Por Guilherme Meneghetti
Em suas andanças por semanas de moda, o fotógrafo mineiro Leo Faria, colaborador do FFW, já registrou Anna Wintour, Bill Cunningham (sua maior referência), Grace Coddington e Anna Dello Russo. Leo cobre as principais semanas de moda do mundo – NY, Milão, Paris e São Paulo. Só não cobre a capital britânica porque não se identificou com as roupas das pessoas que frequentam a semana de moda de lá, embora confesse saber que todos acham a moda inglesa legal. “As pessoas chegavam com tomadas penduradas no pescoço, livros na cabeça… Coisas que eu jamais havia visto”, conta.
Publicitário, Leo chegou ao street style por acaso, quando foi para Nova York e um amigo o encaminhou para fazer fotos das blogueiras brasileiras que lá estavam.
Abaixo, confira a entrevista que o fotógrafo concedeu ao FFW, em que ele conta os segredos do universo do street style das semanas internacionais – dos principais personagens a imprevistos que teve de enfrentar –, suas referências, projetos futuros e detalhes de sua recente parceria com a italiana Chiara Ferragni, do The Blond Salad.
Como você começou a sua carreira?
Comecei com fotografia há 12 anos. Primeiro, me formei em Publicidade e Propaganda e tive uma agência – fui diretor de arte de algumas agências e depois criei a minha, que durou sete anos. Ela era focada em moda, então eu fazia campanhas, catálogos, e depois de um tempo comecei a fazer editoriais. Porém, na época, eu não era o fotógrafo. Eu pegava a campanha, levava para o fotógrafo e fazia a direção. Até chegar um momento que senti a necessidade de fotografar porque queria um ângulo diferente, eu tinha outra visão da moda. Eu sou de Uberlândia e morava lá na época, onde não existe fotógrafo especializado em moda. Eram fotógrafos que faziam casamentos, eventos e afins, e eu senti a necessidade de uma linguagem diferente. Então eu comecei a fotografar, comecei a buscar, pois não queria aquela linguagem de um fotógrafo que faz tudo. Queria algo mais específico.
VEJA AS IMAGENS DE STREETSTYLE DO SPFW PELAS LENTAS DE LEO FARIA
E você começou fazendo catálogos e editoriais?
Sim. Minas é uma região muito rica em confecções, então há confecção de beachwear, de lingerie, de vestidos de festa, era o público que eu atendia – foi aí que eu tive o interesse em começar a fotografar.
Como você chegou ao street style?
Quatro anos atrás, fui para Nova York e coincidiu com a semana de moda de lá. Um amigo meu, o Marcio Porto, que, na época, trabalhava na FHits, me falou que as blogueiras estariam lá e que eu poderia fazer as fotos delas, pra ver se elas gostavam do meu trabalho. E aí eu fiz as fotos da Camila Coelho – foi a minha primeira grande blogueira que eu fotografei em Nova York – e foi um sucesso. A partir daí, foi uma coisa que aconteceu, todo mundo gostou.
Você tem referências de fotógrafos de street style?
A minha referência é Bill Cunningham. Eu gosto do trabalho dele como arte. Eu acompanhava o trabalho dele muito mais como arte do que especificamente street style. Quando eu fui fazer, já tinha experiência em fazer fotos externas porque fazia catálogos na praia embaixo do sol. Tinha experiência em fotografar no sol, na sombra, e isso me ajudou muito. E não era uma coisa que eu conhecia, algo como “vou fazer street style”. Foi simplesmente fotografar a Camila Coelho em Nova York – ela entre os taxis, atravessando as faixas de pedestres, mostrando a cidade. Foi uma coisa que deu muita repercussão, pois ela amou as fotos e postou dizendo que amou meu trabalho. E aí comecei a fazer as outras semanas de moda internacionais. Então uni o útil ao agradável. Teve uma estação que eu fiz NY, Milão, Londres e Paris, depois fui optando pelas quais eu mais gostava. Hoje eu faço NY, Milão e Paris duas vezes ao ano. Londres eu não me identifiquei muito com o street style de lá.
Além do Bill, você tem outras referências?
