Imagina uma série de época, com dezenas de personagens centrais e mais sete mil extras. Em apenas uma das cenas, um único vestido consumiu cerca de R$ 120 mil para ser construído.
Trata-se do novo seriado da Netflix, “The Crown”, a mais cara produção da empresa, estimada em US$ 100 milhões, que olha para o período em que uma jovem Elizabeth ocupa o trono, inesperadamente aos 25 anos.
Quem já assistiu aos 10 episódios da primeira temporada, certamente se encantou com o trabalho da atriz Claire Foy interpretando a rainha, na vida pública e privada, mostrando seus momentos de insegurança e dúvida e ainda tentando equilibrar sua vida pessoal com seu novo papel. “Você é minha mulher ou a rainha?”, pergunta o príncipe Phillip. “Eu sou as duas e um homem forte seria capaz de se ajoelhar perante ambas”, responde Elizabeth, em um dos diálogos que melhor traduzem o conflito mulher/rainha.
Grande parte do sucesso da construção de personagens reais e de um período específico da história se deve ao figurino. Peter Morgan e Stephen Daldry, produtores executivos da série, não tiveram dúvidas na hora de chamar a premiada Michele Clapton para a empreitada. Ela está por trás do figurino de todas as temporadas de Game of Thrones. “Ela é brilhante e sempre foi a única escolha. Se as roupas não estiverem perfeitas, eu não tenho como filmar”, disse Daldry, que também dirige a série.
Como é baseado em fato, eles tinham que ser completamente precisos com o período, que se passa nos anos 40 e 50 e o figurino teve um papel fundamental na construção dos personagens. “Eu sou a primeira pessoa com quem os atores passam um tempo. Os ensaios vêm bem depois. Quando eles vestem a roupa e ela fica perfeita, você vê a transformação”.
Para retratar o período e reconstruir os momentos vividos pela família real, Michele olhou para milhares de fotos e vídeos antigos e estudou a moda e o comportamento da época, revendo revistas e anúncios, além de estilistas como Christian Dior, Hardy Amies, especialista em moda masculina, e Norman Hartnell, que fez o vestido de Elizabeth para seu casamento com o príncipe Philip, em 1947.
Recriar o vestido de noiva da rainha foi um dos momentos mais trabalhosos e caros do processo. Seis bordadeiras contaram com a ajuda de estudantes de moda e trabalharam 10 horas por dia por seis semanas ao custo de R$ 120 mil. O departamento de figurino chegou a ter 100 pessoas trabalhando nos momentos de maior agitação. “Para ter qualquer credibilidade da nossa interpretação dos momentos íntimos e privados, tivemos que fazer com maestria os momentos públicos, pois eles já foram muito documentados”, disse Michele à “Elle” americana.
Claire Foy relembra como se sentiu ao usar o vestido: “Levamos cinco dias para fazer a cena e o vestido era muito pesado. Imagine toda a confusão para vesti-lo da forma certa, ficar com vontade de ir ao banheiro e você ainda tem uma coroa na cabeça…”. E faz a gente pensar em como a rainha, que a gente aprendeu a ver como uma mulher extremamente séria e fria, pode ter se sentido na ocasião. “Para essa jovem mulher vestir tudo isso e ainda ter a compostura para entrar na abadia cheio de chefes de estado, há de ter muita presença de espírito. Quem mais poderia ter feito isso e por tanto tempo sem nunca responder ou reclamar?”, questiona Claire.
Outro look que se destaca é um vestido turquesa, usado com estola de pele e uma tiara de diamantes, que a rainha vestiu aos 30 anos em uma noite de gala durante o Festival de Edimburgo, em 1956. Já a roupa da coroação teve uma ajuda surpresa da Swarovski, que havia recriado uma réplica para uma exposição e ofereceu o vestido como empréstimo.
Mas nem só de extremo luxo vive a rainha. A série também retrata seus momentos íntimos ou mais à vontade, em que usa o que é conhecido como seu traje preferido: capa de chuva, lenço na cabeça e galocha, que também vemos Helen Mirren usando no filme “A Rainha”.
A terceira parte da construção da personagem mostra a jovem rainha em um período de mudanças históricas, políticas e culturais, num universo dominado por homens. Para enfrentar seu novo papel, ela não podia mostrar seu lado sentimental. “Decidimos vesti-la em algo que era tipo um uniforme, o equivalente ao terno masculino. Funcionava como como uma armadura e ela podia se esconder por trás de vestidos extremamente formais. Até os botões são cobertos”, explica Michele. Assim, com vestidos new look, a rainha promovia uma nova Grã Bretanha.
A princesa Margareth (Vanessa Kirby) é outra personagem que vale observar. Livre do peso da coroa, ela é divertida, livre e atrevida, características evidenciadas também em seus vestidos tomara que caia e em cores claras.
De fato, para recriar a vida de uma das famílias mais ricas e famosas no mundo, você precisa de uma boa quantidade de dinheiro. “Essa foi a ideia: fazer o mais perfeito que podíamos”.