Lino Villaventura em seu backstage, pouco depois de conversar com o FFW ©Felipe Abe
A homenagem de Ronaldo Fraga ao Pará em sua coleção de retorno ao line-up do SPFW foi apenas mais uma demonstração do destaque que o estado tem recebido nestes últimos anos. Extremamente rico em termos culturais, sociais e, claro, ambientais, o Pará se tornou a bola da vez por unir a essência do Brasil – alegre e multiétnico – ao modo de viver e produzir mais ligado a conceitos de sustentabilidade. Lino Villaventura, nascido Antônio Marques dos Santos Neto, em Belém, é um dos maiores representantes dessa riqueza na moda, ao lado de André Lima.
Apesar de ter começado sua carreira em Fortaleza, lugar onde viveu durante muitos anos e que ainda hoje representa um dos polos de produção de sua marca, Lino reverencia a cada coleção suas raízes paraenses. O FFW conversou com o estilista nesta sexta (15.06), poucas horas do início de seu desfile de Primavera/Verão 2012/13, sobre os laços afetivos com sua terra natal, e o momento de glória que tem vivido o Pará.
O que você acha deste momento que o Pará está vivendo?
É mais do que justo. Primeiro, a história cultural do Pará, como um todo, é incrível. E Belém, principalmente, porque a cidade tem toda aquela mistura de Belle Epoque europeia com tradições indígenas. Na verdade, o brasileiro não valoriza o que tem de mais bacana e bonito. Então esse destaque é mais do que justo, imagine!
Primeiro que tem a melhor gastronomia que existe. As culinárias baiana e mineira são maravilhosas, mas de influência africana. Já a gastronomia do Pará é indígena, ou seja, a mais autêntica cozinha brasileira. Hoje em dia, todos os chefs, de São Paulo e do mundo inteiro, vão para lá. O mercado Ver-o-Peso, em Belém, é uma coisa absurda, tudo que você imaginar tem naquele lugar, é incrível.
E a influência do Pará se reflete com frequência no seu trabalho?
Totalmente. Eu tenho a sorte de ter a influência do Norte, que é uma coisa bem distinta, e do Nordeste. Na minha cabeça há muito dessa mistura. Mas voltando ao Pará, minha base cultural vem de lá, minhas referências de vida também, só saí de lá com 17 anos. No seu trabalho, todas as suas referências saem de você. Se você copia da revista, claro que não. Mas quando você faz um trabalho com autenticidade, original, aí tudo que você tem de referência se revela.
Looks da coleção de Primavera/Verão 2012/13 de Lino Villaventura ©Zé Takahashi/Ag. Fotosite
Quais foram as circunstâncias da sua mudança para o Ceará?
Saí com meus pais. Meu pai era louco por praia, aí resolveu morar em Fortaleza. Quando eles se mudaram para o Rio de Janeiro, decidi ficar sozinho.
Como é, internamente, essa relação Norte-Nordeste, regiões tão semelhantes e ao mesmo tempo tão distintas?
Todo mundo, em São Paulo, pensa que Norte e Nordeste é uma coisa só. É bem distinto, bem diferente. O povo paraense é muito simpático, às vezes até exageradamente, e se torna íntimo muito rápido. Todos são assim, somos muito calorosos. Já o nordestino é simpático, mas desconfiado. Paraense é simpático e se entrega logo, mas senti isso quando fui morar no Nordeste.
Eu acho assim, como sou de Belém, e vivi muito tempo em Fortaleza e ainda trabalho muito lá, me dá muita coragem de usar as referências e materiais que uso há muito tempo. A pele de peixe, por exemplo, uso desde 1985, e agora acham que é algo pioneiro. Só que naquela época não tinha essa moda de ecologicamente correto e sustentabilidade, acharam que era uma coisa de regionalismo, e não era, tanto é que vendi coleções com pele de peixe para Japão, Estados Unidos, França.
Você acredita que existe algum motivo específico para que as atenções tenham se voltado agora para o Pará?
Não, acho que as pessoas começaram a prestar atenção em uma região muito rica culturalmente. Porque se você for ver bem a história de Belém, é incrível. Toda a Comédie Française [companhia permanente do Teatro Francês] se apresentava em temporadas em Belém, assim como a Ópera italiana e o cantor de ópera Enrico Caruso. O nível cultural das pessoas é muito elevado, em geral, por conta desse embasamento histórico da cidade. Houve uma época em que corria muito dinheiro em Belém, o que contribuiu para o desenvolvimento… tanto é que os primeiros grandes teatros do Brasil foram construídos em Belém, não em São Paulo ou Rio de Janeiro. As primeiras cidades com luz elétrica: Manaus e Belém; todo mundo tinha mais contato com a Europa do que com o resto do Brasil, tanto é que os mais ricos lavavam as roupas em Londres. Acredito que o destaque seja em virtude dessa coisa de sustentabilidade, de volta às raízes indígenas.