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    FFW INSIDER: Rafael Nascimento

    Diretor criativo da Another Place reflete sobre crescimento, comunidade, colaborações e verdade

    foto: hudson rennan

    FFW INSIDER: Rafael Nascimento

    Diretor criativo da Another Place reflete sobre crescimento, comunidade, colaborações e verdade

    POR Vinicius Alencar

    rafael nascimento na capa da FFW Insider 4

    FFW Insider apresenta mensalmente personagens que estão transformando a criação, o business, a comunicação e a cultura.

    De tempos em tempos, a Another Place ressurge e é sempre da forma mais inesperada possível. Seja quando foi pioneira com um desfile 3D em meio a pandemia ou quando assina collabs com marcas improváveis (Samsung, Kitkat, o app de encontros Tinder ou até mesmo a próxima com a Hellmann’s, que antecipamos aqui, com exclusividade). Esses exemplos ilustram um modelo muito bem arquitetado por Rafael Nascimento (35) que, ao lado de Caio Fortes, divide o backstage da marca.

    Figura discreta, Rafael não é dado à entrevistas. No seu perfil a última selfie é de 2019 e todas as vezes que o encontrei, ele estava de preto, quase um uniforme. Mas a cor não representa o diretor criativo, em poucos minutos de conversa a figura tímida se torna bem amigável, olha no olho, sorri e fala sem grandes rodeios o que pensa, gosta ou não gosta – já tive a oportunidade de acompanhar shootings de campanha da ANP e sei bem como ele se comporta no backstage. Realista, sereno, com grandes desejos, porém sem grandes pretensões. Na entrevista para a edição nº 4 da FFW Insider, o recifense nos conta sobre sua trajetória, o nascimento da ANP, seu plano de negócios incomum, o olhar criativo aliado a publicidade, sobre medo e, principalmente, sobre verdade. 

    Nunca diga nunca
    “Nunca tive um sonho ou vontade de ter uma marca de moda”, ele inicia usando uma camiseta preta, quase seu uniforme diário e que entrega um pouco da sua personalidade discreta, Rafa fala baixo e, apesar de ter bastante clareza do que quer, se faz entender com suavidade, o que não quer dizer que não seja objetivo. “Design gráfico, sempre foi minha paixão de adolescência. Acredito que a primeira relação que eu tenha tido com moda foi quando criei a estampa para o time do meu colégio competir. Gostei de ver aquilo impresso… Mas também não posso esquecer de mencionar que minha avó era costureira, então isso me influenciou de alguma forma”.


    Da marcenaria à costura

    “Vim pra São Paulo, em 2009, para trabalhar com publicidade.Me matriculei num curso de marcenaria, em 2015. No dia da primeira aula, vi que tinha um curso de corte e costura no mesmo horário, perguntei se podia trocar e durante três meses, todo sábado, eu fiquei ali aprendendo”, relembra. “Eu era um terror, zero experiência e era o único homem da turma. Mesmo assim, no final da primeira aula, eu já comprei a máquina e comecei a costurar sozinho, pra ir tentando. Quando chegou a aula de modelagem, a professora me disse que primeiro ensinaria as meninas, depois eu. Foi quando eu questionei ‘mas e uma modelagem que possa funcionar para ambos?’. Eu nem sabia o que era unissex, quem dirá moda sem gênero. Porém relembrando, vejo que muita coisa do que acredito ainda hoje começou ali”. 

    Sem gênero? E os primeiros passos… 

    “2015 quando comecei a pesquisar sobre moda sem gênero não existia nada que falasse muito sobre. Apesar disso, foi durante esse processo de pesquisa que nasceu o macacão da ANP [um dos best sellers da história da marca, com pegada utilitária e zíper aparente frontal], então juntei diferentes amigos e aí fiz um editorial em junho de 2015, em setembro do mesmo ano lançamos a ANP”. 

    Como fazer diferente

    “A Another ouve muito o consumidor, uma comunicação muito próxima. Estamos há 8 anos seguindo esse formato de venda apenas online, nunca quis ir para lojas multimarcas”, analisa. “Fui vendo o que fazia sentido para mim e assim veio a Casa de Criadores, SPFW e NYFW. Eu pensava ‘isso aqui está dando o resultado que eu esperava?’, então dependendo da resposta eu seguia ou começava a pensar em novos caminhos.”

