Em tempos hipermodernos, em que roupas podem custar menos do que uma xícara de espresso (vide camisetas a US$ 4 na H&M), a indústria do prêt-à-porter se modernizou ao ponto de replicar técnicas sofisticadas de bordados, brocados e aplicações com aspecto luxuoso em grande escala, o fast fashion democratizou a informação de moda e acelerou sua oferta enquanto o high fashion luta para mostrar o seu valor num mercado em crise, ainda há espaço e função para a alta-costura?
Há alguns anos, o setor mais exclusivo e caro do mundo da moda tem sido questionado. E a cada início de temporada de Haute Couture de Paris – a próxima, para o Verão 2016 começa neste domingo (24.01) – a pergunta volta à tona.
Com uma cartela e clientes – ou colecionadoras – de cerca de 4 mil mulheres no mundo, regras rígidas estabelecidas pela Câmara Sindical de Alta-Costura francesa, que exige um ateliê com pelo menos 20 funcionários contratados o ano inteiro, duas apresentações anuais com o mínimo de 75 looks exibidos no total, processo quase 100% feito à mão com milhares de horas de trabalho para a confecção de uma peça cujo preço começa em algumas dezenas de milhares de dólares no caso de looks diurnos e chega fácil a centenas de milhares de dólares no caso dos vestidos de noite, a alta-costura é, de fato, um luxo para pouquíssimos. Protegida por lei, a nomenclatura só pode ser usada pelos aprovados pela Câmara Sindical de Alta-Costura, que recebem o título de casa de haute couture pelo ministro francês das Indústrias. Hoje, há 14 membros oficiais entre maisons tradicionais como Dior e Chanel e novatos como Alexandre Vauthier, Bouchra Jarrar e a chinesa Yiging Yin (recém-aprovada para o seleto time, em dezembro passado), além de sete membros correspondentes (Giorgio Armani e Alaia na lista) e 22 estilistas convidados.
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Bernard Arnault já disse que a alta-costura não dá dinheiro. Ela, sim, é uma excelente vitrine. Provoca desejo quando usada em tapetes vermelhos por celebridades como Jennifer Lopez (de Giambattista Valli Couture), Lady Gaga (Atelier Versace) e Kirsten Dunst (Valentino Couture) no Globo de Ouro deste ano. Também aumentou o alcance de suas imagens graças à velocidade da divulgação de seus looks na internet, replicados nas mídias sociais. Com a globalização, suas consumidoras vêm de vários países, com aumento do número de mulheres do Oriente Médio e da Ásia. As vendas têm crescido de 20% a 30% (dados, respectivamente de Chanel e Valentino, referentes a 2014, segundo o WWD) de alguns anos para cá, o que explica cenas como a do documentário “Dior e Eu”, em que a costureira chefe da haute couture abandona Raf Simons em pleno processo de confecção de seu primeiro desfile para a maison para pegar um avião e atender uma cliente internacional (as vendas de alta-costura da Dior também cresceram sob a batuta de Simons).
Acima de todos esses argumentos, porém, há um fato maior. O prêt-à-porter de luxo não é mais o mesmo, o que torna a existência da alta-costura não só aceitável, mas necessária. Foi-se o tempo em que as marcas de ready to wear dedicavam às passarelas coleções superconceituais e deixavam para as lojas os desdobramentos comerciais. Hoje, os clientes assistem ao vivo às apresentações, olham cada look detalhadamente pela internet, o que exige que aquela roupa, tal qual foi apresentada, esteja disponível para compra. Não há mais tempo nem espaço para apresentar uma peça muito diferente do que será vendido e pedir que o comprador tenha paciência: aquela é a imagem conceito, a essência criativa da coleção elaborada pelo estilista, daqui a alguns meses ela será digerida e transformada em outra roupa, não essa que você viu, mas algo extremamente desejável e com qualidade semelhante, só que com o conceito mais diluído para ser usada na vida real.
A aproximação entre cliente final e desfile de passarela mudou a forma de criar e apresentar as coleções de desfile, e isso não necessariamente é ruim. Mas sobrou menos espaço para as experimentações radicais, para os arroubos de sonho e fantasia, para o luxo desmesurado e deslumbrante. E é aí que a alta-costura entra e se faz útil. “A alta-costura é o que dá ao nosso negócio a essência primordial do luxo. E é onde colocamos em prática nossas ideias”, diz Arnault. E são essas imagens e ideias, no final, que vão ajudar a moda a girar e os consumidores a devorarem, com vestidos de sonho na cabeça, batons, bolsas e perfumes que carregam um pouco da aura e o mesmo nome da marca.
A seguir, veja o calendário de desfiles da semana de alta-costura de Paris para o Verão 2016 (horário de Paris).
DOMINGO – 24.01
21h – Atelier Versace
SEGUNDA – 25.01
10h – Schiaparelli
11h – Schiaparelli (segunda apresentação)
12h – Dice Kayek
12h30 – Tony Ward
13h – Antonio Ortega
14h30 – Christian Dior
17h – Christian Dior
18h – Dany Atrache
18h30 – Ralph&Russo
19h30 – Giambattista Valli
20h30 Alexis Mabille
TERÇA – 26.01
10h- Chanel
11h – Aouadi
12h – Chanel (segunda apresentação)
12h30 – Patuna
13h – Bowie Wong
13h – Yanina Couture
13h30 – Bouchra Jarrar
14h30 – Stéphane Rolland
15h30 – Georges Chakra
16h – Julien Fournié
17h – Yiqing Yin
18h – Giorgio Armani Privé
19h30 – Alexandre Vauthier
20h – Maison Anoufa
QUARTA – 27.01
10h – Maison Margiela
11h – Franck Sorbier
12h30 – Elie Saab
13h30 – Ilja
14h30 – Jean Paul Gaultier
16h – Viktor & Rolf
17h – Ulyana Sergeenko
17h30 – Ludovic Winterstan
18h – Romain Brau
18h30 – Valentino
19h30 – Zuhair Murad
20h30 – Guo Pei
QUINTA – 28.01
10h30 – BOUCHERON, CHANEL JOAILLERIE, CHOPARD, DE BEERS (alta joalheria)