Marina Abramovic, a incensada artista sérvia com algumas das performances mais radicais e emocionantes da arte contemporânea foi sem dúvidas a responsável por transformar o desfile da Givenchy na experiência de moda mais impactante da temporada internacional do Verão 2016 – ainda que estejamos apenas no início dos desfiles e na primeira fashion week da série seguida por Londres, Milão e Paris. Riccardo Tisci, é claro, fez sua parte com toda a sua sensibilidade não só de elaborar essa parceria como de criar uma coleção que mistura delicadeza e força, estranhamento e beleza numa medida rara a partir de um mix de vestidos tipo lingerie com peças baseadas no smoking e no guarda-roupa masculino (veja a coleção completa na página de desfiles do FFW).
A seguir, cinco fatos que passam pela moda e vão muito além dela nesta performance fashion artística que emocionou o mundo fashion, e não só ele, no último 11 de setembro, em Nova York, e que também marca a abertura da primeira loja da marca na cidade.
1. Parceria duradoura
Riccardo Tisci e Marina Abramovic são amigos há muito tempo e já trabalharam juntos. Eles se conheceram há oito anos, por meio do ex-marido da artista, o também artista sérvio Nesa Paripovic. Em 2010, a Givenchy promoveu um jantar em homenagem a Abramovic no encerramento de sua icônica performance The Artist is Present, numa retrospectiva no MOMA de Nova York, em que a artista passou 700 horas sentada numa cadeira encarando as pessoas que se colocavam na frente dela, provocando os mais diferentes tipos de reação. Na época um dos últimos a encarar Abramovic antes do encerramento da performance, Tisci se emocionou. “Ela estava chorando e me fez chorar também.” Em 2013, o estilista assinou o figurino do balé Boléro, apresentado na Ópera de Paris com cenografia de Abramovic. Em 2012, a artista estava entre os amigos que estrelaram campanha do Verão 2013 da Givenchy.
2. 10 anos na Givenchy + 11 de Setembro
O desfile marcou os dez anos de Riccardo Tisci à frente da Givenchy, além de ser uma homenagem à igualdade e ao amor entre os povos. “A influência da coleção foram cinco diferentes religiões. Num dia como este você tem que pensar sob o aspecto positivo: somos todos iguais, o amor é para todos e o amor não tem uma religião. Amor é amor”, disse Tisci. “O 11 de setembro é o dia mais triste da história da América. E como fazer algo que tenha essa energia da elevação, e não apenas da tristeza? Este show fala sobre amor, sobre união, sobre a ideia de que só conseguiremos parar de se matar se aprendermos a perdoar. Este desfile fala sobre o perdão”, resumiu Marina Abramovic, que ainda divulgou uma carta endereçada a Tisci, em que explica a sua colaboração no desfile da Givenchy.
3. Performances
O show, marcado para às 18h30 teve suas portas abertas meia hora antes e foi precedido de uma performance que durou cerca de uma hora, iniciada sob o pôr do sol, com o mirante do novo edifício do World Trade Center, onde ficavam as Torres Gêmeas, ao fundo. Artistas vestidos de preto e branco – as cores predominantes da coleção de Tisci – executavam lentamente rituais simples que evocavam o amor pela natureza e a união: um casal se abraçava entre árvores, uma performer se deixava molhar pela queda d’água de um cano de metal. A trilha sonora foi inspirada por música sacra de várias religiões, encerrada com Ave Maria.
4. Brasil
Tisci escolheu uma brasileira veterana das passarelas para fechar o desfile: Raquel Zimmermann. O Brasil não apenas encerrou o desfile, mas inspirou a cenografia, uma referência às nossas favelas, com plataformas de várias alturas construídas de material reciclado no Pier 26, com vista para o rio Hudson, em colaboração com Marina Abramovic.
5. Público “real”
Cerca de 2 mil pessoas de fora do circuito dos vips da moda assistiram ao desfile. Os convites foram distribuídos para moradores da região onde aconteceu o show, para centenas de estudantes de design e moda de escolas como a FIT, Parsons, Pratt Institute e a High School for Fashion Industries. A Givenchy também fez uma parceria com a prefeitura de Nova York e lançou um site para que pessoas comuns solicitassem seu ingresso e o retirassem antes do show. Em 1984, Thierry Mugler fez algo parecido: vendeu convites para um de seus desfiles-show, reunindo uma plateia de 6 mil pessoas, entre público especializado ou não em moda. O tema da coleção também tinha a ver com religiosidade, mas sem o sincretismo da Givenchy: ele quis reinterpretar o nascimento de Jesus, numa passarela cheia de freiras e querubins.