    Ao invés de 60, 6 vezes 10
    “A liberdade é o que mais define a ANP”, diz Rafa quando pergunto sobre como conseguiram driblar a estrutura da indústria de moda nacional, com calendários e eventos específicos. “Muita gente consome apenas nosso conteúdo, por exemplo, e isso já basta para ela, independente se ela está vestindo a marca ou não. Essa identificação com os nossos valores para além das roupas é o que mais nos diferencia de outras marcas. Além disso, eu percebi que, ao invés de lançar uma coleção de 60 peças, eu lanço 6 coleções com 10 peças. Fez toda a diferença quando eu entendi que quem se identificava não consumia apenas as roupas, mas o conteúdo em si. Então fazia e faz sentido produzir dessa forma”. 

    Publicidade x moda x comunidade
    “Nas colaborações, eu tendo a misturar o que eu gosto de fazer. Então meu olhar como publicitário e designer consegue me dar liberdade, propondo coisas sem que ninguém meta a mão. E eu gosto também desse lado de conhecer a agência, furar bolhas, as collabs nos levam para outros lugares”, reflete enquanto rememora quando assinou com as gigantes Samsung e Spotify. “Não trabalhamos com licenciamento, não trabalhamos com royalties, mas uma estratégia completamente publicitária. Por isso, tentamos sempre entender o histórico das marcas que colaboramos, não vou fazer algo só por dinheiro ou que afete a nossa comunidade”. 

    Collabs inusitadas

    “Nunca tive medo de ser muito comercial, não me arrependo, quando fico em dúvida, não vou em frente. Então o projeto ou collab nem chega a tomar forma. Selecionamos bem para que isso não aconteça. Gostamos de ter controle do que e de como queremos comunicar. Criamos a narrativa pensando sempre no nosso público. Fico mais medo quando é coleção solo, do que com colaboramos com outras marcas [risos]. No histórico da marca há Kitkat, Amarula, Samsung, Tinder e Hellman’s, que será lançada no dia 28.08. 

    Dois amigos e um sonho

    “Nunca tivemos um investimento”, diz Rafa categórico. “Cada um colocou dois mil reais. Produzimos com aquele valor, vendemos, com o lucro fizemos mais e cá estamos. Nunca colocamos um super investimento, nem alguém de fora, tudo cresceu muito calmamente e organicamente. Os maiores investidores da Another sempre foram os clientes”.

    A virada pandêmica

    “Na pandemia tivemos um boom, mas sempre foi essa engrenagem [citada no tópico anterior] e rodando dentro dela mesmo. Como não tínhamos grandes investimentos, não ganhávamos e nem perdíamos, a ANP se alimentava. Até a pandemia eu ainda estava em agência, então cuidava das coisas da Another de madrugada, entregava todas as compras nos Correios antes de entrar às 9 na agência”, recorda-se Rafa. “Crescemos 800%, em 2020. Um número muito alto, que pode impressionar, mas na prática é algo muito maluco, não é saudável, é difícil. hoje quero crescer saudável e quero manter quem já está comigo – para você ter uma noção temos um número de recompra muito alto, tem cliente que tem 36 compras no site, tem um acervo de ANP maior do que eu [risos]”. 

    Os fatores determinantes para essa virada em um momento tão controverso

    “Acredito que soube comunicar durante a pandemia, a gente parou tudo, não me sentia confortável em fazer post pra vender roupa, ainda bem que tínhamos essa possibilidade. Ficamos calados, depois fizemos as máscaras com preço zerado, você entrava no site da Another e aí via se queria comprar a máscara por zero reais, ou pagar R$ 200,00 que seriam integralmente destinados a ONGs. Isso nos posicionou em um lugar muito especial. Mas foi o desfile 3D, o responsável por essa guinada. Eu tinha idealizado ele apenas para entreter, até porque todos estavam em casa. Mas aí começaram a surgir interessados e eu fui trazendo para a realidade, deixando claro desde o início que as peças só seriam produzidas quando acabasse a pandemia e assim foi. Dessa coleção surgiu a estampa Aura [criada por Gabriel Azevedo], que foi um super hit e quando acredito que fidelizamos novos clientes”.

    Momentos marcantes
    “Acredito que quando participamos da NYFW, foi somente aí que ganhamos maior destaque na imprensa nacional, que ela parou e passou a olhar para nós. Depois, quando a Anitta usou um look total em sua apresentação na Parada Gay de São Paulo, em 2016, ganhamos visibilidade gigantesca em um outro patamar, que não se limitou a mídia especializada. O filme estrelado pelo Johnny Massaro, por ter ficado entre finalistas no Fashion Film Festival Milano ao lado de marcas como Gucci e Balenciaga. E, em dezembro de 2020, quando lançamos a sunga de coração vazado, que foi outro hit – um case que permanece no nosso topo de itens mais vendidos até hoje é, inclusive, a peça mais comprada por clientes fora do Brasil”. 

