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    Entrevista: Herchcovitch faz 40 e abre o jogo com o FFW
    Entrevista: Herchcovitch faz 40 e abre o jogo com o FFW
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    ale©Alexandre Herchcovitch

    Alexandre Herchcovitch completou 40 anos nessa quinta (21.07). O FFW encontrou com ele em um café nos Jardins para um longo papo, aberto e divertido, em que ele conta que não está mais na direção criativa da Rosa Chá, fala sobre o processo de venda da sua marca, relembra o início de sua carreira, critica a crítica (ops!) de moda no Brasil e ainda revela algumas curiosidades, digamos, mais íntimas. Após mais de 20 anos de carreira, ele está mais forte e mais corajoso, e com a sabedoria para derrubar antigos mitos sobre a profissão do estilista.

    Como você se encontra aos 40? Mais ou menos feliz? Mais ou menos saudável? Mais ou menos seguro?

    Bem mais feliz. Voltei de férias recentemente, fiz um check-up geral, coloquei documentos em dia. Já a saúde, tenho que olhar um pouco mais, pois agora com 40 começa aparecer um monte de coisinha, colesterol, etc. Mas estou bem melhor. Em relação à confiança, estou igual. Sempre fui seguro nas questões mais matemáticas. Já aconteceu muita coisa comigo, desde ser pioneiro em mostrar a roupa fora do Brasil, vender a marca para um grupo, ter tido uma experiência que não deu certo e outra que deu…  Também trabalho para outras marcas desde que me formei, que conto como experiências importantes também.

    Olhando para trás, você teria feito algo diferente?

    Não me arrependo de nada. Tudo que fiz foi muito pensado e poucas coisas foram impulsivas. Mesmo as experiências ruins acabaram por me aproximar de pessoas que me ajudaram a entender o que estava acontecendo.

    Você é uma pessoa muito reflexiva?

    Sou, mas trabalho muito mais com a intuição. Quando penso muito, acabado não fazendo. Eu penso objetivamente e levo minha intuição em conta. Quando era mais jovem, era mais impulsivo, trabalhava sozinho, lançava as coisas, era inovador, a pessoa criativa do momento. Isso até a profissão de estilista virar moda e todo mundo querer fazer. Naquela época eu fazia o que queria, não tinha muitos concorrentes do lado.

    É mais confortável assim?

    É, porém quando você não tem competição, acha que o que está fazendo é o melhor e nem sempre é assim. Aprendi muito no trabalho em equipe e às vezes a minha ideia não é a melhor ideia. Hoje tudo é questionável, as regras caem a cada dia. E isso é bom, não tem mais aquela coisa da verdade absoluta.

    Por que todo mundo quer ser estilista?

    Em cada década uma profissão explode. Já foi com publicitário, modelo… Acho que tem uma coisa que é ruim nessa carreira: a opinião dos estilistas virou muito importante mesmo em assuntos que não são ligados a moda. Os jornalistas vão atrás da opinião do estilista para tudo e eles passaram a aparecer mais. Então essa vontade é por ignorância e pela ilusão de que você vai ser famoso, uma celebridade. Isso eu já ouvi na faculdade de moda. Por que você quer ser estilista? O aluno respondeu: ah, porque é um mundo glamoroso, você fica famoso…

    Ele disse isso pra você?

    Sim… Aluno recém-entrado. Eu falei: vocês estão completamente enganados. Você só vai ter notoriedade se o seu trabalho tiver alguma validade. Você pode até chamar atenção no início da sua carreira, mas se não tiver maturidade e uma constância, você logo será esquecido. Ninguém quer ser técnico têxtil porque técnico têxtil não entra no final da passarela. É uma realidade dura.

    lojaFachada na nova loja, em São Paulo, na rua Melo Alves ©Reprodução

    Como foi o processo de venda da sua marca? O que você sentiu?

    Muito bem porque preparei uma marca, durante 20 anos, em cima do que eu acredito e essa marca teve um valor para ser vendida. Me senti valorizado, que todos os obstáculos que eu tive que transpor resultaram em alguma coisa e eu confiei cegamente na continuidade da marca através de outros gestores e as coisas estão caminhando bem. Passamos por momentos difíceis de relacionamento e de entendimento do que eu acreditava e do que eles acreditavam. Hoje não sou dono da minha marca. E tudo bem. Sou um prestador de serviço da marca da qual eu já fui dono.

