O semblante calmo e a fala mansa não dão pistas do turbilhão de ideias que passam pela cabeça de Yassine Saidi, diretor global sênior de sportstyle e calçados Select da Puma, que esteve no país pela primeira vez nesta semana e concedeu uma entrevista ao FFW em meio a uma agenda apertada. “Eu estava em Las Vegas, fui para a Alemanha por um dia e em seguida voei para o Brasil; cheguei em São Paulo ontem às 6h, e tem sido agitado”, diz o francês, que ainda voaria para o Rio de Janeiro para participar do projeto O Esporte que Você Veste + Rio Moda Discute Internacional, promovido pelo Instituto Rio Moda.
Yassine veio fazer o que ele faz de melhor: estudar o mercado e se conectar à cultura local para pensar em projetos relevantes para o seu público-alvo – expertise que desenvolveu em seus nove anos de Adidas e que ele vem estabelecendo na Puma desde que se juntou à empresa, em 2011. Ele é o responsável, por exemplo, pelo desenvolvimento da categoria Select, que trabalha o conceito de produtos high-end e fashion, mas com um viés de acessibilidade e engajamento com os consumidores. Ele também tem relação direta com a atuação de Rihanna como diretora criativa da linha feminina da marca, parceria anunciada no ano passado. Na entrevista que você lê abaixo, realizada no Cartel 011, Yassine fala sobre estes e outros assuntos e afirma: “Não é uma questão de vencer o tempo todo; é uma questão de acreditar no que você faz”.
O que está achando do Brasil e qual a sua missão no país?
Esta é a minha primeira vez no Brasil, e estou impressionado. Ouvia falar muito, porque tenho amigos que já vieram e porque trabalho com a Puma Brasil, mas é incrível ver ao vivo.
Eu vim para visitar o mercado, ver o potencial, trabalhar com a equipe e tentar criar coisas especificamente para o país. Temos discutido internamente sobre como abordar o mercado, especialmente no que diz respeito à criação de produtos que sejam relevantes. Meu objetivo é me conectar à cultura brasileira e pensar em projetos que possam ser feitos aqui; por isso vim conhecer o Cartel, e acho que há muitas possibilidades.
Qual é exatamente o seu trabalho na Puma?
Sou responsável por toda a parte de calçados de lifestyle. Também trabalhei na criação da categoria Select, que é a linha premium, onde criamos novos produtos e versões high-end. Mas o propósito principal é criar produtos colaborativos: trabalho com artistas e designers para criar itens que gerem experiências e que nos conectem ao mercado e aos consumidores. Tínhamos um modelo diferente antes disso, chamado Black Station, que era bem voltado para a moda, e eu queria torna-lo mais acessível, olhando para o street wear e o street fashion.
Aproveitando o gancho: a Puma foi uma das primeiras marcas de sportswear a fazer uma colaboração de moda, em 1998, com Jil Sander…
Na verdade não foi uma das primeiras; foi a primeira, e desde então a marca ficou conhecida por suas colaborações com a moda. É louco ver como o esporte passou a influenciar a moda e a moda passou a influenciar o esporte – agora vejo os dois como uma coisa só.
A Puma foi a pioneira, mas é notável que nos últimos anos não tem lançado tantas colaborações quanto marcas concorrentes; por quê?
Fomos os primeiros a introduzir as colaborações, mas depois a marca decidiu tomar outro rumo, outra estratégia. Não digo que deixamos a moda de lado porque tivemos as colaborações com Alexander McQueen, Sergio Rossi, Mihara Yasuhiro, mas isso meio que se dissipou porque a marca estava focando em outras coisas. Agora é hora de ganharmos novamente essa fatia do mercado, e reivindica-la, trazendo nossa própria forma de fazer as coisas – nosso objetivo não é fazer o que os outros estão fazendo, mas fazer aquilo no qual somos bons.
O nosso consumidor quer o “next big thing”. Depende de nós, como marca, reivindicar isso e ser relevante. É por isso que minha estratégia é contratar marcas emergentes, jovens talentos que vão se tornar grandes no futuro, e então o cliente pode se identificar com isso. A primeira vez que encontrei com Chris Stamp, da Stampd, foi há dois anos, em Paris, e a marca era muito, muito pequena. E em 2015, ele ganhou um prêmio de designer de moda masculina nos Estados Unidos. É nisso que eu acredito, nessa abordagem nova para a moda que é moderna e acessível.
