Após cinco anos sem desfilar – sua última participação em uma semana de moda foi no SPFW Inverno 2010 -, Fabia Bercsek fez seu retorno às passarelas na quinta-feira (23.04), durante a 37ª edição da Casa de Criadores. A decisão foi estratégica: chamar a atenção do público e da imprensa para o high lace tennis boot, novo modelo de bota que é o primeiro grande lançamento de Fabia como diretora criativa da marca de calçados Cravo & Canela. O fator prático do evento, porém, não ofuscou o lado sentimental; ao fim do show, a estilista era pura emoção ao agradecer colaboradores e amigos que prestigiaram sua volta a uma atividade que ela sempre amou.
Após a apresentação, no backstage montado no Estádio do Pacaembú, Fabia Bercsek conversou com o FFW sobre seu retorno às passarelas, sobre ser “uma última romântica” e sobre a necessidade da liberdade de negócios na indústria da moda:
Como foi a idealização deste desfile?
Tudo fluiu muito naturalmente, desde quando fiz a primeira coleção-cápsula para a Cravo & Canela, até quando me tornei a diretora criativa da marca. Quando chegou o projeto do tênis, quis criar um clássico, um produto que tenha vida longa, que encante, chame a atenção – e fiquei muito feliz com o resultado. Começou então a discussão de como lança-lo; lançar só na loja seria muito protocolado. A Casa de Criadores é a plataforma que a Cravo & Canela tem, como patrocinadora, então a cúpula do marketing sugeriu um evento, uma exposição, um happening. Fiquei pensando em um desfile, primeiro com looks antigos renovados, mas aí achei que não, que tinha que ser algo novo. Foi feito o investimento para o desfile, e tive dois meses para criar a coleção. Foi tudo muito rápido – e foi bom que foi assim. Eu me entrego muito pra qualquer coisa, e fazer um desfile em dois meses é um processo louco, mas sai. Fui dando continuidade à história desse tênis, que foi se expandindo pra roupa, e fui montando assim. Foi um rito de expressão muito grande. Estar aqui é muito importante pra mim.
Qual a sensação de retornar às passarelas após cinco anos sem desfilar? Este desfile representa uma volta definitiva ao calendário de apresentações?
Eu amo fazer desfile, é nítido, mas não posso afirmar que isso é uma volta definitiva. Voltar a fazer desfiles sazonais é uma questão de planejamento, programação, de ver os recursos que vou ter pra isso. Eu, como uma última romântica, não vou conseguir seguir como antes, quando eu tinha a minha marca e fazia meus desfiles independentes em eventos grandes como o SPFW. Eu tinha um ateliê pequeno, e isso me causou um stress muito grande; com o tempo a energia foi acabando. Hoje estou renovada, se isso passou pra roupa eu fico muito feliz, porque fiquei esse tempo sem expressar meu olhar de moda numa passarela. Tem muita emoção envolvida neste projeto que se concretiza.
Estou superengajada e envolvida com a Cravo & Canela, desenvolvendo um projeto pioneiro no mercado de calçados, mas com uma linguagem de moda e com propostas inovadoras como apresentar um desfile na Cada de Criadores. É um cenário novo que pode, sim, levar a ter uma constância de lançamentos e passarela, mas vamos ver.
As peças deste desfile serão comercializadas?
Muitas delas. A coleção vai se chamar High Lace Tennis Boot Collection, referente ao tênis, e com certeza em dois meses vamos fazer um lançamento de algumas peças, trazendo o conceito dos babados, a estrutura, pro comercial.
Elas serão vendidas no meu e-commerce, se a Choix se interessar estará lá, se mais alguém se interessar também (risos). A moda pode e deve ter essa liberdade de negócio, sabe? Eu sou uma estilista de ateliê, romântica, não preciso estar envolvida com um processo comercial muito grande. Não tenho pretensão de mudar o sistema ou o ritmo, mas posso lançar coleções com poucas peças para quem gosta realmente do meu trabalho e ao mesmo tempo estar envolvida com um grupo de calçados criando imagem, as campanhas, a minha linha. Este é um projeto pioneiro que merece muita atenção.
Como será a produção? Vai ser uma responsabilidade sua?
Sim, a Cravo & Canela não produz vestuário. O grupo até tem vontade, futuramente, assim como a West Coast tem a parte masculina com direção criativa do João Pimenta. Mas tem muito caminho pela frente ainda. É algo a se observar, vamos ver. Acho que hoje a indústria não está fácil, tem que ter planejamento, os investimentos têm que ser muito bem colocados. Por enquanto está tudo positivo pra mim e pra eles. Eu espero que evolua e eu possa ter um processo de vida, de criação, de construção de trabalho, mesmo, mais constante.
Você gostaria de acrescentar algo sobre este momento?
Acho que as coisas estão em constante mutação, e o importante é você prestar atenção a tudo – mas prestar atenção mesmo, olhar de todos os jeitos o que você gosta e não gosta. E trabalhar a memória. As pessoas não se aprofundam, e ficam no momento como se só aquilo importasse. Mas existe uma memória, o que já foi construído. Este momento pra mim é isso: estou aqui no presente, mas botando na mesa tudo que eu construí, mostrando uma parte da minha história. É importante atentar ao hoje, mas guardar um histórico. Estou muito feliz.