Ao longo dos últimos dois anos, o designer Alexandre Pavão se tornou uma das principais referências nacionais quando o assunto é bolsa. Com uma forte identidade, marcada pelo uso frequente de cordas de pesca, mosquetões e cores marcantes, ele conquistou uma legião de fãs e clientes e o principal, consumidores dispostos a esperar até dois meses para colocar a mão em um de seus produtos. Com mais de 4,9 milhões de visualizações na hashtag no TikTok, Pavão gerou um nível de desejo em torno de sua marca que, no Brasil, é quase exclusivamente reservado às grandes grifes internacionais.
Apesar do sucesso meteórico nos últimos anos, a marca não começou bem por ali, mas sim em 2006, em Marília, interior de São Paulo, quando Alexandre e sua mãe começaram a fazer camisetas de fuxico para a Copa do Mundo, já com o nome de Alexandre Pavão – as peças fizeram sucesso e acabaram vendidas até no Japão. Mais tarde, Pavão entrou em um curso técnico de calçados e acessórios. Um de seus professores tinha um ateliê de bolsas e começou a desenhar algumas peças para que Pavão produzisse e os dois começaram a fazer uma produção conjunta em pequena escala.
Em 2015, Alexandre se mudou para São Paulo para trabalhar como estilista – sua marca homônima já tomava sua atenção, mas ainda era um plano B. Dois anos depois, ele deixaria seu trabalho para focar na construção da marca Alexandre Pavão.
Os detalhes dessa trajetória você pode ler na entrevista abaixo:
O que você acredita que aconteceu com suas bolsas para que elas virassem esse fenômeno e chegassem as mãos de influenciadores, celebridades e jovens de todos os cantos do país?
Acredito que quando a gente faz um trabalho bem feito, autêntico e único, as coisas conspiram para que de tudo certo. Muitos de nossos clientes são influenciadores e geram conteúdos organicamente para a marca, e isso tem ajudado a criar um universo e legião de fãs da marca.
E qual foi a grande virada para a marca Alexandre Pavão?
Eu acho que foram várias coisas! Quando a gente tá dentro da marca é difícil enxergar a dimensão que isso está tomando e como as pessoas conheceram meu trabalho. Com o boom da internet, do TikTok e do Instagram a marca foi crescendo e sendo mais reconhecida. Mas tem outros momentos antes que eu sentia que a marca já estava sendo reconhecida, quando fiz uma coleção com marcas como Filhas de Gaia e com a Egrey por exemplo. Hoje estamos em uma dimensão maior, mas foi de uns dois anos para cá que a marca explodiu mesmo.
O desejo de criar a marca tem algo a ver com a sua visão do mercado ou é mais uma paixão?
Foi realmente uma paixão! Quando eu era mais jovem, era apaixonado pela Kipling, tinha tudo deles (risos)! E também lembro da minha mãe usando bolsas super diferentes, mas quando cresci, vi que não tinha muita coisa legal – e ainda não tem. Hoje a gente consegue quase contar nos dedos as marcas de bolsas que fazem um trabalho legal e autoral no Brasil.
Eu gosto de como as bolsas são uma peça super inclusiva, não tem gênero e nem tamanho, o acessório dá essa abertura para qualquer pessoa usar. É mais fácil produzir um acessório do que uma roupa, não precisa aprovar modelagem. Normalmente só fazemos um protótipo e algumas alterações.
“Minha mãe sempre me ensinou a fazer o melhor com que a gente tem e tem muito disso no meu produto: é uma gambiarra, mas uma gambiarra muito boa.”
–
Suas peças tem alguns elementos marcantes como os mosquetões, as cordas e os artigos de pesca, me conta um pouco sobre seu universo estético?
A inspiração é da pesca sim! Para falar disso eu tenho que voltar à minha infância, quando eu trabalhava com a minha mãe e me virava com o que a gente tinha, nas customizações e na pintura. Minha mãe sempre me ensinou a fazer o melhor com que a gente tem e tem muito disso no meu produto: é uma gambiarra, mas uma gambiarra muito boa. O brasileiro já nasce fazendo gambiarra né, e não digo isso em um sentido pejorativo.
E como isso começou?
Essa brincadeira com as cordas e os mosquetes começou quando eu ainda morava em Franca. Eu estava sem fazer nada, desempregado e precisando de dinheiro. Eu morava ao lado de uma casa de construção onde tinha uma parede imensa de cordas coloridas e pensei “preciso fazer alguma coisa com isso”. Daí eu comprei algumas cordas e mosquetes e comecei a fazer pulseiras, foi assim que tudo começou.
Isso virou como uma assinatura sua…
Virou, não é? Eu já tinha vontade de usar isso há muito tempo, eu gosto muito de usar coisas que não eram para estar ali, mas são bonitas e trazem um conceito para a peça. Nas minhas últimas bolsas têm mordedores de cachorro, cabos usb, cabos de telefone.
Como é seu processo criativo?
Esse é meu processo: eu vou para a rua e tento visualizar coisas diferentes que eu posso trazer para as peças. Se a gente só busca referências na própria moda, isso vira uma grande cadeia onde uma pessoa se inspira na outra. Eu não sigo nenhuma marca. Se você me perguntar marcas que eu gosto, eu não sei! Acho sim que a gente tem que ver o que está acontecendo, mas se eu fico olhando o que o vizinho está fazendo, a gente acaba se cobrando demais em fazer igual.
