Uma grande exposição do fotógrafo Wolfgang Tillmans abre nesta quarta (15.02) no terceiro piso da Tate Modern e o FFW foi convidado para um preview exclusivo para jornalistas.
A primeira coisa que chama a atenção é que a mostra é enorme e bem completa, mas não é uma retrospectiva. Tillmans sempre gostou de achar um jeito próprio de mostrar as obras; ele enxerga essa exposição mais como uma instalação, uma ocupação. Retrospectiva seria um termo um tanto banal para um fotógrafo cujo trabalho sempre refletiu sua época, o aqui e agora, porém de uma maneira que faz com que seu valor seja muito mais duradouro.
Wolfgang começou a fotografar na Alemanha no final dos anos 80, ainda sem saber que seria um artista. Basicamente, fotografava o que vivia: corpos se abraçando, pessoas dançando em raves, natureza, pequenos detalhes. As imagens resultantes não eram só fotos, mas experiências. Ele ficou conhecido através das páginas da i-D no início dos anos 90 fotografando a cena jovem da época. “Em 1988 foi a primeira vez em que me senti parte de algo que era próximo de mim. Era completamente o aqui e agora e não havia nenhum conceito do ontem porque tudo ao redor era tão novo”, disse em uma entrevista.
Essa sensação é a base do seu trabalho até hoje, mas além de retratar o agora, suas obras também receberam carga política e social. Tillmans é um artista que não fecha os olhos para o mundo, suas belezas e agonias, e temas como controle, liberdade, preconceito e minorias são recorrentes em seu dia a dia como fotógrafo, seja da forma delicada como aborda a perda de seu parceiro para o HIV, ou vigorosa, como a campanha que fez contra o Brexit.
Uma foto em grande escala de um mar revolto pode ser apenas uma foto em grande escala de um mar revolto. Mas diz muito nas entrelinhas sobre a situação de milhares de refugiados que deixam seus países em barcos.
Conexão, liberdade, fragilidade e vulnerabilidade são palavras importantes para Wolfgang desde o início de sua carreira. A frase “when I’m weak I’m strong” nomeia um de seus livros. Algumas fotos enfatizam a fragilidade do corpo humano, destaca a coexistência das esferas pessoais, públicas e políticas na nossa vida. Há belos retratos de Oscar Niemeyer, Morrissey, Frank Ocean, Patti Smith. Há revistas, livros, catálogos, posters, artigos de jornal com seus trabalhos, fazendo com que o público se conecte a ele de outras maneiras, muito além das paredes do museu. Para Tillmans, expor uma obra em uma página impressa vale tanto quanto a parede de um museu.
Escala é outra coisa importante em seu trabalho e que fica bem clara passando pelos salões da Tate. Não há distinção ou hierarquia nas obras. Cada sala da galeria foi pensada como uma coisa só, uma instalação, uma reunião de imagens que conversam. Fotos de famosos com anônimos e anônimos que podem ser famosos. Obras enormes em belas molduras ao lado de pequenos prints colados com durex direto na parede.
Essa forma de trabalhar o espaço o deixa livre para expor um material extenso e bastante representativo de cada uma de suas facetas. Em conversa com o FFW, a curadora Emma Lewis contou que o artista enviou uma quantidade enorme de obras e centenas de prints por navio. “Trabalhamos com ele por dois anos. O conceito principal foi a ideia de expandir o processo artístico, incorporando publicações, vídeos, fotografias, performance e música. Wolfgang e sua equipe ficaram experimentando por duas semanas até decidirem onde tudo seria colocado”.
Como a localização de cada obra no espaço é muito peculiar, o trabalho da curadoria (que também conta com Chris Dercon e Helen Sainsbury), ficou baseado em conceitualizar o show do que necessariamente no trabalho individual do fotógrafo.
“Wolfgang decide tudo. As obras de grande escala mais ou menos ficaram nos mesmos lugares desde o início, mas os prints pequenos, ele colocou, tirou, colocou em outro lugar e assim foi até dois dias atrás”, diz Emma. É de Tillmans também o design gráfico do livro que acompanha a exposição.
Esse nível de controle fez com que ele precisasse pedir uma autorização especial para trabalhar durante a noite na Tate Modern, onde varou madrugadas com sua equipe montando os espaços.
Tendo mergulhado na obra de Tillmans nos últimos anos, Emma acha que visitantes pouco familiares com seu trabalho não terão dificuldade para se conectar com ele. “O mais interessante é que Wolfgang coloca atenção em detalhes que, na maioria das vezes, não damos bola. Fala-se muito sobre os registros cotidianos que ele faz, mas na verdade, é muito uma escolha particular, seja algo lindo ou importante que ele queira chamar atenção. E acho que esses detalhes falam com todos. Pode ser o florescer de uma macieira. As pessoas reconhecem a beleza disso. Pode ser a imagem de um protesto político, que nos lembra que isso está acontecendo no mundo. Uma das coisas que realmente amo e acho uma ótima amostra de sua sensibilidade é como o belo e aspectos estressantes da sociedade sentam lado a lado. Na fotografia still life Calle Real II 2013 há uma linda planta. O verde é lindo, a textura dela também, mas ela está apoiada em uma página de um jornal alemão cujo artigo descreve uma execução do Estado Islâmico”.
Após a conversa com Emma e uma tour pela mostra, Wolfgang aparece de surpresa ao final do programa. Vestindo um macacão jeans e tênis Adidas xadrez, ele conversa rapidamente com a gente e faz questão de deixar claro logo no início: “Política é parte da minha vida, mas essa não é uma exposição política, é uma exposição de arte”. Com a vitória do Brexit, ele talvez prefira que sua mostra não gire em torno deste assunto ou deixe muito espaço para que seu trabalho artístico mostrado na Tate gire em torno de debates políticos.
“Aqui estão pontos de vista muito particulares de como eu enxergo o mundo. Não espero que as pessoas entendam ou concordem, mas há também a grande possibilidade de haver uma conexão entre a gente”.
Aqui estão imagens e arquivos que contam uma história, mostram preocupações, desejos, dores, loucura e a beleza da natureza de maneira simples, mas repleta de significado. Basta parar e observar para se conectar com Tillmans.
Wolfgang Tillmans 2017 fica em cartaz na Tate Modern, em Londres, ate o dia 11 de junho.