Virar balzaquiana hoje em dia não tem mais o peso de antigamente. Então, os 35 anos são a idade em que muita gente decide que é hora de cuidar de alguns sinais da idade e começa a usar creme antirrugas, mudar o cabelo, cuidar da dieta. Não no caso da Melissa. A marca conhecida pelos sapatos plásticos chega aos 35 e promete que vai continuar apostando na mesma estratégia dos últimos 15 anos, período em que fortaleceu sua identidade de moda.
Também pudera. Grifes centenárias têm investido em fundações e museus, e a Melissa descobriu um jeito cool e jovem de fazer a sua versão de espaços que ligam a marca com a arte. Já são três galerias Melissa — São Paulo, Nova York e Londres — e a empresa já anunciou uma quarta, que ficará na Ásia, ainda sem local preciso nem data de abertura.
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Depois de consolidar uma imagem de moda, a empresa passou a investir na internacionalização. Em abril, inaugurou uma pop up shop em Tóquio, no bairro de Harajuku, conhecido por lançar tendências mundo afora, com projeto do artista plástico brasileiro Kleber Matheus. A loja da capital nipônica é a 62ª da marca — as demais ficam em Hong Kong, Miami, Lisboa, Sidney, Las Vegas e Tel Aviv —, espalhadas por quatro continentes.
Na semana passada, a Melissa fez um desfile para 800 convidados para apresentar sua coleção Verão 2016, inspirada no Rio de Janeiro e nas cariocas. Conversamos com o diretor de marca da Melissa, Paulo Pedó, e com o diretor criativo, Edson Matsuo, sobre os 35 anos e sobre o futuro da empresa. Confira:
A Melissa completa 35 anos em 2015. É a hora de pensar em novas estratégias? Vocês estão prevendo mudanças para a marca?
Paulo: São 35 anos de uma história que já teve diversas faces. Não temos nada especial em termos de mudança; a gente muda constantemente. Cada coleção é uma história nova, um tema novo. O grande desafio hoje da marca é a internacionalização. Então a gente já conta com uma boa participação no mercado externo, com uma boa visibilidade, com duas galerias no exterior, em breve uma terceira que já foi anunciada na Ásia, uma série de pop ups no mercado externo.
Inaugurou a de Tóquio agora, né?
Paulo: Acabou de inaugurar a de Tóquio, mas a gente já tem em Las Vegas, tem três em Miami.
Edson: Londres foi um marco. A gente aproveitou os 35 anos, mas para a Melissa toda coleção é uma comemoração. A galeria de Londres, em Covent Garden, fechou esse ciclo dos 35 anos. Esse evento não deixa de ser uma comemoração. Mas a gente não fez por causa dos 35 anos, é por causa dessa cultura de a gente se renovar, se reinventar, de procurar o inesperado e a conexão com as pessoas.
Já que não vai ter uma novidade em termos de estratégia, de posicionamento de mercado, como se faz para manter a marca interessante e atraente para o consumidor?
Paulo: A gente pode resumir o conceito da Melissa, a estratégia da Melissa em três pilares: moda, arte e design. São expressões que a Melissa procura trabalhar em todas as ações que ela tem. As galerias não são concept stores ou flagships. São galerias porque o que importa lá é divulgar esse conceito, é mostrar a história que a Melissa vem criando ao longo dos anos. Os 35 anos são só mais uma data que faz parte da vida da Melissa. A gente vai comemorar neste ano também os dez anos da galeria Melissa de São Paulo, dez anos da primeira galeria Melissa. Acho que isso é o mais importante: a gente está o tempo inteiro celebrando o futuro.
Edson: E partilhando isso. Como participante desse movimento chamado Melissa, eu vejo que quando a gente faz 10 anos da galeria da Oscar Freire e 35 da Melissa, para nós o desafio é ver o quanto a gente avançou e avançar mais. Tem essa responsabilidade. Não é que 35 passa como mais um ano. Esse evento não deixa de ser uma comemoração dos 35 anos. Ano que vem vão ser 36, vai ter que ser melhor do que 35. E não 35 vai ter que ser melhor e depois só quando fizer 40 anos.
