A editora Tordesilhas, que publica o livro A Elegância do Agora, de Costanza Pascolato, cedeu um dos capítulos do livro para ser lido em primeira mão aqui:
Cap. 3 – Sensibilidade Periférica
Ele era o rei da diplomacia. Sabia tudo sobre códigos sociais, como apresentar pessoas, conversar com elas, fazê-las sentir à vontade num ambiente de cordialidade e elegância. Meu pai foi o homem mais gentil e bem educado que conheci em toda vida.
Ele tinha alma – corpo e porte – de esportista. Remava, jogava tênis, montava cavalos com destreza incomum, vencendo frequentemente aquelas provas dificílimas de obstáculo fixo.
Piloto corajoso, suportava longas distâncias inclusive em combates de guerra, naqueles monomotores pré-históricos, com estruturas de tela e acabamento de madeira.
Um charme de homem, entendia profundamente de filosofia, história, música. Tocava violoncelo, um legítimo Andrea Guarneri del Gesú do século 17, era um cidadão de ideais nobres, de alta cultura.
Como também adorava água, tornou-se exímio gondoleiro. Além da perícia com os remos, manejar uma gôndola com velocidade, pelos canais estreitos de Veneza, exige bastante equilíbrio – outra qualidade notável de Michele Pascolato.
Michele nasceu na virada do século XIX para o XX, era cultíssimo e falava várias línguas, numa época em que isso não era comum, mesmo entre a elite política e econômica.
Recebeu uma educação acadêmica num contexto de formação pública, aprendeu protocolos diplomáticos e sutilezas para se comportar com tranquilidade em ambientes extremamente formais.
Logo compreenderia que educação é demonstração indispensável de respeito social, tornando-se o produto mais bem acabado de um novo
sistema de etiqueta – em que a regra número 1 é o outro.
Você precisa prestar atenção ao outro – era o que dizia, e o que demonstrava na prática, em casa, em todas as reuniões, encontros, jantares, em que o vi interagindo como um lorde, sempre interessado em tudo, em todos.
Em qualquer conversa, ele me explicava – você deve retirar atenção de seus próprios problemas, e manter o foco em quem está na sua frente.
Olhe para quem você está conversando. Mantenha uma comunicação afetiva com a outra pessoa, tente compreendê-la, saiba ouvir.
EU era um pronome quase proibido no vocabulário de Michele Pascolato. Meu pai proibia que a gente começasse qualquer frase com o pronome EU, instruindo-nos a usá-lo por último em qualquer frase com mais de um sujeito.
É preciso recuperar rituais de dignidade social que andam tão esquecidos como duas palavras essenciais, em nossa língua: ética e empatia.
CINCO hábitos que meu pai me ensinou a ELIMINAR em qualquer tempo e idade
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Não fale alto
Controle-se. Está vendo que sua voz está aumentando – abaixe o volume na hora. Lembra quando precisa contar alguma coisa para alguém sem que todo mundo escute? Então, você sabe como falar baixo – é assim.
Falar alto incomoda os outros, é um atestado de vulgaridade – nunca conheci ninguém realmente elegante que falasse alto.
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Não interrompa quem está falando
Mesmo que você não concorde, ou tenha uma ideia melhor, ou já saiba a solução para o problema que a pessoa está narrando – deixe-a terminar. As crianças também precisam ser educadas nesse sentido, não é porque é sua filhota que pode – interromper nunca. Espere uma pausa do seu interlocutor para falar.
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Não se atrase
O seu tempo não é mais importante do que o dos outros – portanto cumpra os horários combinados.
Entre os brasileiros, cariocas e baianos são especialistas na arte do atraso. Chegam sorrindo, mandam emojis pelo whatsapp dizendo que estão a caminho – mas fica difícil suportar. Pontualidade é qualidade incontornável para quem pretende manifestar o mínimo de respeito pelo outro.
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Não reclame
Se está com frio, calor, se a faxineira faltou, você está sem dinheiro – o problema não é do outro, portanto evite desabafar com quem não tenha absoluta intimidade. Aliás, até para o marido, pai, amiga, é bom escolher assuntos mais palpitantes do que a sua renitente dor de cabeça.
Quando alguma situação for de fato difícil, complicada, insuportável – entenda porque e tente sair dela. Encontre alternativas. Não reclame, tome uma atitude.
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Não faça perguntas indiscretas
Por quanto você vendeu seu apartamento? E a sua namorada também vai? Quantos anos ela tem? Por que saiu daquele emprego? Se a pessoa não toma a iniciativa de contar, não pergunte. Contenha-se. Pense em assuntos que a interessem, que a façam sorrir e brilhar – não em saciar sua curiosidade pela vida dos outros.
Foi meu quem me ensinou um conceito essencial:
sensibilidade periférica.
É muito importante desenvolver a noção do que acontece a sua volta, das pessoas que estão ao seu lado.
Uma pessoa ocupa seu corpo e também o espaço a sua volta – cuide para que seus gestos não invadam esse lugar, sua voz e seus problemas não incomodem o vizinho na cadeira ao lado, que pode estar tentando meditar enquanto você fala no celular.
Não existe só você e o que está dizendo, fazendo, seu trabalho, suas necessidades: parece óbvio, cristalino, mas há quem desconheça o mundo girando em torno de si.
Há quem fale com uma pessoa ignorando quem está ao seu lado. Ou pior – há quem grite para quem está lá na frente, ou na mesa atrás, ignorando o espaço do vizinho no restaurante, do colega no escritório, do outro no saguão do aeroporto.
Andando na rua – no elevador – numa exposição – preste atenção em quem está perto.
Não siga andando como se fosse dono da calçada, falando no telefone sem perceber quem precisa passar, ou caminhando tão rápido a ponto de trombar na pessoa da frente.
Se o museu está cheio, respeite as filas, o fluxo, não fique horas em frente a um quadro disputado.
Se a reunião é curta, não se estenda em seu próprio assunto, abrevie, divida, ceda a vez.
Em casa, respeite o espaço periférico do seu filho, da mãe, marido, diarista. Aproxime-se das pessoas com quem quer falar, não grite da cozinha para a sala, ou ao contrário, não torne esse tipo de comunicação uma rotina familiar.
O livro “A Elegância do Agora”, de Costanza Pascolato, será lançado dia 09.09 pela editora Tordesilhas
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