Eu faço o que tenho vontade de fazer, vou no feeling, se der certo que bom, se não tudo bem também! Eu aprendo todos os dias sem ficar olhando o que, por exemplo, a Prada faz.
“Eu quero produzir a quantidade exata, não quero fazer mais do que vou vender. “
–
E como você organiza os seus lançamentos e criações?
Se eu fosse lançar sempre que crio algo novo, eu lançaria todo dia! (risos) Aqui no showroom tem várias peças novas que ninguém nunca viu, eu vou criando e depois pensando o que eu quero lançar agora e o que vou lançar depois. Eu não sento para criar uma coleção, é algo que vai acontecendo.
Nós também não temos pontos de venda físicos, já vendemos em marketplaces de moda, mas percebi que não conseguia estar presente nesses lugares e fazer as coisas da forma que eu queria: que é vender um produto e depois entregar, sob demanda. Nós lançamos na semana passada a Nylon Bag, que os clientes vão receber só em abril, por exemplo. Eu quero produzir a quantidade exata, não quero fazer mais do que vou vender.
Com isso você também não faz liquidação, não é? Você acha que isso desvaloriza o produto?
Diminui totalmente o valor da marca! Sou realmente contra, não faço sale das bolsas, porque são itens atemporais, não vai sair de moda e não é justo com meu cliente que comprou com o preço cheio ver depois que o produto está muito mais barato.
A sua marca está crescendo exponencialmente, qual é a média da tiragem anual da Alexandre Pavão?
Desde 2020, nossa tiragem tem mudado muito, não temos uma média. Mas de 2020 para 2021 nós tivemos um crescimento de 800 a 1000% nas vendas.
As redes sociais parecem ter um grande impacto para suas vendas e reconhecimento de marca. Como você vê isso?
Antes mesmo de ter Instagram eu e minha mãe já vendíamos por SMS e íamos na casa das pessoas, mas as redes sociais ampliaram muito tudo isso. No TikTok nós não temos muito conteúdo, eu sou de uma geração que não sabe direito mexer no TikTok, mas é algo orgânico. A #AlexandrePavão, tem mais de 4,9 milhões de visualizações de outras pessoas fazendo unboxing.
Algo que chamou muita atenção no seu trabalho, principalmente em 2020 e 2021, foram as diversas empreitadas sociais e solidárias que você fez com a marca. Me conta um pouco sobre isso?
Eu já fazia trabalhos sociais antes da pandemia e o trabalho que eu fazia havia fechado porque muitas das pessoas que trabalhavam lá eram idosos. Aí me veio a ideia de criar um produto e ter 100% do lucro revertido em uma boa ação, e então surgiu a Love Handbag, que vendemos a um preço simbólico e tem toda a renda revertida para diferentes tipos de auxílio social.
A gente sabe que empreender no Brasil de forma independente não é fácil e a Alexandre Pavão conseguiu um sucesso comercial significativo. Qual você vê que é o seu grande diferencial de negócios?
Tudo que eu aprendi foi com a marca. Eu acho que a gente tem que ser mais verdadeiro com a nossa marca e o nosso propósito. Se eu falo que vou fazer uma bolsa em pouca quantidade, exclusiva, e que não será reposta, eu não posso logo depois abrir mão do meu conceito de marca só porque “tá todo mundo querendo” aquela peça, só para ganhar dinheiro.
O dinheiro não vale a construção do posicionamento da minha marca, o dinheiro é uma consequência. Acho que muitas marcas ainda pecam em não criar certas estratégias. Hoje eu sei muito bem como funciona minha marca, e é com lançamentos exclusivos e em pouca quantidade.
E as roupas? Você também começou há algum tempo a produzir algumas peças de vestuário mais pontualmente.
Estamos lançando algumas peças de roupa, mas é mais para complementar o universo da marca, não vou me tornar uma marca de vestuário. Sempre vai ter alguma roupa, mas esse não é o foco.
Você iniciou seus estudos na moda pelos calçados, existe o desejo de voltar a criar calçados?
Tenho desejo, mas é complicado o processo produtivo. Demanda muita produção, existe a questão da grade de numeração – para se fazer uma coleção você precisa ter todos os números de tamanhos e isso é uma produção muito grande. Eu tenho vontade de fazer, mas é algo que vai vir aos poucos, se acontecer.
Qual a sua dica ou conselho para novos designers?
Faça diferente. Eu acho que não tem por que fazer o que todo mundo já tem. Por que as pessoas vão deixar de comprar o que já existe para comprar o seu? Quando a gente cria um produto ele tem que ser diferente, tem que ter um propósito, diferencial, design. Também acho que tem muita gente que quer surfar na onda de outros produtos e criar peças inspiradas no que está em alta. E é lógico que isso vai vender, mas vai ser uma marca temporária. Então você tem que saber se você quer ter uma marca duradoura ou só uma que vai fazer dinheiro rápido.
Qual a sua visão do futuro? Quais os próximos passos da Alexandre Pavão?
Sobre o futuro, eu não penso muito. Eu costumo viver o agora, hoje a marca está aí, amanhã não sei! Claro que tenho muitos desejos de criar coisas, mas são coisas que vão acontecendo, eu não faço muitos planos.
–
@alexandrepavaodotcom