Por Luísa Graça
Era seu último jantar oficial como primeira-dama dos Estados Unidos e Michelle Obama surgiu como uma visão num Versace dourado rosé e joias Le Vian, iluminada e exuberante. Durante oito anos, ela realizou seu papel público com graça e inteligência, sempre muito bem vestida enquanto o fazia. A americana, formada em direito pela Universidade de Harvard e mãe de Sasha e Malia, fez discursos empoderados e encorajadores, deu voz a causas como alimentação saudável e apoio a famílias de militares e criou programas educacionais como o Reach Higher e Let Girls Learn.
Estilo por si só não é seu legado, mas faz parte dele até mesmo como afirmação política. Michelle não se vestia apenas para parecer maravilhosa (o que não deixa de ser verdade), mas também para promover o trabalho de jovens estilistas e gente que de alguma maneira representa a inventividade americana. Não deixou de lado marcas populares porque também era importante que sua aparência dialogasse com a mulher que ela é em essência: naturalmente elegante, simples. Mulher real.
Em outubro de 2008, poucos dias antes da eleição do Presidente Barack Obama, Michelle encarou o talk show do apresentador Jay Leno vestindo um suéter amarelo mostarda e uma camisa de seda, ambas da marca J. Crew. Duas peças de roupa que logo a trouxeram para perto do povo americano. “Você consegue achar boas coisas online”, comentou, bem-humorada, na ocasião.
“A ideia de que ela é uma pessoa inclusiva era muito importante. Naquele momento era importante que as pessoas que olhassem para ela sentissem que poderiam ter acesso àquelas roupas também”, afirmou Ikram Goldman, consultora de moda de Michelle na época, antes de passar o bastão para sua assistente Meredith Koop.
O longo branco de chiffon Jason Wu que usou na posse inaugural, em 2009, alavancou a carreira do estilista nascido em Taiwan de tal maneira que é difícil pensar que oito anos atrás o nome dele tinha outro nível de relevância. Foi Wu quem assinou também o mídi azul-marinho rendado que a primeira-dama vestiu no evento de despedida do Presidente, em Chicago, poucos dias atrás. Um belo adeus que diz respeito ao cuidado e ponderação de Michelle com o que veste, mas acima de tudo, uma maneira de reconhecer o poder simbólico da moda.
Ela decidiu apoiar designers americanos como Tracy Reese, Christian Siriano, Joseph Altuzarra, Thakoon e Proenza Schouler, mas também vestiu looks assinados por estrangeiros, frequentemente em visitas internacionais. Um toque de diplomacia. Naeem Khan em visita à Índia; Christopher Kane, Preen e tantos outros britânicos em visitas ao Reino Unido; Giambatista Valli na Itália. Chegou até a ter uma quedinha especial pelo franco-tunisiano Azzedine Alaïa.
As escolhas de Michelle também foram bastante significativas para o mercado da moda. Quem diria que o cardigã, uma peça sem graça, quase funcional, se tornaria um hit tão badalado no varejo? Combinando a peça a sets de calça e blusa ou vestidos estampados, Michelle fez cardigãs esgotarem em lojas populares como Gap e Target durante o primeiro mandato Obama.
O professor de finanças da NYU David Yermack chegou a quantificar o impacto dos looks de Obama no estudo How This First Lady Moves Markets, analisando quase 200 roupas que ela vestiu durante o período de um ano e como o fator Obama elevou o valor dessas marcas em ações. “O simples fato dela vestir uma peça de uma companhia genérica, num evento de rotina, chegava a valer U$38 milhões”, constata.
De acordo com Yermack, o efeito Obama na indústria comercial da moda foi maior do que o de qualquer outra celebridade que se possa imaginar – nem mesmo as cegamente veneradas irmãs Kardashian. E esse efeito estende-se também a marcas de luxo como as do grupo LVMH, ao qual pertence a Givenchy.
“Por algumas semanas nos ligaram para saber sobre o vestido dela”, confidenciou Riccardo Tisci, que a vestiu em Givenchy para o jantar dos correspondentes da Casa Branca, em 2016, à revista Vogue. “A Sra. Obama é corajosa e isso é algo que sempre tento incorporar em minhas criações. Ela é uma mulher tão brilhante: superhumana, na verdade. Sempre a terei como uma das pessoas mais especiais com quem tive a chance de trabalhar”.
A primeira-dama foi três vezes capa da Vogue americana e recentemente estampou também a capa da revista T, do The New York Times, exibindo brincos Roberto Coin, blusa Calvin Klein, maquiagem bronze e seu bem desenhado par de sobrancelhas, fotografada por Collier Schorr. Na matéria interna, a escritora Chimamanda Ngozi Adichie arriscou-se a sintetizar como Michelle Obama tornou-se um ícone americano de estilo: “Seus vestidos e treinamentos físicos. Sua postura e curvas. Braços tonificados e dedos esguios. Até mesmo seus confortáveis kitten heels ganharam certo respeito por causa dela. Nenhuma figura pública incorpora melhor o mantra da plena individualidade feminina: Vista o que você gosta”.
Depois de décadas, a moda voltou a encontrar uma musa na Casa Branca. E a mulher comum também.