Isso seria uma forma de filtrar as colaborações que valem a pena? Porque o mercado está saturado desse modelo de negócio e muitas parcerias parecem não fazer sentido.
E não fazem. Como você disse, você entra em qualquer site e toda semana há 20 novas colaborações. Qual delas vai fazer a diferença? Não se trata de botar dois logos numa camiseta, e sim de criar um design novo, com uma nova abordagem.
Que novas colaborações a Puma está preparando?
Há cerca de um ano, fechei parceria com uma marca da Polônia chamada UEG, que possui um estilo muito avançado e forte. Quando eles vieram ao meu escritório na Alemanha e sentaram com os meus designers, eu vi que eles fariam uma coisa muito boa.
Como é a abordagem para parcerias entre a Puma e outras marcas?
No caso da UEG, tenho amigos que os conheciam bem. Fui pra Varsóvia, na Polônia, e jantamos, e fui ao estúdio, conheci a equipe, vi a coleção, fiz duas ou três ligações para diferentes mercados para me certificar de que funcionaria, e duas semanas depois eles estavam no meu escritório.
Na verdade eu nunca me perguntei como isso acontece… Vem naturalmente. Às vezes eu já tenho algo em mente, às vezes penso em um tipo de colaboração que preciso, e acontece de eu conhecer alguém, ou alguém conhecer alguém. Você sabe, a indústria é tão pequena, todo mundo conhece todo mundo.
Tem um elemento novo que é importante, que são as mídias sociais e os seguidores no Instagram – ver o alcance que eles têm sobre o consumidor. Como vamos usar a plataforma deles para falar sobre a colaboração, temos que nos certificar de que o alcance deles é importante o suficiente para falar sobre isso. A UEG tem, eu acho, seis mil seguidores. Mas eu sei que quando fizermos a colaboração, vai chegar a 80 mil. E eles vão se beneficiar disso tanto quanto nós, porque vão divulgar sua direção criativa, que é muito forte.
E quanto à parceria com a Rihanna? Por que ela, e por que um papel tão grande, de direção criativa da linha feminina da Puma?
A marca sempre foi apelativa para as mulheres – a primeira colaboração foi com uma mulher -, e pensamos em ter uma mulher jovem para um trabalho forte. Quando você olha para o mercado de entretenimento, esportes, não tem ninguém como ela: uma artista realizada, conhecida no mundo inteiro, muito bem-sucedida, e um ícone de estilo. Fechamos com ela em dezembro, e dois meses depois ela fechou com a Dior. Então você vê essa dualidade: uma companhia de esportes e uma companhia de Haute Couture, e ela está no meio. Para nós é uma vitória ter essa pessoa de alcance tão amplo no mercado; ela pode falar com qualquer um, e é das poucas que podem criar tendências.
Quando apresentamos o projeto do que seria o trabalho, ela ficou muito, muito animada. Não é uma questão de dinheiro, mas do que vamos criar juntos, e acho que é isso que a motiva. Ela não está vindo ao escritório, e não está almoçando no restaurante conosco (risos), mas tudo vem dela, e nossas reuniões são intensas, ela é realmente comprometida.
Na época do anúncio, muita gente duvidou da legitimidade da parceria, questionando como ela poderia ser diretora criativa de uma marca fazendo uma ou duas reuniões.
Mas não são uma ou duas reuniões, são reuniões regulares – que não são longas, porque ela tem uma agenda louca, mas ela é ativa. Há três semanas, nos mandou a direção criativa para 2016, e é muito atraente. E eu sei que vem dela. Ela trabalha no avião, no quarto de hotel, em todo lugar está trabalhando, e constantemente procurando pelo “next big thing”. Quando veio para o nosso escritório, ela estava usando um Suede customizado com uma sola creeper. Não é algo que tínhamos na coleção, ela que foi atrás disso. E o creeper nem está na moda hoje.
Como criador, é importante se manter a par de críticas, questionamentos e performance de vendas, ou você acredita que isso “poda” o trabalho?
Acho que há dois níveis. Quando criamos um produto mainstream com distribuição de massa, o feedback é crítico. Não só do consumidor, mas também dos varejistas, os parceiros que trabalham conosco; eles estão na linha de frente e sabem o que vai funcionar e o que não vai. Mas quando estamos no modo fashion, colaborativo… Eu não pergunto. Às vezes fracassamos, mas nós tentamos. Não é uma questão de vencer o tempo todo; é uma questão de acreditar no que você faz, e às vezes funciona, às vezes não. Recentemente, tem funcionado.