Fale Alta Costura e a maioria de nós já pensará em vestidos grandiosos e magníficos, tecidos opulentos, bordados e enfeites ricos. No entanto não tem que ser sempre assim, como provou a coleção “Moda Povera”, de Olivier Saillard, mostrada no meio da última semana da Alta Costura em Paris, em julho. Olivier é historiador e um dos mais renomados curadores de moda. Hoje à frente do Museu Galliera, dedicado ao assunto, ele esteve por trás de exposições de Azzedine Alaïa, Comme des Garçons, Yohji Yamamoto e Madame Grès além de performances com a atriz Tilda Swinton.
Para sua primeira coleção de roupas, ele escolheu começar com a mais humilde das peças, a camiseta em algodão, para transformá-la em criações de Alta Costura.
“Compramos na internet camisetas de qualquer tamanho. T-shirts baratas. Em alguns casos, os custos de envio superaram o preço da camiseta em si. Moda Povera é provavelmente a coleção menos cara por um longo tempo” disse Saillard ao WWD. A paleta de cores aleatória das camisetas incluía branco, verde musgo, preto, laranja, vermelho vivo e cinza mescla e dependia do estoque que Saillard encontrava na internet.
foto: giovanni giannoni
Ao contrário de suas aclamadas exposições e performances artísticas, dessa vez Saillard optou por uma abordagem mais humilde. Ele ressuscitou o verdadeiro espírito dos desfiles de Alta-Costura numa pequena sala, para um pequeno grupo de pessoas e clientes. Um desfile praticamente particular em que as duas únicas modelos olhavam diretamente nos olhos dos convidados enquanto desfilavam e até sorriam deixando tempo para todos fazerem suas fotos.
Para construir a coleção de 27 modelos ele contou a ajuda de Martine Lenoir, de 75 anos, a última costureira de Madame Grès nos anos 70 e 80, e da modelista Axelle Doué, que também trabalhou como manequim para a designer francesa no início dos anos 80. As duas conheciam os segredos mágicos da mão da grande estilista.
foto: giovanni giannoni
Com a ajuda delas, as camisetas foram adaptadas e transformadas em vestidos ou túnicas, enriquecidas não com elementos visualmente impressionantes, como miçangas, lantejoulas e bordados, mas com elementos arquitetônicos que as reconfiguravam. Elas foram abertas nas costas, torcidas em novas configurações, ou cortadas para expor a cintura e um pouco do dorso.
Para inovar ainda mais, elas foram usadas de trás para frente, cortadas, plissadas, dobradas transformando essas peças tão simples em uma série de designs extremamente refinados sem deixarem de ser camisetas. Importante dizer que, apesar de simples, as peças foram feitas seguindo as regras e os princípios da Alta Costura. Se no lado exterior elas ainda eram simples camisetas, na parte de dentro os acabamentos eram de um vestido de Alta Costura com três pequenos pontos de cruz vermelhos para lembrar o usuário que lado é a frente da roupa e ainda grinaldas internas de gorgurão para fixar as pregas, deixando a ilusão de despreocupação e painéis de organza acabados à mão para estabilizar os plissados.
olivier saillard veste as modelos durante a apresentação / foto: giovanni giannoni
Enquanto o nome da coleção “Moda Povera” foi emprestado do movimento “Arte Povera” (movimento artístico que surgiu na segunda metade da década de 60 na Itália) e dos seus princípios, como a utilização dos materiais mais comuns, a principal inspiração foi mesmo o trabalho de Madame Grès e o objetivo final foi transformar o item mais comum visto nas ruas (alô streetwear) em algo mais bonito e único. E com isso, Saillard prova que com criatividade a boa moda pode ser criada a partir de qualquer material, uma vez que você estuda e detém a técnica do fazer.