Mas a moda vive de novidades, a cada seis meses tudo muda. Como vocês fazem para que a marca continue sendo interessante seguindo uma mesma estratégia de mercado?
Paulo: O mais importante é que você pensa para a frente. A Melissa é uma marca que tem muita tradição, é conhecida no Brasil inteiro, são 35 anos. Mas a gente está sempre buscando o novo e isso faz com que a marca se mantenha sempre viva. Há mais ou menos uns 15, 16 anos, quando a Melissa fez o reposicionamento, na verdade ela não se reposicionou, ela só resgatou o que ela já era na alma. Aí, claro, houve um investimento muito grande da empresa, da Grendene, que acredita no novo e que disse ‘vamos dar um tempo, a gente pode começar um trabalho novo, e o que vale é o que vier daqui para a frente’. Acho que essa oportunidade foi muito boa.
Edson: Eu vejo o novo num glossário diferente para a Melissa. Todo mundo fala ‘quero o novo, quero o diferente’, que é uma coisa até comodditizada, tudo tem que ser novo, mas eu vejo que na Melissa a busca é pelo surpreendente, o mais que esperado. Não é só o diferente, o novo.
Paulo: E, para surpreender, a fórmula que a gente usa, se é que existe uma fórmula para isso, é não falar com os olhos ou com a cabeça das pessoas, mas falar com a alma das pessoas. As pessoas têm que sentir isso, não adianta você vir aqui ‘ah, esse é o melhor produto, esse é o mais novo, esse é surpreendente’. Não, a pessoa tem que sentir que é surpreendente. Esse é o grande desafio, ser surpreendente aos olhos dos outros e não aos nossos.
Edson: Inovação nós não fazemos. Quem homologa e constrói a inovação é quem gosta da marca, quem compra. O produto se torna inovador diante da aderência, do engajamento das pessoas que usam, compram, comunicam.
Paulo: E a gente espera que isso possa inspirar outras iniciativas aqui no Brasil. A economia criativa aqui é um potencial enorme, e a Melissa quer ser uma grande propagadora, ativista disso. A gente tem esse potencial para explorar no mundo inteiro e gente espera que a Melissa possa inspirar outras iniciativas também nesse sentido.
A coleção fala muito do Rio de Janeiro, da carioca. Quando vocês levarem essa coleção para as lojas fora do Brasil, vai ter esse mesmo tipo de comunicação, com esse lifestyle carioca?
Edson: A gente tem que ser coerente, porque se não isso aqui fica só para carioca ver. No fundo, avaliando o conceito da coleção, não é que a gente se transformou para fazer a coleção, a gente tem muito de carioca, de respeito ao estilo carioca, que a gente tem na história da Melissa, o despojamento, a inclusão e não exclusão, uma praia não tem o lugar para tal pessoa, tal etnia, na alma a gente tem muita coisa de carioca. A gente até brincou que a gente é cariúcho, né?
Paulo: Gaúcho com carioca.
Nas parcerias, como vocês escolhem os nomes?
Edson: As pessoas têm que ter aderência, independentemente se eles trabalharam com a Melissa ou não. A transgressão da Vivienne Westwood, a elegância e o minimalismo do Jason Wu, o Campana brincando com partes ordinárias para fazer o extraordinário. É uma coerência. A gente sempre fala que na alma a gente já trabalhou junto. Não é porque a pessoa é a bola da vez. Não é um licenciamento, não é porque o cara está estourando que vamos fazer. Se não tiver coerência no estilo, na postura, na crença da pessoa, a gente não faria.
Clique na galeria para ver fotos do desfile da coleção “Wanna Be Carioca”, da Melissa.