Certamente você conhece o termo vegetarianismo, que se refere ao regime alimentar que exclui o consumo de todos os tipos de carne e seus derivados; mas e quanto ao veganismo, já ouviu falar? Trata-se de um movimento mais amplo, que não só recusa a ingestão de carnes, leite, ovos e mel, como também boicota qualquer produto que dependa da exploração de animais: roupas e artigos de couro, pele, lã e seda; adornos feitos com ossos, penas ou marfim; medicamentos testados em animais; e até cosméticos que tenham ingredientes de origem animal.
Sim, porque muito além do leite e do mel, a indústria cosmética utiliza vários ingredientes de origem animal na composição de cremes, xampus e sabonetes: proteínas (colágeno, colágeno hidrolisado, gelatinas e alguns aminoácidos isolados); lanolinas puras, acetiladas e/ou etoxiladas; e ésteres derivados do sebo animal são alguns dos exemplos mais comumente utilizados nessa indústria, como explica Luiz Gustavo Martins Matheus, farmacêutico e diretor da Associação Brasileira de Cosmetologia.
Com o crescimento da comunidade vegana pelo mundo, muitas empresas passaram a incluir em suas prateleiras opções vegan-friendly, que não usam nadinha de origem animal. “No arsenal de ingredientes de produtos cosméticos sempre é possível substituir ingredientes animais por vegetais ou sintéticos em termos sensoriais (espalhabilidade, emoliência, lubrificidade, oleosidade, etc)”, esclarece Luiz Gustavo, dando como exemplo a cera de abelha e o espermacete de baleia, utilizados para dar uma textura consistente, mas que podem ser substituídos pela cera de carnaúba e manteigas de ucuúba, murumuru, tucumã, cacau e cupuaçú, entre outras.
O problema, ele continua, é que “nem sempre conseguimos o mesmo preço. Os ingredientes vegetais e/ou sintéticos podem custar mais caro, principalmente se forem orgânicos, podendo chegar ao dobro do custo. Desta forma o produto cosmético fica com o preço mais salgado”.
Para Clélia Cecília Angelon, fundadora e diretora da Surya Brasil, fabricante de cosméticos totalmente veganos*, o preço de custo era o menor dos problemas quando ela decidiu entrar nessa fatia do mercado: “Quando eu criei a empresa, em 1995, tive todas as dificuldades possíveis, mas a maior delas foi a não-aceitação dessa filosofia no Brasil; enfrentei a não-aceitação do consumidor e até dos meus gestores, que entendiam os meus valores, mas diziam que isso não daria dinheiro”, ela diz, acrescentando que, hoje, a marca está presente em 27 países e tem um crescimento de 40% ao ano.
“Nossa filosofia de respeito ao consumidor, à vida, ao planeta e à sociedade nos solidificou no mercado, mas ainda temos muito trabalho a fazer no sentido de convencer as pessoas a serem mais clean e conscientes em relação ao planeta. Essa é uma posição sólida; não é uma moda, é uma evolução”, afirma Clélia.
No exterior, para identificar os produtos veganos, há vários selos emitidos por organizações protetoras dos animais e do meio ambiente, como o “Cruelty Free”, da PETA, e o “Certified Vegan”, da Vegan Action (a Surya Brasil é a única empresa brasileira com esse selo), mas por aqui não há nenhum órgão nacional que preste esse tipo de serviço. Para quem tiver interesse em consumir apenas cosméticos veganos, a dica é entrar em contato diretamente com o Serviço de Atendimento ao Consumidor das marcas e se informar sobre a composição dos produtos.
* A henna em pó da Surya Brasil vem acompanhada de um sachê de mel, mas a empresa informou que está trocando o mel por uma alternativa vegana.