Não há mais como as marcas de luxo escaparem do poder do digital. Porém, mesmo com tantos estudos que apontam para o crescimento estrondoso das compras online do segmento nos próximos anos, ainda há muitas empresas que evitam essa realidade.
Segundo o escritório de consultoria Bain & Company, ouvido pelo site Luxury Daily, cerca de 40% das marcas não vendem online.
Um número absurdo para o universo da moda, que supostamente vive das novidades e de rastrear com antecedência os passos e desejos do consumidor. O WWD teve acesso a um estudo da McKinsey & Co. sobre o e-commerce na indústria de luxo e o resultado aponta para a afirmação: o digital é uma obrigação para o crescimento do mercado.
A pesquisa mostra que as vendas online representam 6% do total de vendas no setor, ou melhor, € 14 bilhões. Em 10 anos esse número deve triplicar: a expectativa é que suba para 18% em 2025, ou € 70 bilhões.
Apesar de muitas grifes venderem parte de seus produtos em canais multimarcas, esse crescimento será abastecido pelos e-commerces próprios. “Acredito piamente que é imprescindível para as marcas terem seu próprio e-commerce pela simples razão de que elas lucrarão mais com vendas diretas”, diz Ryan Clark, fundador da Luxury Branded, agência de marketing voltada para o segmento de luxo. Vender através de sites como Shop-Hers e Net-A-Porter inclui o pagamento de comissões que giram entre 13% e 18%, um dinheiro considerável que poderia entrar diretamente para a grife. Clark avisa: “As marcas de luxo que ainda não estão vendendo online irão seriamente perder oportunidades nos mercados emergentes ou nos países onde não estão presentes fisicamente”.
Consumidores com bastante poder aquisitivo já mostraram interesse em comprar produtos de luxo online e ainda assim muitas marcas hesitam em adotar o e-commerce como parte de sua estratégia de varejo, em parte achando que o valor pode afastar os usuários. Quanto mais alto o preço, menor a chance de você encontrar o produto na internet. Segundo Nathalie Remy, da McKinsey, há também uma cultura de aversão ao risco e falta de conhecimento sobre experiência digital. Muitas marcas de primeiro time não conseguem ainda oferecer a mesma experiência que grandes varejistas, como a Amazon. “Custa muito dinheiro colocar um bom e-commerce para funcionar. Além disso, os talentos digitais mais cobiçados hoje não se atraem muito pelo mundo do luxo, então é a velha guarda que tem que entender que os reflexos de ontem não são iguais aos de amanhã. Infelizmente, essa compreensão leva tempo.”
De acordo com o estudo da McKinsey, o esforço vale a pena. “Uma vez que a empresa atinge a marca dos 6% nas operações online, as vendas tendem a explodir, alcançando uma média de 20% dentro de cinco anos”, explica Remy, que cita a Kate Spade como um caso, com alcance de 23% de venda online.
A Chanel, que até então evitava vender online, fez uma experiência por meio de uma ação de shop-in-shop de três semanas no Net-A-Porter para vender uma coleção cápsula de joias, a Coco Crush. No entanto, sua loja online própria limita-se à venda de cosméticos, hoje segmento líder no mercado de luxo. O teste com o Net serviu também para a marca entender a demanda pelo seu produto e a Chanel planeja lançar uma loja online com mais ofertas no futuro, segundo o Luxury Online. Mas será que esse futuro já não é agora? “Com a globalização do mercado de luxo, a necessidade de oferecer produto na internet não é mais percebida como uma ação arriscada no varejo de luxo, muito pelo contrário. Estar digitalmente bem armado só o torna mais competitivo”, diz Jay Holan, vice-presidente da consultoria Fit For Commerce.
Há também o fator conveniência agregada à falta de tempo. Muitas pessoas preferem não perder tempo indo até a loja e optam por comprar clicando apenas alguns botões e receber o produto na porta de casa. “Há um nível de confiança forte nas compras online e isso irá rapidamente empurrar a indústria para novos patamares nos próximos cinco anos”, diz Clark, da Luxury Branded.
Se ter um e-commerce é hoje fundamental, também é imprescindível que ele seja funcional e eficiente e entregue uma boa experiência de navegação e compra por parte do usuário. Um site mal feito ou um serviço ao cliente ruim pode levar todo o investimento pro lixo. A forma como recebemos o produto em casa também é importante e pode ajudar a estreitar o relacionamento com a marca e até impulsionar novas vendas.
Segundo as pesquisas, o crescimento de vendas online é tão certeiro que os consultores arriscam a dizer que, se você tem que investir, invista no digital. O abastecimento versus demanda, a habilidade de contar uma boa história online e conectar diretamente com o cliente explorando a web e a compra de dados mostram que os varejistas de luxo podem crescer e gerenciar relações com consumidores poderosos de forma mais cuidadosa ao redor do mundo. “É essencial hoje colocar isso na balança versus o investimento que as grifes fazem com pontos de venda e contratação de staff”, diz Holan, da Fit For Commerce. “A mobilidade e a impulsividade dos consumidores de luxo na era digital demanda conectividade imediata.” E o mais rápido que você puder entregar – com estilo – irá construir a lealdade deles de forma muito mais eficiente do que abrir novas lojas.
Isso nos leva a outro ponto fundamental para a experiência online, que é o fator mobile. Consumidores de luxo são também grandes usuários de smartphones e a influência do aparelho nas compras deve crescer nos próximos anos em marcas omnichannel (ou multicanal, que estão presentes em diversas plataformas). Segundo Holan, até 2018 o mobile deve influenciar 80% com US$ 4,5 trilhões em compras nos Estados Unidos.
Ser multicanal e planejar uma expansão de mercado por meio das plataformas digitais é importante. “Esse é o futuro do e-commerce”, disse José Neves, fundador do site Farfetch, o segundo maior e-commerce do mundo, atrás somente do Net-A-Porter, em entrevista ao FFW. Isso significa que o cliente poderá consumir e experimentar o lifestyle da marca em diversos canais, online e off-line. A Farfetch recentemente comprou a icônica multimarcas londrina Browns para fazer uma experiência de varejo conectando o físico e o digital. A Fit For Business aponta que esse é um dos segredos para o sucesso: tornar-se extremamente visível em uma série de pontos e oferecer uma conexão coerente entre as compras no online e no off-line.
Segundo a McKinsey, ¾ das vendas off-line são influenciadas pela internet, uma forte confirmação de como os dois canais dependem um do outro.
Portanto, uma expertise digital 360° é necessária para estabelecer um negócio bem sucedido. Um e-commerce de luxo não se trata apenas de um site de vendas, mas uma via de mão dupla: para o consumidor é uma porta aberta ao lifestyle da marca à distância de um clique; para o empresário, outra porta que desvenda os hábitos e desejos de seus clientes e ajuda a construir uma relação sólida e próxima, mesmo que virtual. Hoje isso já não importa mais, tudo está conectado. O que não pode é deixar esse barco passar.