Seria possível questionar se essa estética retrô romântica excêntrica intelectual (ufa!) de Alessandro Michele já não teria sido vista há alguns anos na italiana Prada. Frequentemente, o estilo da nova Gucci é comparado ao dos personagens do filme “Os Excêntricos Tenembaums”, de 15 anos atrás e do diretor Wes Anderson, fonte da qual Miuccia também bebe (Anderson, inclusive, assina a decoração do bar da Fundação Prada). Referências podem ser comuns e estão aí para quem quiser usá-las e interpretá-las. Fato é que a coleção Cruise 2017 da Gucci por Alessandro Michele provoca desejo. Um desejo legítimo de usar as roupas desfiladas, de ser essa mulher que mistura presente e passado, que recusa o minimalismo e o streetwear cru da vertente da moda encabeçada pela Vetements para se enfeitar toda, e ainda assim não parecer uma riquinha superficial. E se está causando alvoroço (refletido em vendas, que cresceram na marca), é porque há algo novo no olhar de Michele que faz com que esse conceito funcione tão bem em 2016.
+ Veja o desfile completo da coleção Cruise 2017 da Gucci
Mais uma vez, o diretor criativo da Gucci evocou o caráter histórico e artístico de um tema para criar sua coleção, dessa vez inspirada em Londres e desfilada nesta quinta (02.06). A seguir, os destaques da Cruise 2017 decorativista, retrô e jovem, com a excentricidade de uma Londres do passado e do presente, casando com o olhar particular de Alessandro Michele que, ao lado de Demna Gvasalia (Vetements e Balenciaga), forma a atual dupla de Midas da moda internacional.
Abadia de Westminster
Local do casamento do príncipe William com Kate Middleton, essa foi a primeira vez que a Abadia de Westminster, em Londres, foi palco de um desfile de moda. A apresentação da Gucci aconteceu nos claustros, não na igreja do edifício que abriga ainda residências e uma escola. A parte dos claustros também é usada, há cerca de dez anos, para a realização de eventos corporativos.
Londres histórica
Segundo Alexandre Michele, a escolha da locação do desfile diz muito de como ele enxerga Londres, inspiração para a coleção. “A ideia do desfile é fazer uma homenagem à cidade, porque eu adoro os ingleses. Escolhi a Abadia de Westminster porque todo mundo tem essa ideia da Londres cool, mas para mim seu aspecto histório é o que é realmente cool. Gosto dessa ideia de algo que ao mesmo tempo é e não é óbvio. O passado é algo vivo, que fala conosco todos os dias. Se plantamos essa semente no presente, algo floresce”, disse Alessandro Michele, no texto para a imprensa. Assim, ele misturou nos bordados as flores dos clássicos jardins ingleses e shapes austeros de vestidos vitorianos com a exuberância excêntrica dos looks de rua contemporâneos na cartela de cores com tons vibrantes combinados e um mood que passeava pelo retrô anos 70 com uma pitada punk.
Os bichos de Michele
Nas almofadinhas que enfeitavam as cadeiras da platéia e nas peças, os bichos são os reis da selva da moda na Gucci. Bordados de cobras, tigres, gatos e cachorros, broches de abelha; é rica e variada a fauna de Alessandro Michele.
Competição com a coleção “mãe”
Originalmente e teoricamente, as coleções entre temporadas têm uma importância menor em relação às principais, desfiladas duas vezes por ano nas semanas de moda do mundo. Até pouco tempo atrás, essas linhas intermediárias iam direto para a loja, sem a pompa da passarela. Mas esse comportamento tem mudado, incentivado pelas boas vendas das coleções Pre-Fall e Resort (ou Cruise), que, numa matemática de mercado (levando em conta as liquidações), acabam ficando mais tempo à disposição do cliente. Resultado: a Cruise 2017 da Gucci mostrou mais looks femininos na passarela do que o Inverno 2016/17 da marca, desfilado em fevereiro passado, em Milão. Mesmo tirando os looks masculinos ainda sobram 74 looks femininos da Cruise contra 65 do Inverno (tirando os 5 masculinos). E 22 masculinos na Cruise contra apenas 5 na coleção principal. Para se pensar, não?
Masculino e feminino
Com 96 looks, o desfile mostrou não só a coleção feminina mas teve um número considerável de entradas masculinas (22), numa prévia do que a marca já havia anunciado: de que vai unir os dois desfiles a partir de 2017.
Acessórios
Durinhas e carregadas no antebraço, tipo “madame”, as melhores bolsas da coleção são as que ficam menos formais e ganham humor com as cores vibrantes e com os bordados, como essa com bordado de flores e as com bordados de bichos, como a do tigre, com destaque para a menorzinha de cobra.
Música
A trilha sonora teve direção musical de Steve Mackey e John Gosling, com órgão ao vivo e voz do The Liturgical Choir of Cardinal Vaughan Memorial School. Uma parte dos arranjos musicais foi gravada num estúdio.