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    O Estado da Moda, 6 Meses Depois: Marcella Franklin, Haight
    O Estado da Moda, 6 Meses Depois: Marcella Franklin, Haight
    POR Augusto Mariotti

    Este conteúdo é parte da série de entrevistas “O Estado da Moda, 6 Meses Depois”. Durante o mês de setembro vamos conversar com os personagens da moda brasileira (diretores criativos, estilistas, criadores de imagem, empresários) para entender a visão de cada um sobre o momento atual e sobre o futuro da moda, seu passado recente e o que funciona e o que não funciona mais. Que essas conversas possam apontar caminhos.

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    A estilista Marcella Franklin fundou a Haight em 2014 e a marca logo se tornou um hype por suas peças que são o oposto do estereótipo de beachwear. A marca estreou na SPFW em 2019.

     

    Quando a pandemia começou, em março

    Iniciamos 2020 com um planejamento animador. Novos desafios e projetos internos e externos que há tempos esperávamos e finalmente seriam colocados em prática.
    Havíamos projetado o lançamento da versão global do nosso site, a realização projetos especiais que aconteceriam junto a nossa rede de mulheres, além de projetos internos importantes que finalmente sairiam do papel.

    2019 foi um ano em que investimos em pessoas. Aumentamos nosso time, criamos áreas que até então não existiam para nos prepararmos alguns passos importantes para a marca e empresa, que planejávamos para este ano.

    Estávamos ansiosas para aterrar a presença do nosso universo em São Paulo através da nossa loja recém-inaugurada.

    O que mudou nesses 6 meses?

    Primeiro aconteceu um rompante de uma rotina e novos processos de trabalho, tivemos que nos adaptar à nova dinâmica 100% online do dia para a noite. Depois vieram todas as reflexões relacionadas à pandemia – os efeitos desta na sociedade, a diferença de efeitos em cada classe, a certeza do despreparo do governo, a extrema necessidade do isolamento, a necessidade de proteger-se a si mesmo, para proteger o outro, a importância de um pensamento colaborativo e empático com quem não tem a opção de ficar em casa.

    O momento e os efeitos da pandemia fizeram com que muitas fichas caíssem na sociedade como um todo. Os valores ficaram mais claros, as prioridades mudaram. Foi preciso uma ruptura no piloto automático em que as rotinas se davam, para que os reais valores ficassem evidentes. Nós nos apoiamos diariamente nestas reflexões para seguir com o direcionamento da marca durante esse período.

    Com o canal online sendo o único em operação, elaboramos uma série de medidas de proteções e protocolos, redobramos os cuidados com a equipe de expedição, criamos a opção de frete adiado – que buscava reduzir o número de deslocamentos físicos tanto da nossa equipe quanto dos entregadores e funcionários dos correios – a compra era feita no site e a cliente a receberia somente quando as lojas abrissem.

    Refletimos constantemente durante todos estes meses. Nosso maior desafio e a pergunta mais frequentes era: como priorizar a saúde e a proteção coletiva e ao mesmo tempo garantir a sobrevivência da empresa e da cadeia que pertencemos? Trabalhamos duro para passar uma mensagem clara para nossas clientes e traduzir nossa verdade em cada passo da marca, em cada posicionamento. Então foi muito importante encontrar o equilíbrio entre a venda de forma consciente e a priorização da saúde física e mental de todos ao nosso redor.

    Tivemos a intenção de colaborar para que produtores locais também pudessem atravessar esse momento de forma saudável, mantendo seus negócios de pé. Por isso, criamos a nossa Rede de Apoio, em que a cada semana apresentamos e divulgamos o trabalho de dois produtores, artistas ou marcas locais que admiramos e contamos um pouco sobre as ações e projetos que tem feito durante a pandemia, a fim de que mais pessoas pudessem conhecê-los e apoiá-los durante esse período.