Não… Na verdade, quando comecei a fazer, não conhecia muito os fotógrafos de street style. Hoje sou amigo de todos que estão lá cobrindo as semanas de moda como eu, fotógrafos do mundo todo. Mas não tenho nenhum como referência – não por achar o trabalho deles ruim. O que eu percebo é que os mais famosos têm uma foto muito escura. Como eles são de outros lugares do mundo, eu acho uma foto muito sombria, e a minha foto tem mais luz, mais vida, calor, Brasil. O Scott Schuman (The Sartorialist), que eu acompanho também, está sempre comigo lá, a gente sempre se encontra. A foto dele é algo mais “posado”, é um registro do look mesmo, enquanto a pessoa está parada. As fotos que eu mais gosto de fazer é quando a pessoa nem percebe que eu estou fotografando. Não gosto que a pessoa olhe muito pra câmera, gosto de pegar o lance sem ela ver.
O que te chama atenção em um look para registrá-lo?
Isso é uma coisa que eu até gosto de falar. Eu percebo que os fotógrafos lá fora registram única e exclusivamente as pessoas famosas. Então, por exemplo, quando chega a Chiara Ferragni, Olivia Palermo, eles sempre as fotografam. Mas quando chegam pessoas anônimas, mesmo que estilosas, não fotografam pelo anonimato. Eles estão ali pra vender uma foto dessas famosas. E eu não. Quando a pessoa está estilosa, eu fotografo.
Qual é a importância do street style para a moda?
Eu acho que dita muitas tendências. Tem trazido cada vez mais referências para as pessoas. Lembro-me muito bem de quando veio a onda dos metalizados: quando eu cheguei em NY, vi várias asiáticas chegando aos desfiles com saias metalizadas, sapatos metalizados… Não sei se isso já era uma tendência que estava acontecendo, mas na estação seguinte, todo mundo já estava usando os metalizados. Elas [as asiáticas] ditam tendências. Acho que não existem muitas regras, a pessoa se veste para ir ao desfile e pode ousar, misturar.
Como é o street style no Brasil comparado ao das semanas de moda em outros países?
Acho que as pessoas confundem um pouco. Eu percebo que muita gente que fica na porta dos desfiles daqui de São Paulo… as meninas se montam demais, se maquiam demais. Quando percebi isso, foi um choque muito grande, principalmente desta vez, porque eu fiquei muito tempo fazendo as semanas internacionais e, lá, por exemplo, você não vê maquiagem no rosto das pessoas, não vê cílios postiços. E aqui uma menina coloca o maior cílio, muita maquiagem, o maior brinco, óculos… Então é uma coisa meio “eu vim para ser clicada”. Parece que abrem o guarda-roupa e colocam tudo o que têm. Lá fora, as pessoas não estão nem com maquiagem no rosto. Elas chegam ao desfile com uma calça jeans, uma bota e uma camiseta branca. Aqui no Brasil parece que elas acham que isso não vai ser fotografado, que ninguém vai olhar.
Você já teve de lidar com algum imprevisto enquanto fotografava?
Sim, já! Há duas estações atrás, fui fazer um desfile da Chanel, em Paris, e choveu muito – além do frio, foi uma chuva muito forte. No caminho, percebi que as pessoas usavam guarda-chuvas como uma composição do look. Achei muito interessante. Por incrível que pareça, foram as fotos mais bonitas daquela estação, porque as pessoas usaram o guarda-chuva como um acessório. Aquilo foi uma surpresa, porque a princípio eu pensei em não clicar, mas resultaram lindas fotos.
Como a neve também, rendeu uma das fotos mais bonitas que fiz. As mulheres saíam dos carros e andavam enquanto a neve caía em seus looks coloridos. Os imprevistos são mais a questão do clima mesmo, que eu tive que comprar capas específicas para o equipamento, botas apropriadas à prova d’água, etc. Hoje sou precavido e, quando há chuva, por exemplo, tenho que ficar preparado com a capa – glamour zero, porém tudo por um bom resultado.
Quais as melhores blogueiras para se fotografar?