    Você não tem apego?

    Nenhum. Tenho plena consciência de que consigo exercer minha função, faço isso bem. Se um dia eu não trabalhar mais na AH eu vou trabalhar em outro lugar. E tudo bem também. No fundo o que importa pra mim é eu ter espaço para poder realizar o meu trabalho. Fui de cabeça já sabendo que poderia acontecer um monte de coisas. Mas eu estou feliz enquanto eu tiver o espaço para fazer o que gosto de fazer. Aliás, eu tenho que falar que, em quatro anos de sociedade nunca ninguém falou um “a” sobre as minhas criações. Nunca ninguém veio me perguntar por que eu escolhi essa cor ou esse tecido, por que escolhi esse tema. Essa liberdade foi mantida. A gente já viu experiências mal sucedidas, como a compra da marca Sommer, que tinha um universo riquíssimo e foi mal explorada. Pra que repetir?

    Você sofre muita pressão para conquistar resultados?

    Todo mundo da minha empresa sabe quanto tá vendendo, quanto dinheiro tem no caixa, quanto falta para cumprir a meta. É muito aberto e saudável. A assistente de estilo recebe um e-mail de quanto a loja vendeu diariamente e isso é importante porque todo mundo quer chegar ao mesmo lugar. Existe uma pressão para você cumprir a meta anual de despesas e receitas, porque conforme o comprimento dessa meta, a gente vai ter mais fôlego pra fazer coisas legais, vai fazer com que a gente tenha um próximo ano melhor e por aí vai. E todo mundo tá correndo atrás do melhor resultado, isso é fato.

    Como você percebe a crítica de moda no Brasil?

    Estou muito decepcionado porque vejo jornalistas de veículos importantes dando crédito à roupa copiada sem saber, então não tem estudo, não tem informação. Às vezes eu converso com jornalistas e falo sobre um tecido e percebo que a pessoa não faz ideia do que estou dizendo. Eu me lembro da época em que não via a hora de ler a crítica da Erika (Palomino), por exemplo. Hoje os poucos veículos que poderiam criticar e analisar, não estão fazendo isso, eles apenas descrevem os desfiles.  Daí você lê uma matéria que diz que o melhor desfile da SPFW é um em que todas as roupas são copiadas, então eu não leio mais. Acho bem esquisito. A moda é muito popular hoje em dia, então a linguagem tem que ser mais popular e menos profunda. O ruim é que você tem que se nivelar por baixo.

    livros-aleLivros lançados: “Herchcovitch; Alexandre” (2002, Cosac & Naify); “Cartas a um Jovem Estilista” (2007, Ed. Campus); Coleção Moda Brasileira (2007; Cosac & Naify) ©Reprodução

    Quais foram os momentos mais marcantes da sua carreira?

    A primeira vez que eu exportei, que desfilei fora do Brasil, que minha roupa foi aceita em outro lugar (Londres, 1998). Quando eu comecei a trabalhar na Zoomp (98), pois era a marca que eu vestia quando era adolescente. A abertura da loja de Tóquio, os livros que lancei… Também acho importante quando percebo que minha roupa está mais bem feita, mais bem costurada. O trabalho que fiz e faço para outras marcas também acho marcantes, pois me dão tanto prazer quanto a minha própria. Eu me alimento das trocas diárias, gosto da convivência.

    Você já desfilou em Londres, Paris e Nova York. Como foram as experiências internacionais?

    Eu aprendi que se você não tem um respeito comercial lá fora, se não vende nas melhores lojas, você não vai ser respeitado pelo seu trabalho. Depois de quatro coleções, se você não começou a dar sinais de se estabelecer, as pessoas perdem o interesse. Se você fez o melhor desfile, com as melhores modelos, com o melhor styling, a melhor assessoria de imprensa, não pode voltar pra trás. As pessoas vão ser muito cruéis.

    Você já passou por algo assim?

