O boom da perfumaria de nicho
Como a acessibilidade vem transformando segmentos e marcas nichadas da perfumaria.
O boom da perfumaria de nicho
Como a acessibilidade vem transformando segmentos e marcas nichadas da perfumaria.
Há uns 10, 8 anos, quando estava trabalhando em uma revista, lembro que numa reunião de pauta se teve a ideia de falar sobre “o perfume secreto dos fashionistas”. O perfume envolto nessa gaze de exclusividade e mistério era o Santal 33 da Le Labo – na época o eleito de modelos, estilistas e galeristas. Corta para 2024, navegando pelos stories sou surpreendido por um anúncio do hypado perfume em um marketplace super popular, achei curioso o episódio inesperado e reflito aqui sobre a – suposta – popularização da perfumaria de nicho.
Para isso entender esse possível boom do segmento dos perfumes de nicho – aqueles que encontramos em pequenas lojas de determinadas capitais mundiais, sem grandes campanhas publicitárias e muitas vezes guardados a sete chaves –, conversei com dois experts no assunto: Dênis Pagani, especialista há mais de 10 anos na perfumaria e nome por trás do 1nariz, e Estefânia Verreschi, pesquisadora que você já deve ter sentido o trabalho, se visitou as lojas de marcas como Foz, Botti ou Flavia Aranha – é ela quem desenvolveu a identidade olfativa para essas marcas.
“Existe nicho em um mundo global e repleto de informação em poucos cliques?”
“A perfumaria de nicho representa um pedaço dentro do vasto mercado de fragrâncias, que prioriza experiências únicas, o trabalho artesanal, novas perspectivas sobre o olfato e o desejo por comunicar as emoções através de um pensamento mais artístico em contraste ao comercial“, me responde de forma bem didática Estefânia.
Curioso, questiono Dênis quando esse conceito foi iniciado: “Consideramos que a perfumaria de nicho nasceu lá nos anos 1970, com a marca L’Artisan Parfumeur [fundada em 1976]. Influenciada pelo movimento hippie, a contracultura. Muito voltada a ideia da perfumaria pura, de celebrar os ingredientes, além de propor algo sem gênero”.
A popularização descaracteriza?
Para Estefânia: “Acredito que a filosofia da perfumaria de nicho já a protege naturalmente dessa descaracterização. Os perfumes são elaborados com ingredientes de alta qualidade, pouco convencionais, gerando uma composição inusitada, que, aliado aos preços mais elevados, desempenham um papel fundamental na proteção dessa autenticidade”.
Enquanto Dênis, pondera: “Sim e não, eu acho que periga descaracterizar, mas varia muito. A Le Labo agora pertence à (gigante) Estée Lauder, costuma respeitar um pouco mais as identidades das marcas. A Jo Malone quando ingressou na L’Oreal já foi mais descaracterizada”.
Quais são essas marcas quase secretas
Dentre as principais se destaca Le Labo, fundada em 2006, em Nova York, e responsável por aguçar a curiosidade até entre os que nunca pensaram em perfume. No mesmo ano, a Juliette Has a Gun começava a chamar atenção em Paris assim como a sueca Byredo. “Byredo não vale o preço, grande em conceito, mas…”, provoca Dênis.
“A Jo Malone chegou no Brasil e virou referência no mercado de nicho. A Neeche e outros marketplaces também influenciaram muito o contato dos clientes com novas marcas. No Brasil, também já existem marcas nacionais que buscam compreender o mercado interno e desenvolver fragrâncias exclusivas para atender às demandas desses novos clientes”, analisa Verreschi.
Existem perfumes de nicho brasileiros?
“Apostaria na L’Envie, que tem coisas muito interessantes e está em expansão, se apropriando da sua própria história”, ressalta Dênis. Amyi, do tupi “lado a lado”, também é outro nome citado ao conversar com entusiastas sobre o tema, outro bom exemplo dessa movimentação, é o grupo Boticário ter lançado recentemente uma linha mais exclusiva, batizada Privée La Collection aux Légumes.
Porque o nicho causa cada vez mais desejo?
“Diferenciação, principalmente! Sabe aquele amigo que gosta de um álbum, mas deixa de gostar quando todo mundo passa a ouvir? É mais ou menos assim. Esse conceito indie vale também na perfumaria”, brinca Dênis, que vai além: “Acredito que em breve provavelmente a gente venha a falar sobre o ‘nicho do nicho’. Talvez surja a ‘Birkin bag’ da perfumaria, com mil, 10 mil frascos apenas produzidos, com direito a lista de espera, preços absurdos…”.
Estefânia finaliza: “Eu acho que todo mundo quer se sentir especial, e de novo, nada comunica as emoções mais profundamente do que o olfato. Tem uma frase que sempre digo que é: “O cheiro como provocação”.