    Além disso, montamos uma grade de conteúdo focada em assuntos relevantes, que trouxe o trabalho de mulheres que admiramos, como conteúdos inspiradores para este período. Foram criativas de diversas áreas, entre artes, moda, música, literatura e cinema que além de mostrarem seus trabalhos autorais mais recentes, traziam sua visão através da curadoria dos conteúdos que mais agregaram em suas trajetórias. Chamamos de Haight Convida.

    Nos debates e reflexões internas entendemos também que há urgência em uma mudança estrutural e de uma ruptura do ritmo e forma que as coisas eram levadas. Precisamos de um novo caminho mais democrático e mais colaborativo. Criar ambientes mais diversos, praticar responsabilidade social e sustentabilidade são obrigações – e mais do que nunca, precisam acontecer em maior escala. E temos que começar a executar essas mudanças agora.

    Sobre pensar em desistir ou mudar completamente tudo:

    Mudar de carreira ou fechar o negócio, não. Mas mudar minha rotina de vida, o fluxo de trabalho e as prioridades, com certeza. E claro, levar isso para toda a empresa. Nós, como donos de marca, acabamos vivendo em função dela quase que 24h por dia, o que se intensifica ainda mais em um período de crise. Costumava dizer que abrir uma marca não é apenas uma escolha de carreira, mas uma escolha de vida. Eu vinha em um piloto automático onde o trabalho, os desafios, os passos de evolução e os problemas relacionados a ele dormiam e acordavam comigo e na maioria das vezes a atenção a uma rotina saudável ou até à minha vida pessoal ficavam em segundo plano. Com essa ruptura e pausa obrigatória, eu consegui pela primeira vez em muito tempo desligar a cabeça do futuro e olhar para o momento presente. Apesar de todas as incertezas de tudo que estava acontecendo no mundo, na sociedade e no mercado, do desafio de entendermos caminhos para sobrevivermos, entendi a necessidade da mudança de ritmo, da atenção aos reais valores de vida. Desde estar mais próxima (mesmo que à distancia) dos meus amigos e família, à importância de olhar para dentro de verdade, cuidar de mim e do entorno, seguir o que eu de fato acredito.

    Não vou dizer que consegui fazer isso desde o começo do isolamento, ainda estou no processo de transformar minha rotina. Mas sem dúvidas, todas essas reflexões foram fundamentais para entender essa necessidade. E tivemos que ser criativos para encontrar soluções e nos adaptar ao momento, o que é sempre um processo super enriquecedor.

    O mais incrível foi enxergar com clareza como transmitir esses valores de forma prática para a empresa. Nunca estive tão próxima da minha equipe. Foram inúmeros debates e reflexões juntos. Nossas trocas tem sido ainda mais frequentes e valiosas. Pude olhar de fora para dentro da empresa. Entendemos a necessidade de acelerar mudanças e projetos super importantes internos e com o entorno, que já estavam mapeados e ainda não tinham sido colocados em prática.

    Tive a sorte de ter um time incrível e extremamente dedicado, que desde o primeiro dia de isolamento estava focado em entender o cenário e trazer soluções para passarmos por essa crise da melhor forma possível. Tivemos uma grande união de esforços, dedicação à novas rotinas, adaptação de estratégias e muitos debates. Me orgulho muito de todos eles e com certeza foram fundamentais para passarmos por cada etapa.

    “Agora precisamos colocar em prática. Buscar soluções para diminuir o impacto no meio ambiente, formas mais conscientes de produção e consumo, desenvolver produtos duráveis, garantir boas condições de trabalho em toda a cadeia produtiva, trazer outras vozes para dentro e ouvi-las de verdade”

    Sobre os impactos das questões raciais, socioambientais e socioculturais mais urgentes

    A transformação da estrutura em que vivemos é fundamental. Todos esses assuntos sempre foram urgentes, mas de alguma forma ganharam mais consciência durante a pandemia. Se houve um lado positivo nisso tudo, foi justamente o fato de mais pessoas se conscientizarem em relação a eles. Ouvirem outras vozes, entenderem reais valores e a urgência dessa transformação em conjunto.