    Várias situações. Já passei por sete PRs, sei lá quantos showrooms e é complicado. É complicado mesmo. É um jogo caro e de uma tacada só, não tem volta.

    Qual a peça que mais vendeu até hoje?

    A camiseta de caveira é um item que existe há 20 anos e ainda é feita. É um marco, uma das primeiras coisas que eu vendi e que existe até hoje.

    Olhando para o seu histórico, quais você considera suas marcas registradas?

    Alguns aspectos aparecem nas minhas coleções com regularidade. Lingerie, por influência de ter trabalhado na confecção de lingerie da minha mãe, que era dentro de casa; o underground de SP ou em geral, também aparece às vezes. Uma característica muito forte do meu trabalho é a ironia, eu brinco comigo mesmo ou com códigos que criei. Essa coleção de Verão 2012, toda clarinha, é uma pura ironia se você quer saber. Na temporada de inverno teve aquela coleção toda dark, pesada e logo em seguida vem essa delicada com cores de doce… As pessoas devem pensar: “esse cara está tirando sarro de alguém”. Mas a verdade é que eu tenho vontade de ironizar os padrões e conceitos do que é a mulher, do que a mulher pode ou não pode. Essas regras são todas horrorosas e a gente só trabalha com liberdade quando as regras caem.

    ale-inverno-veraoDois pesos, duas medidas: os desfiles de Inverno 2011 e Verão 2012 ©Fotosite/FFW

    Você se acha bonito?

    Eu? Vou te responder de outra forma: eu não mudaria nada (risos). Se eu mudasse algo mudaria no corpo, mas não o rosto, sou feliz com ele. Mas não me acho bonito, nada disso, só estou satisfeito.

    Quem não te conhece acha que você é uma pessoa fria…

    Sou bem frio em alguns aspectos, nos práticos especialmente. Já fui muito menos em relação aos problemas. Antes eu podia ter uma úlcera e hoje eu arrumo uma solução criativa pra o problema e não me estresso. As decisões são objetivas, rápidas, frias e calculadas.

    Com relação às pessoas eu não sou. Com as pessoas que eu conheço, sou generoso, cuidadoso. Sou interesseiro, no sentido de ter interesse em passar tempo com a pessoa porque ela é muito legal. Tenho amigos que vejo uma vez por mês, que eu tenho interesse em ser amigo deles, de sentar e contar os velhos problemas, como a Carol Gannon e o David Pollak. E eu confio muito nas pessoas, já não sei se isso é bom ou ruim.

    O que faz você feliz?

    Coisas pequenas e fáceis de fazer. Gosto de modelar, costurar, pensar no acabamento, fazer roupa. O relacionamento que eu tenho com Fábio (Souza, marido) também me deixa feliz. Ele me ensinou muitas coisas, fez com que eu visse vários aspectos da minha vida, com que eu conseguisse aproveitar mais o dia, seguindo a filosofia dele de trabalho. Desde que eu comecei a falar abertamente da minha relação com o Fabio, a relação com a minha família, que sempre foi maravilhosa, melhorou, pois faltava isso. Faltava as pessoas saberem como eu sou da minha própria boca. Nunca cheguei para os meus pais e falei sobre o que eu era, o que eu sentia. Eles sempre foram maravilhosos e não foi diferente depois que todo mundo soube que eu era casado, e casado com um homem.

    Uma das coisas que mais tenho prazer é fazer refeições com pessoas que eu gosto. Pra mim é um momento muito especial, que eu só divido com quem eu tenho muita afinidade. Gosto de levar gente em casa e cozinhar pras pessoas…

    Você sabe cozinhar?

    Sei.

    O que você faz?

    De tudo. Domingo de manhã acordei e fiz uma mousse de chocolate, com todas as sobras de chocolate que tinha no armário: amargo, crocante, branco, com castanhas.

    Você chora?

    Não choro há tanto tempo! O Fábio que fala: você é uma pedra, uma lápide! Choro com filme bobo, desenho da Disney, “Rei Leão”… Me emociono com besteira. Às vezes recebo notícias esquisitas, ruins e minha reação não é chorar. Eu choro por dentro, né? Sei lá como que eu choro…

    rei-leao08

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