©Scott Schuman/Reprodução
Com o advento e democratização da internet e das câmeras fotográficas digitais, o mercado da moda se viu diante de uma drástica mudança: o foco, antes centralizado no que era apresentado nas passarelas, foi alterado para enquadrar também um sem número de aspirantes a ícones de estilo que, a bordo de produções dos mais variados gostos, passaram a disputar a atenção da mídia, eclipsando jornalistas, designers e até a tradicional “primeira fila” dos desfiles. Nos últimos cinco anos, o “street style” cresceu de tal maneira que hoje é quase impraticável a existência de um veículo sem uma seção dedicada exclusivamente ao fenômeno; o que dizer então de eventos do segmento sem blogueiros – e seus muitos flashes – na porta?
O street style pioneiro do “The Sartorialist” ©Scott Schuman/Reprodução
O que surgiu como uma ideia simples e despretensiosa tornou-se uma verdadeira indústria de dinheiro e fama “fácil”. Se há quatro anos aparecer no “The Sartorialist” era uma experiência única, hoje, com a semente do “street style” já bem irrigada, qualquer um que possua uma câmera fotográfica digital pode ter seu dízimo virtual. “A calçada é a nova passarela”, brincou a repórter Ellie Pithers em artigo publicado nesta terça-feira (06.03) no jornal britânico “Telegraph”. A reflexão acerca do fenômeno geralmente acarreta discussões extenuantes, já que é possível enxergar ângulos positivos e negativos na questão. Falar da democratização da moda soa clichê, já que os mesmos indivíduos que divulgam imagens de looks de rua se converteram quase que em editores, tamanho o súbito poder que têm em mãos.
Anna Dello Russo, “a sacerdotisa das calçadas” ©Tommy Ton/Reprodução
Os que estão por trás das lentes são os responsáveis por esta “revolução”, mas não são os únicos que se beneficiam da crescente força do “street style”. Quem era Anna Dello Russo, ou ainda Olivia Palermo, antes de serem “eleitas” por blogueiros como Bryan Boy ou Tommy Ton? A integridade de jornalistas como Suzy Menkes ou Cathy Horyn pode não ser tão atraente para o público que anseia por rapidez, mas a convergência entre imagem e conteúdo não é essencial também no mercado da moda?
O estilo dos convidados de um desfile é um espelho da identidade da própria marca: se, em uma apresentação da Hermès, é possível observar mulheres e homens em cores e formas clássicas, encontramos facilmente pessoas “à la Daphne Guinness” em eventos da Alexander McQueen ou Rick Owens. Isso é natural e sempre foi, desde a criação dessa forma de exibição de novas coleções, assim como o registro dos looks desses frequentadores. No entanto, com o número cada vez maior de blogueiros de “street style”, as semanas de moda estão se transformando mais em grandes plataformas para a fama, onde para aparecer é preciso usar o máximo de tendências em um único look. Já os mencionados blogueiros que, em geral, surgem de forma inesperada e abrupta, talvez estejam encontrando a tênue linha entre a fotografia e a indiscrição.
Miroslava Duma e Caroline Sieber ©Candice Lake/Reprodução
À parte às polêmicas, é possível divertir-se com a questão: no já mencionado artigo do “Telegraph”, Ellie Pithers elenca com muita ironia (“É tão simples quando você tem Miuccia Prada na discagem rápida”) os dez mandamentos do “street style” e ensina como conquistar a “notoriedade das calçadas”. Em primeiro lugar, a jornalista garante: “Faça de Anna Dello Russo sua messias”, e chama a italiana de “a sacerdotisa das calçadas”. Logo seguem dicas do tipo: “[Usar] três tendências ao mesmo tempo é garantia de colocar os flashes em ação”, “Cores brilhantes fazem boas fotos”, “Texturas sempre triunfam”, “Qualquer coisa com tachas ou ornamentada com joias ou cristais tem apelo imediato” e “Preste atenção aos detalhes [unhas, capas de celular, carteiras, tudo por ser fotografado]”. Até a sua profissão deve inspirar admiração, segundo Pithers: “Sua foto valerá muito mais se você for um fashion insider / uma “it girl” / uma atriz aspirante/ uma blogueira. Se você é um ninguém genuíno, invente um título”. Para finalizar, usar a marca Céline e ter bolsas grifadas são itens imprescindíveis: quem disse que dinheiro não pode comprar estilo, ainda mais na “blogosfera”?