Na semana de moda masculina de Paris (que terminou no dia 27/06) a alfaiataria esteve no centro das atenções. Estilistas dos mais variados pareciam obcecados por encontrar um “novo terno” para o homem contemporâneo. Um uniforme masculino mais “iPad” ou “Twitter”, menos “486” ou “Startac”.
Alteraram proporções, inverteram silhuetas, ampliaram as partes de baixo, ajustaram as de cima, substituíram costuras por zíperes, esconderam botões, eliminaram golas, deceparam mangas e injetaram um pouco mais de criatividade do que aquilo que vimos em Milão.
Yves Saint Laurent, Rick Owes, Kris Van Assche e Dior Homme verão 2011 ©firstVIEW
Stefano Pilati na Yves Saint Laurent eliminou as laterais das jaquetas, transformou calças em bermudas-saias com corte em “A”, e experimentou ao máximo nas proporções. Rick Owens alongou seus blazeres e arrancou as mangas num misto de androginia com religiosidade. Kris Van Assche deu extrema leveza a sua alfaiataria de volumes assimétricos na Dior Homme e a fundiu extraordinariamente com o sportswear numa das melhores coleções de sua própria marca.
Dries Van Noten misturou mods + skinheads e encurtou as barras de suas calças. Paul Helbers fez uma viagem étnico-cultural incorporando diversos elementos (de forma super inteligente) numa de suas melhores coleções para Louis Vuitton. E Riccardo Tisci, na Givenchy, uniu o blazer a calça, agora com gancho baixo, sobre camisa rendada em forma de estampa animal.
Mas o problema da alfaiataria, ou melhor, do terno, vai muito além dessas miudezas de modelagem, silhueta e proporção. Não diz respeito apenas à escassez de empregos, incerteza econômica, tão pouco à flexibilização dos dress-codes dos ambientes de trabalho. O real problema que assombra o tradicional costume masculino é sua atual falta de relevância sóciocultural.
Há muito tempo se foi a época em que a combinação calça + camisa + paletó vinha acompanhada de valores como respeito, prestígio, status social. Em tempos de hiperindividualidade, esse uniforme contemporâneo (em seus moldes convencionais), já não faz tanto sentido na vida das pessoas. São poucos aqueles (e principalmente da geração Y) que encontram nos ternos alguma real conexão com suas vidas.
O que parece faltar na moda masculina, então, é justamente acompanhar essa evolução desenfreada, ultraveloz e experimental que já faz parte das vidas de seus consumidores.
Raf Simons verão 2011 © firstVIEW
É por isso que o verão 2011 de Raf Simons parece tão mais convincente. Há 15 anos no ramo, o estilista belga fez valer seu mérito como um dos designers de moda masculina mais vanguardistas do momento (foi ele que lá nos anos 90 introduziu o primeiro terno skinny, bem antes que Hedi Slimane fosse creditado, indevidamente, pela façanha).
Numa coleção repleta de ícones de sua carreira, Simons trabalhou a mesma silhueta alongada que deu o tom da temporada, porém com um impressionante equilíbrio entre precisão e emoção. Amplas calças que cobriam os pés vinham combinadas com suas famosas jaquetas/túnicas sem mangas mais ajustadas ao corpo. Nas costas, aplicou pesados zíperes industriais sobre faixas de cores intensas. A imagem final é menos formal e mais experimental, e nem por isso distante dos consumidores. Como dizia uma das estampas de suas camisetas, foi uma coleção para falar de realismo (“realness”).
Lanvin verão 2011 © firstVIEW
Lucas Ossendrijver, sob a tutela do diretor criativo Alber Elbaz, parece também ter capturado o atual clima da moda masculina. Sua mais recente coleção para Lanvin falava justamente da urgência, ação e mobilidade que nos rodeia. Agora a silhueta parecia ansiosamente ajustada ao corpo, barras e acabamentos incompletos sugeriam uma constante pressa, ao mesmo tempo em que roupas ultratexturizadas (vide os ternos em bordados de pequenos recortes de seda) falavam de uma certa intimidade e necessidade de toque.
Algo de esportivo nas blusas enroladas nos ombros ou na cintura, nas calças levemente ajustadas nos tornozelos, nos blazeres abraçando o tronco e nas bermudas de tricô que simulavam aquelas de ciclistas, vinham agora não só falando de uma alfaiataria ou elegância despojada, mas também da agilidade e funcionalidade acentuada dos dias de hoje.
+ Veja as fotos das coleções completas que desfilaram o masculino em Paris Verão 2011.