Em 1999, a Supreme queria fazer sneakers. Eles não tinham ainda estrutura para produzir o seu próprio e foram atrás da DC Shoes para propor uma colaboração. O tênis foi lançado e vendido na loja da Supreme em Nova York, sem filas dobrando o quarteirão. Hoje, isso parece impossível, uma vez que qualquer novidade da Supreme causa barulho online e off-line. Mas o interessante aí é que esta foi uma parceria que surgiu de uma real necessidade de uma das marcas, mas que beneficiou ambas.
Colaboração não é algo exatamente novo. Nos últimos 15 anos já vimos parcerias entre marca de roupa e artista ou celebridade, fast fashion e luxo, luxo e esporte, moda e decoração, etc. O que tem ocorrido é uma profissionalização que atingiu seu ápice neste ano com colaborações de peso – leia-se muito buzz e, naturalmente, lucro.
As colaborações são maneiras fáceis de se comunicar com esse novo consumidor, que vê e faz tudo ao mesmo tempo e não é mais fiel ou influenciado por apenas uma ou outra marca. De quebra, ao se unir à expertise de empresas diversas, as marcas ainda mostram outras de suas habilidades ou facetas criativas.
Só em 2017, vimos Nike e Off White, numa das principais colabs do ano; Balenciaga e Crocs – a mais polêmica; Junya Watanabe e North Face; Sacai e Undercover em um desfile conjunto na semana de moda de Tóquio; Burberry e Gosha Rubchinskiy; Raf Simons e Peter Saville; Louis Vuitton e Supreme, que também causou.
Pegue por exemplo, o trabalho de Demna Gvasalia, da Vetements, que colabora com Reebok, Levi’s, Alpha Industries e até com o serviço de transportes DHL. Em janeiro, no desfile de Verão 17, eles apresentaram uma coleção que incluiu 18 parcerias, pegando o melhor de cada marca e inserindo nas peças a estética Vetements. A ideia por trás disso é exatamente o que fez a Supreme procurar a DC Shoes lá trás: se você não pode fazer bem, vá atrás de quem pode. Muito mais fácil e menos arriscado do que começar do zero. “Nossa primeira jaqueta de aviação que fizemos na Itália teve tantos problemas e erros técnicos que espero que ninguém tenha usado”, disse à Vogue US o CEO da Vetements, Guram Gvasalia. “Estava claro que a gente precisava da expertise da Alpha Industries, uma vez que nosso objetivo é fazer o melhor produto possível em cada categoria”.
A Alpha, criada nos anos 50 para produzir roupas para o Departamento de Defesa dos Estados Unidos, viu suas vendas aumentarem significativamente depois que Kanye West passou a usar suas jaquetas bomber, carro chefe da empresa. “Pessoas da equipe de Kanye nos ligaram antes da turnê Yeezus dizendo que ele queria jaquetas oficiais da tour para todos. Ele comprou 100 jaquetas e aplicou seu próprio logo”, conta ao WWD o CEO Mike Cirker.
Outra colaboração que fez barulho este ano foi a da Louis Vuitton com a Supreme – e por muitos motivos. Primeiro, qualquer coisa que a Supreme faz hoje gera grande expectativa, engajamento online e filas enormes na porta da loja. A Vuitton não é nova em parcerias criativas, muito ao contrário, mas a maioria delas aconteceu com artistas, tais como Stephen Sprouse, Takashi Murakami e Richard Prince. O que é novo na história da Louis Vuitton é buscar colaboração com uma marca que, apesar de não ser sua concorrente direta, fala com parte de seu público.
Uma história que também vale menção é a coleção cápsula que Gosha fez pra Burberry para o Verão 18. O estilista russo olhou justamente para um período em que a Burberry era negativamente associada aos hooligans e ao nouveau riche, no início dos anos 2000, quando jogadores de futebol e fãs passaram a usar a marca. O movimento ganhou o nome de chav culture (chav é um termo usado no Reino Unido para descrever jovens da periferia com postura agressiva e anti-social). Foi a maneira dele trazer uma imagem diferente para a grife.
As colaborações são um exercício de branding e de criação, e mais do que nunca, uma maneira de provocar e continuar criando interesse no consumidor. Hoje é mais difícil capturar a atenção sem criar algo que vire notícia e atraia o interesse das pessoas constantemente. “A maneira como a comunicação funciona hoje, você não pode simplesmente fazer uma coleção e esperar que as pessoas gostem dela por seis meses. Você tem que estar sempre ligado e as colabs são uma boa forma de fazer isso”, diz Alec Leach, editor digital do site Highsnobiety.
Mesmo que muitas colaborações funcionem como marketing para manter as marcas no radar, uma coisa é importante para que elas tenham sucesso: tem que ter verdade e ser uma troca significativa entre ambas.
E significado é a palavra de ordem para algumas parcerias que têm surgido e que vão muito além do produto, usando a moda como plataforma para o bem ou para conscientização de assuntos importantes. A marca Heron Preston se juntou ao Departamento de Saneamento de Nova York, primeiro criando uniformes para os funcionários e depois inserindo as peças em sua coleção oficial com a intenção de chamar atenção para as falhas da moda no tratamento de seu próprio impacto no meio ambiente.
A marca Telfar também fez algo parecido ao produzir os uniformes da rede de fast food White Castle. Ele é um estilista em ascensão que nasceu e ainda vive o Bronx e tem memórias do restaurante que frequentava perto da sua casa. Os funcionários da rede ganharam auto estima ao usar um novo uniforme criado por um dos atuais destaques da nova geração (vencedor do CFDA/Vogue Fashion Fund). A colaboração rendeu uma coleção cápsula que é vendida no site do estilista com 100% do lucro revertido para pagar fianças de jovens que estão no presídio Rikers Island – a fiança é de US$ 900 e quem não pode pagar, fica preso aguardando julgamento, mesmo se inocente.
Junte-se a isso o fato de que as culturas do hip hop e do streetwear têm cada vez mais influência na moda. Uma nova leva de designers que cresceram ouvindo rap e andando de skate, agora estão assumindo posições de destaque na moda, fazendo com que a indústria passe a trabalhar mais com essa abordagem criativa e colaborativa que sempre foi real no universo do hip hop.