudo casou com a proposta.
@augusto: Pegge como foi ver seu trabalho tendo a moda como suporte?
@pegge: Foi um jeito mt diferente de imaginar meu trabalho em um suporte, eu antes de começar já desenhava em algumas camisetas pra usar, fazia minhas estampas, isso em 2014 por aí, mas quando comecei a pintar sempre queria trazer uma estética de moda nas minhas figuras que eu pintava, então já visava mt esse universo e fiquei feliz do Carneiro ter me inserido nisso de um jeito orgânico.
@augusto: Pegge na sua bio no Insta está escrito “menino prodígio criado sem pai”. De que forma isso influencia nas suas obras?
@pegge Essa frase veio do Enivo, um artista plástico que me convidou pra fazer minha primeira exposição em galeria, contei toda minha história e ele sintetizou mt bem nessa frase, menino prodígio pq eu nunca fiz nenhum estudo de nenhuma arte, inclusive nem tenho o médio completo por conta de uma operação, então prodígio da vida, e o sem pai é pq o meu faleceu quando eu era bem pequeno, isso influencia nas formas que conto histórias comuns que quase todo mlk de quebrada passa, a família bem matriarcal e dentro do corre de cada um, minha mãe e irmã influenciaram e continuam influenciando em eu conseguir ser um artista até hoje.
@carneiro aí foi onde me reconheci imediatamente, como a mesma história consegue criar tantas tangentes em tantos manos e minas como eu e Pegge, criados assim.
@augusto: O que conecta os universos da Carneiro e o trabalho do Pegge?
@pegge O reconhecimento de se ver no próximo em questão artística, regional e racial, Carneiro tem umas refs incríveis que ele sintetiza nos trabalhos que me coloca mt nesse lugar de me reconhecer no trabalho dele, por isso de cara já queria fazer algo com ele.
@carneiro acho que mtas variáveis, mas as principais são que ambos vivem na periferia, ambas as linguagens serem não centrais e nem europeia based. e com crtz a vontade e ação de mudar nosso entorno e realidade com a nossa arte.
@augusto: E o Hick como entrou nessa história?
@hick: Eu conheci o Carneiro em 2017 durante a minha exposição “Rente” em SP. Na época inclusive ele trabalhou como monitor da expo, a gente se tornou amigo e nos mantivemos em contato desde então. Desde que nos conhecemos percebi que a gente tinha vários interesses em comum sobre São Paulo, juventude e a forma como enxergamos imagem de moda.
@hick: Essa ideia de conexão entre o que entendemos como uma imagem de moda e um trabalho documental.
@carneiro hmmm, como ele disse a gnt se conheceu lá em 2017, trampei na expo dele, viramos amigos e fomos nos admirando de longe tbm, sempre soltando uns “vamo fazer algo junto” até que calhou de ser essa campanha, anos dps, com mto mais amadurecimento de imagem e pesquisa. esse lance de quebrar a imagem comercial de moda.
@augusto: Hick onde as fotos foram feitas e qual era a ideia por trás das imagens que vemos aqui?
@hick: As fotos foram feitas na casa do irmão da Carneiro, na Zona Sul. A ideia era retratar situações de afeto, alcançar imagens emocionais que flertassem com moda, mas ao mesmo tempo que também soassem como retratos de família.
@augusto: E sobre o casting, quem são esses garotos/garotas?
@hick: O Jorge logo de cara nos apresentou o Richard e o Ronald com uns posts no instagram da irmã dele. A gente ficou obcecado pelos moleques logo de cara.
@hick: Estávamos atrás de construir imagens que retratassem uma certa pureza e inocência, algo que no universo do streetwear às vezes é meio subestimado ou pouco explorado. Então vendo esses irmãos gêmeos e outros rostos que o Jorge apresentou, a gente começou a imaginar essa narrativa mais familiar pro shooting.
@hick: E aí tbm vieram o Komu e o Guto, os dois irmãos mais velhos. Na sequência o Carneiro sugeriu a Íris e a Ana.
@hick: E o Vini foi fotografado sozinho porque tínhamos algumas imagens mais específicas pensadas pra ele, como aquelas com as asas (que é inclusive inspirada numa pintura do Pegge).
@carneiro: acho que não podia ter sido um casting melhor pra representar esse trabalho e passar a msg de forma sincera. todo racializado, o ambiente pras fotos foi tão familiar e gostoso que realmente parecia uma grande família passando o domingo na casa da vó.
@augusto: Valeu Carneiro, Pegge, Hick! Fiquem bem e se cuidem. E vida longa pra Carneiro!
@carneiro: obrigado amigo pelo tempo e interesse!
@hick: Obrigado pelo interesse na história, Augusto!
A nova coleção já está disponível na loja online da marca.