Começa nesta quarta (25.05), na Praia de Iracema, em Fortaleza, mais uma edição do DFB (antes conhecido como Dragão Fashion). O evento vai de 25 a 28 de maio e tem uma programação diária com desfiles, palestras, mesas redondas e oficinas. Entre os designers e marcas que apresentam suas coleções estão David Lee, Lindeberge, Olê Rendeiras por Catarina Mina e QAIR Brasil.
Com expectativa de receber cerca de 32 mil pessoas durante os quatro dias de evento, o DFB conta com programação 100% gratuita. Confira a programação completa no site oficial.
O evento existe desde o final dos anos 90 e vem lutando para promover a moda cearense e nordestina e, junto com o SPFW, é uma das semanas de moda mais duradouras da América Latina. De uns anos pra cá, o mercado da moda no Brasil passou a olhar para dentro e resgatar sua cultura, saberes e processos, saindo da bolha SP-Rio e destacando marcas de outras regiões do país e descobrindo novos talentos. Muitas das marcas que surgiram nos últimos anos e estão chamando atenção são do Nordeste.
Nós conversamos com Claudio Silveira, fundador do projeto, que fala sobre a história do festival, o momento da moda nordestina no mercado hoje e os highlights do evento. “O mercado de moda em nossa região é gigante, a bola da vez é o Nordeste, todos os olhares estão voltados para cá – somos a segunda maior região em produção têxtil no Brasil, e o Ceará lidera no número de municípios envolvidos nas atividades”, diz.
Leia abaixo os trechos da conversa:
De uns anos pra cá o trabalho manual e artesanal ganhou ainda mais visibilidade no Brasil e no mundo. Como isso favoreceu as marcas e a cultura nordestina?
Não é só que favoreceu as marcas e a cultura nordestina. Na verdade, as marcas e a cultura nordestina colaboraram para que o artesanato e os fazeres manuais ganhassem essa visibilidade e tomando outras proporções no Brasil e no mundo. Hoje, por exemplo, eu vejo o Ceará numa posição importante na liderança produtiva de mercado. O artesanato é marca registrada para as culturas nordestinas, e é importantíssimo vê-lo ganhando espaço e respeito no mundo da moda.
Na minha concepção, o artesanato ainda é uma das principais fontes de renda de muitas pessoas, sobretudo mulheres, e, obviamente, trata-se de um retrato do nosso país, que luta para valorizar e manter viva uma tradição. Esse também é um propósito do DFB Festival: reconhecer e validar as diferentes maneiras de se fazer moda.
Algo interessante para destacarmos é que, mesmo com a hiper ultra velocidade das coisas, os trabalhos manuais e artesanais continuam ganhando preservação a partir de inserções entre as diferentes áreas da moda. Se pararmos para pensar, as habilidades e as técnicas contribuem para o desenvolvimento da moda e da indústria, somando forças para a melhoria dos processos produtivos do artesanato e agregando valor ao segmento. Ou seja, as marcas e a cultura nordestina estão cumprindo uma espécie de catalisador da nossa identidade, já que a fusão de tradição e moda fortalecem sempre o produto no mercado.
Quais as principais mudanças que você observa na moda desde que começou?
De 1999 até hoje, presenciamos muitas mudanças. Acredito que a moda sempre foi importante para a economia, mas as pessoas começaram a perceber isso há pouco tempo; alguns, infelizmente, ainda não se dão conta do poder do trade da moda cearense, mas espero e colaboro para que haja uma evolução ao longo dos anos.
Um outro ponto a ser destacado é que, antes, o Brasil era tido como um mero copiador de tendências. Hoje, nós vamos para cima e fazemos acontecer com a nossa brasilidade, ou seja, temos em construção a nossa personalidade própria. Nós, brasileiros, fugimos do óbvio e inovamos a partir da riqueza de materiais do nosso país. Durante o DFB desta edição, essa mudança vai ser vista de perto, nossos estilistas estão preparando desfiles que vão mostrar as infinitas possibilidades de se fazer moda com o que temos.
No mais, eu tenho certeza que a moda, hoje, é responsável por unir, e não mais segregar.
Quais são os diferenciais da moda do Nordeste?
Os principais diferenciais da moda do Nordeste são as nossas peças feitas à mão e os nossos talentos autorais. Falo isso porque, ao contrário de outras regiões do Brasil, a produção nordestina é conhecida por ser feita por vários produtores, com um fator social elevadíssimo. Eu faço questão de destacar que o Nordeste é uma das maiores potências de moda do país e nós temos que valorizar isso. Quando se pensa em regionalidade, diversidade e riqueza e história, é do Nordeste que eu lembro.
Um dos nossos grandes diferenciais é o trabalho das bordadeiras, rendeiras, crocheteiras, que eu chamo de “ícones do feito à mão” do Nordeste. Aqui eu vejo que as marcas estão em uma constância de propor uma pegada social e sustentável, prezando mais pela qualidade do que quantidade. E isso é o que nós estamos buscando quando fazendo curadoria das marcas que participam do DFB.
Um outro diferencial é o nosso jeans, pois temos o privilégio de termos uma grande mão de obra capacitada e qualificada aliada a um parque fabril fantástico e designers/estilistas geniais. Vale pontuar, também, que a moda íntima no Ceará é muito forte quando pensamos em produção, e estamos entre os líderes nacionais.
Quais os highlights da história do Dragão Fashion?
O DFB Festival foi criado em 1999 e é realizado anualmente em Fortaleza. Ao longo do tempo, foi consagrado como um dos mais relevantes eventos multidisciplinares, em diálogo com a moda autoral, cultura e ações formativas da América Latina.
O DFB lançou modelos e estilistas cearenses para o mundo, como o designer David Lee e a modelo Valentina Sampaio. Também participamos de um reality show em 2012, com o projeto “Indústria Criativa”, em parceria com o Senac, onde selecionamos 20 alunos por um edital para desenvolver uma coleção em tempo real durante o evento, monitorados pelo estilista Jum Nakao.
Em 2017, nós incorporamos o nome “DFB Festival” e demos espaço à pluralidade, como a música e a gastronomia. Em 2019, passamos para a megaestrutura da Praia de Iracema, com uma visão privilegiada e grandes salas de desfile, palcos, lounge, áreas de gastronomia e economia criativa e outros.
De onde surgiu o nome do evento?
O Dragão Fashion Brasil (hoje DFB Festival) teve esse nome por causa do local onde originalmente aconteciam os desfiles, o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, complexo cultural da Secretaria da Cultura do Estado do Ceará, gerido em parceria com o Instituto Dragão do Mar. O local, por sua vez, tem esse nome pela forma como Chico da Matilde, jangadeiro e líder abolicionista do estado, ficou conhecido. Hoje, optamos pelo minimalismo e incorporamos o nome DFB Festival.
Como está a sua expectativa com esta edição?
Bem altas, já que somos o maior e mais relevante encontro da moda autoral da América Latina e estamos retornando após dois anos de edições virtuais. Neste ano, em especial, o DFB vai ser bastante pautado pela sustentabilidade, desde a estrutura até a composição dos desfiles. Nossa cenografia é 100% feita com sucata, or exemplo.
Também vamos celebrar o selo de Fortaleza como Cidade Criativa do Design, da Unesco, outorgado em 2019, que tem tudo a ver com o evento. O DFB deixou de ser apenas uma semana de moda. Hoje, nós trazemos a temática do olhar 360° para retratar o Brasil de uma maneira mais extensa, com atrações para diversos eixos, como cultura, moda, formação, indústria, gastronomia e turismo.