    Anti-fashion
    Quando questiono de onde vêm as inspirações para as coleções, Rafa entrega: “Não consumo muito moda, não assisto desfiles atuais ou antigos, não consumo muita moda… Não olho muito, porque tenho receio de querer me apropriar de algo que não seja genuinamente meu. Prefiro olhar para o público da ANP, afinal a gente é para quem vendemos. Frequento onde os clientes vão, gosto de observar e viver com proximidade. Isso me ajuda a identificar o que os clientes querem, o que as pessoas do nosso universo estão desejando. As baby tees, por exemplo, resumem bem isso, tanto que a primeira remessa que lançamos acabou em menos de 24 horas. Tem essa facilidade de sermos pequenos ainda, apesar dos números. Sou eu e Caio, Caio e eu, então fica fácil tomar decisões sem ter que passar antes por mil departamentos”. 

    Jeans, perfume e +

    Sinto que a ANP ocupa hoje um lugar especial pois apostou em dois itens que a indústria nacional parece ter abandonado com a virada dos anos 1990 para 200, que é a perfumaria e o jeanswear. Como foi esse processo? 

    “O maior problema em ambos foi a produção, já que são indústrias muito grandes, jeans no brasil é absurdo, como a perfumaria também, geram muito dinheiro, produção muito grande. Quando fomos chegando, falando que éramos uma marca pequena e independente, as pessoas não queriam nem falar com a gente. Mas insistimos e conseguimos com os parceiros certos, os testes, processo e, assim, conseguimos tirar do papel. Foi um produto super bem aceito e que não será descontinuado!”, revela. 

    O investimento no jeanswear: “Tudo começou com a calça Ride, um fenômeno que nos pegou de surpresa. A criamos especialmente para a campanha do perfume (por isso possuem o mesmo nome) e por ser difícil a produção, fizemos apenas alguns exemplares. Mas a procura foi maior do que esperado e quando desfilamos no SPFW, decidimos que iríamos apostar em novos modelos e versões. Não deu outra, se tornou um item sold out. A parte boa é que quando alguém se identifica com um modelo, ela compra quando o lançamos com uma outra lavagem, já que sabe como fica no corpo”.

    Desafios

    Prestes a completar duas horas de conversa, questiono: qual o maior desafio profissional que você está enfrentando agora? E, sem pensar muito, Rafa diz:

    “Estruturação, estamos com a fábrica [se referindo ao amplo espaço que ocupam na City Denim, localizada no bairro do Brás, no centro de SP], novas responsabilidades, dobramos o número de funcionários. Desafios internos, de estruturação de equipe, as dores do crescimento, se organizar, dar um passo e ver dar certo para dar outro. 2023 é o ano da estruturação, para que 2024 seja o ano da expansão”.

    Onde vê a ANP nos próximos 10 anos

    É difícil pensar em uma década, mas quero muito esteja em vários lugares dentro do Brasil, fora do Brasil também. Ela [a ANP] nasceu para ser global, temos um público internacional – estamos focados no nacional, mas sem esquecer do internacional.

    O melhor conselho que já recebeu

    “Maior coisa que acredito, é a verdade, a transparência com o consumidor. Nos momentos bons e ruins, somos iguais. Na alegria e na tristeza. Eu mesmo ligo dependendo do problema, eu envio a mensagem se necessário. Ter um discurso verdadeiro, isso pode dar a entender algo, não conto história que as pessoas possam achar incoerências. Vemos muitos discursos que não se sustentam. Um conselho: acredite e faça com verdade, não olhe pra outras histórias, porque no final do dia essa falta de verdade não se sustenta”.

    ANP em números

    “Em 2022 tivemos um faturamento de 7 dígitos em vendas direta ao cliente, 150% a mais que em 2021. E um crescimento de 300% em publicidade (collabs) com um faturamento de 7 dígitos, representando 35% do faturamento anual da marca”, finaliza Rafa sobre o tamanho da marca em termos de negócio que recebeu no último ano investimento de um milhão de reais em publicidade e vai chegar ao final de 2023 com 11 coleções lançadas. Praticamente uma por mês. Veloz, mas não furioso.

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