    Mas agora precisamos colocar em prática. Buscar soluções para diminuir o impacto no meio ambiente, formas mais conscientes de produção e consumo, desenvolver produtos duráveis, garantir boas condições de trabalho em toda a cadeia produtiva, trazer outras vozes para dentro e ouvi-las de verdade. Buscar movimentos que tenham de fato impacto social positivo.

    Em relação às questões raciais, nós brancos, precisamos reconhecer verdadeiramente nosso lugar de privilégio e assumir nossa responsabilidade em sermos efetivamente agentes de mudança desse sistema. Trabalhar com criação e design é se relacionar com comportamento humano, suas diferentes perspectivas e culturas, se relacionar com o entorno.

    Como diz a Igi Ayedun, uma das mulheres que mais admiro no Brasil, “é impossível criar um novo projeto sem considerar outras perspectivas.” E tenho visto isso cada vez mais na prática. A partir do momento que diferentes histórias, experiências e visões se juntam, o resultado fica infinitamente mais rico. E nessa troca há muito aprendizado.
    Temos buscado cada vez mais trazer outros olhares não só para dentro da empresa e nosso time, mas também entre nossos colaboradores criativos.

    Na nossa última campanha Presente Expandido, recém lançada, convidamos duas mulheres e potências criativas que admiramos para mergulharem no nosso universo e trazerem suas visões em relação aos assuntos trabalhados na coleção, através de 2 shootings diferentes. Juh Almeida e Suyane Ynaya foram diretoras criativas das campanhas, responsáveis por toda a conceituação, aprofundamento e por cada escolha ligada ao projeto. Apesar das restrições do contexto atual, as criações eram livres: elas montaram suas equipes, desenvolveram narrativas e materializaram projetos baseados em suas vivências. Foi uma troca realmente incrível e muito enriquecedora para nós e o resultado não poderia ter sido melhor.

    A trajetória da mulher retratada nas campanhas está diretamente conectada aos aprendizados e ao momento que vivemos enquanto equipe e sociedade. Entendemos que agora seria a hora de aprofundar, realmente, as relações com o grupo. Pensar em formas melhores de ouvir, de estarmos presentes, dar espaço, convidar para perto. Ir mais longe e mais fundo. Foi um exercício da percepção, de fato. Temos certeza que vamos colher os ensinamentos deste projeto por muito tempo.

    Ainda temos muito a aprender e evoluir, mas estamos confiantes de que essas mudanças, trocas e novos movimentos vão nos ajudar a chegar onde buscamos.

    “o foco no digital foi fundamental para manter a empresa em pé, em um cenário de lojas fechadas”

    Sobre os planos de curto prazo

    Como falei, o foco no digital foi fundamental para manter a empresa em pé, em um cenário de lojas fechadas antes mesmo do decreto do governo. Tivemos a sorte de termos desenvolvido um site novo e mais robusto no ano passado e estarmos com a operação digital preparada para um momento como este. Acabamos acelerando também a versão global do nosso site, que estava prevista para o final do ano, e acabamos de lançar.

    Agora, com o retorno do funcionamento das fábricas, estamos correndo contra o tempo e calendário, para garantir a nova coleção em loja e fazendo apostas de tecido antecipadas, dado a falta de insumos para matéria-prima do cenário de hoje.

    Como você vê futuro da criação de moda?

    Agora acreditamos que as marcas precisam parar para repensar seus movimentos e entender como podem fazer parte dessa mudança. Precisamos trazer iniciativas que tenham de fato um impacto social positivo e entender o que tem que ser feito para a mudança de antigos padrões que não funcionam mais – e como nos adaptarmos na prática para o ideal em que queremos chegar.

    Na Haight, apesar de preocupados em manter a marca de pé depois que tudo isso passar, estamos ansiosos por todas essas mudanças. Tenho certeza de que as marcas e os consumidores irão se relacionar de outra forma, terão um outro tipo de conexão e troca, muito além do produto. Estamos com foco ainda maior em colocar em prática ou dar continuidade a projetos ligados a essas pautas que acreditamos.

    @haight_clothing

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