Este conteúdo é parte da serie de entrevistas “O Estado da Moda, 6 Meses Depois”. Durante o mês de setembro vamos conversar com os personagens da moda brasileira (diretores criativos, estilistas, criadores de imagem, empresários) para entender a visão de cada um sobre o momento atual e sobre o futuro da moda, seu passado recente e o que funciona e o que não funciona mais. Que essas conversas possam apontar caminhos.
Luiz Claudio Silva, fundador e diretor criativo da Apartamento 03 desde 2006.
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Em que momento sua marca se encontrava no início da pandemia?
Já estávamos com o verão quase finalizado e editando os looks de desfile. Meus parceiros de bolsas, sapatos e acessórios estavam com protótipos prontos e estávamos escolhendo cores, metais e acabamentos. Fechamos o atelier em uma sexta, todos entraram em férias coletivas e sem saber o que seria após esse tempo.
O que mudou nesses 6 meses?
Nosso retorno foi aos poucos. Alguns colaboradores em dias alternados, outros do grupo de risco trabalhando de casa e contato só por whatsapp. Mudamos o espaço de trabalho, evitando ao máximo receber quem não é do atelier e ainda todos os dias descobrindo novas formas de estar com os colaboradores em segurança física e mental.
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“A coleção que estava quase finalizada foi redesenhada. Eu achei que precisava fazer sentido naquele retorno. Reduzir e pensar melhor sobre o que pretendia oferecer”.
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Já vínhamos há um tempo discutindo a melhor maneira de lançar nosso e-commerce e o momento acabou acelerando esse processo. Também estamos nos organizando para ter uma loja/atelier em BH, que é a casa da marca e, quando for possível, receber meu cliente pessoalmente. Essa loja é um desejo de muito tempo.
Em algum momento você considerou mudar completamente de vida, fechar o negócio ou alguma outra mudança mais radical?
Não por esse momento, mas já pensei em várias outras situações… Acontece que a gente ama o que faz e isso pode impactar diretamente na vida de outras pessoas – esse é um valor que me faz ir adiante. A moda me abriu oportunidades de conhecer gente incrível, criativos com troca de experiências a artesãos que trabalham com a alma. O que escolhi fazer tem muito sobre o outro.
As discussões sociais em torno do racismo, apropriação cultural, o impacto sócio-ambiental da moda foram assuntos que ficaram mais urgentes a partir da pandemia. Qual o impacto de tudo isso na forma como você cria?
Penso que a pandemia tenha deixado muita coisa exposta, mas todos esses assuntos sempre foram urgentes. Desde sempre o sistema moda seguiu sendo conduzido por um grupo de privilegiados, e claro, os maiores beneficiados por essa estrutura. Alguma movimentação tem acontecido pela própria articulação e potência entre os pretos na moda. É uma felicidade ver essa turma que se parece comigo chegando… é de um orgulho sem tamanho.
Imagine quando comecei se eu me via em alguns espaços? Continuei meu trabalho por estratégia. Foi violento muitos dos episódios e quase nunca disse. Não havia lugar a quem falar.
Nenhuma novidade os casos de racismo… Se há na indústria da moda quem não tenha empatia pelo outro, há menos ainda para questões socio-ambientais.
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“Sigo desenvolvendo meu trabalho atento sempre à minha verdade, sentindo cada passo, ouvindo e dialogando com meus iguais. Respeito aos que vieram antes, mantendo o olhar no futuro e aprendendo com quem vem chegando”.
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Quais são os planos a curto prazo?
Estou muito animado com o projeto da loja/atelier e o desafio de ter um e-commerce. Tenho passado os dias em pesquisas e técnicas de superfície, reavaliando materiais que tenho em estoque. E minhas noites em casa são de livros e músicas.
Como você vê futuro da criação de moda?
Inclusiva sempre. Continuo acreditado que o futuro da moda será colaborativo.