Gosto muito da Olivia Palermo por ser uma mulher elegante e charmosa, porém é uma foto difícil de ser feita, porque ela não posa para os fotógrafos e é muito requisitada. Quando ela chega aos desfiles é como se fosse a Madonna. É uma foto que todo mundo quer fazer. Eu aprendi a chamá-la em todas as fotos, então ela já me conhece. Sempre que ela passa, eu a chamo e ela olha pra mim. Se você olhar no meu Instagram, ela está sempre olhando para minha foto. E a Chiara Ferragni me convidou para ser fotógrafo dela nessa temporada, recebi um direct dela pedindo o meu WhatsApp. Ela me convidou para fotografá-la em Milão e Paris. Foi muito legal, ela é uma pessoa muito simpática, muito aberta a novas fotos – ela fazia foto pulando, correndo. A gente está trabalhando junto agora, em semanas de moda.
Como aconteceu essa parceria?
Sempre a fotografei como qualquer outro fotógrafo. Ela começou a me enviar direct pedindo a foto em alta resolução pra postar. Nesta estação, eu não sei o que aconteceu com o fotógrafo dela e ela me convidou para fazer as fotos. Foi uma coisa mais íntima, que eu ia ao quarto dela no hotel, ia junto no carro com ela…
Ela tem mais de oito milhões de seguidores no Instagram. É um fenômeno.
A primeira vez que cheguei ao hotel dela, vi que havia muita gente na porta. Até achei que havia alguma celebridade por ali. Quando saímos para fotografar, percebi que todas aquelas pessoas estavam ali para ver a Chiara. Ela tem uma fama que eu não imaginava… as pessoas corriam, gritavam, choravam, pediam selfie. Quando entramos no carro, as meninas ficavam no vidro.
Outra curiosidade é sobre o quarto do hotel. Era a maior suíte presidencial que eu já vi na vida, gigante, com dois andares, piano… Havia um acervo com aproximadamente uns 50 pares de sapatos. Ela tem uma equipe gigante, com maquiadores, cabeleireiros, acho que massagista. Havia cerca de 15 pessoas no quarto trabalhando para ela, fiquei bem surpreso.
Quem são os grandes nomes da moda que você já fotografou?
A Anna Wintour eu sempre quero muito uma foto dela, por ser um ícone. A Grace Coddington também, sempre faço lindas fotos dela olhando pra mim. Bill Cunningham. Encontrei com ele desde a minha primeira temporada em Nova York. na esquina da Quinta Avenida, a esquina dele. Como sempre admirei muito seu trabalho, fazia muitas fotos dele.
Anna Dello Russo?
Sim, já fotografei muito.
É difícil fotografá-la?
Não. Ela é uma pessoa que gosta muito de ser fotografada. Ela posa para o fotógrafo o tempo que for. Se não der tempo, ela volta para fazer mais sem problemas. E ela já repostou várias fotos minhas, me dando os créditos, o que deu bastante repercussão pra mim, também – fiquei super feliz.
Quais são seus planos para daqui pra frente?
Fotografo há 12 anos, mas como há quatro anos o meu nome tem aparecido mais, surgiram marcas importantes no meu portfólio, convites de revistas importantes. Hoje eu tenho uma superparceria com a Elle Brasil e com o próprio FFW, por exemplo. Quero trazer essa linguagem do street style para o editorial de moda. Eu pude mostrar isso num trabalho que fiz em Hong Kong com a Elle Brasil, em que fotografei a Marcelia Freesz. Foram 16 páginas da revista como um street style pela cidade. Agora fiz um editorial para a Armani e fiz a Fendi em Paris, ambos sairão na Elle do mês que vem. Isso é uma coisa que busco muito na minha carreira, trazer essa linguagem que eu tenho na rua, a experiência da foto externa, e colocá-la dentro do editorial. Também quero focar no high fashion, uma moda mais pensada e trabalhada. Quero mostrar que atuo em ambientes diferentes.
Também estou criando um banco de imagens com várias fotos de street style. A cada estação eu volto com 5.000, 10.000 fotos, e estou montando um grande banco de imagens com todos os tipos de perfil, um grande acervo para, futuramente, vir a ser um livro, uma exposição. Estou bem empolgado! Não tenho datas ainda, mas já está encaminhado.