Este conteúdo é parte da serie de entrevistas “O Estado da Moda, 6 Meses Depois”. Durante o mês de setembro vamos conversar com os personagens da moda brasileira (diretores criativos, estilistas, criadores de imagem, empresários) para entender a visão de cada um sobre o momento atual e sobre o futuro da moda, seu passado recente e o que funciona e o que não funciona mais. Que essas conversas possam apontar caminhos.
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Pedro Andrade lançou a Piet quando estava no último ano da faculdade, em 2012. Desde então tem feito um trabalho consistente usando elementos do streetwear e do sporstwear para dar uma nova versão às peças clássicas do guarda-roupa masculino. Estreou no SPFW em 2018. Em nossa conversa, por email, ele revela uma mudança importante no negócio e na marca.
Quando a pandemia começou, em março
Em março, logo que foi decretada a pandemia, eu estava fazendo o showroom da Piet no Japão. Em outubro de 2019 dei início ao processo de expansão internacional da marca, e em 2020, foi quando fiz meus primeiros showrooms em Paris, Milão, NY, Los Angeles e Tóquio. Haviamos acabado de abrir pontos de venda importantes como Luisa Via Roma, Selfridges, Isetan e estávamos prospectando que até agosto de 2020 estaríamos em 15 dos principais pontos de venda do mundo. Aparentemente eu estava no melhor momento já vivido em 8 anos de marca.
O que mudou nesses 6 meses
As mudanças foram acontecendo em etapas. Como a Piet sempre foi muito forte online, o fato dos lojistas terem brecado todos os pedidos não nos prejudicou tanto, pois no online as vendas dos primeiros três meses triplicaram e com isso conseguimos suprir a falta do atacado vendendo diretamente para o consumidor final. Como estávamos com a operação quase 100% online, reduzimos a carga horária dos funcionários e trabalhamos de home office, e o setor de logística operando uma vez na semana, intercalando os funcionários a fim de minimizar o risco de contágio.
Entretanto, durante a quarentena, fiz um exercício de olhar a marca e minhas criações como espectador, pois só assim eu conseguiria ver meus erros e acertos. Percebi então algo que foi muito duro no primeiro momento para mim. Apesar da marca estar vivendo seu auge, ela não estava levando para o consumidor final 100% do que eu acredito como designer, como empresário e principalmente como ser humano. Essa conclusão me fez repensar, e posteriormente a agir de uma forma radical. Ser designer de moda para mim sempre foi a forma que eu encontrei para me expressar como artista, para que eu pudesse levar um lifestyle de verdade para as pessoas que consumissem minhas criações, tocando as pessoas não só através das roupas, mas também através de valores. Sempre tive muito medo de virar uma marca que vende consumo desenfreado, de virar uma marca que “faz por fazer”, e eu senti que isso estava prestes a acontecer na Piet. A pior dor para um designer é não acreditar em seu próprio produto, por isso, eu deveria agir rapidamente.
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“Sempre tive muito medo de virar uma marca que vende consumo desenfreado, de virar uma marca que ‘faz por fazer’ “
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Sobre pensar em desistir ou mudar completamente tudo
Logo após essa dura conclusão, decidi colocar em prática um projeto que estava engavetado, mas que cairia como uma luva neste momento. Durante anos, muitos jovens me mandavam diariamente mensagens com dúvidas sobre criação, sobre como é ter uma marca no brasil, e o que eles deveriam fazer para não serem somente mais uma marca no mercado. Percebi que nos últimos dois anos, essas mensagens se intensificaram, então isso me fez sentir que eu poderia criar algo que colaborasse com a moda nacional de uma nova maneira.
No dia 4 de Junho, nasceu a M.I.L. (Mockup & Integration Laboratory). A M.I.L. é uma marca de lifestyle, que venderá produtos, mas também serviços. É um mix de escola, laboratório criativo e marca. Esse foi o primeiro passo do meu processo de mudança, foi a maneira que eu encontrei de conversar com os jovens sobre criatividade, originalidade, sobre cuidar do planeta, das pessoas e da indústria que alimenta seus sonhos, de uma maneira fácil, divertida e original.
Mesmo com o nascimento da M.I.L. , a “luz vermelha” da Piet ainda estava firme e forte em minha cabeça, foi então quando tomei coragem para colocar em prática a segunda fase de minha mudança. Durante 8 anos, coloquei a a Piet “respondendo” pelas minhas criações, e consequentemente isso me fez relaxar, e não forçar meus limites como criador. Eu queria mudar, não estava satisfeito com o que eu estava entregando, afinal, eu não estava sendo sustentável o suficiente, inovador o suficiente, e principalmente, autoral o suficiente. No dia 4 de Agosto, dia em que completei 30 anos, e dia que a M.I.L. completou 2 meses de vida, eu senti que eu estava pronto para concluir meu ciclo com o nome Piet, e começar um novo ciclo como Pedro Andrade. Sem um nome fantasia como escudo, essa minha nova fase, me puxa para meus limites como mente criativa e me faz criar coisas que até então sempre foram impossíveis de se concretizar na enquanto Piet. Decidi que a principal mudança da minha vida deveria ser feita no auge, e fiz.
Sobre os impactos das questões socioambientais e socioculturais mais urgentes
Sim. Sempre me preocupei muito com essas questões em minha marca e em minha vida. Me cobro muito, e tenho atenção redobrada ao tocar nestes assuntos, afinal, sou a figura do privilégio: homem, branco e hétero, por isso é meu dever procurar sempre não somente fazer meu papel de obrigação respeitando e entendendo todas as causas, mas também procurando diferentes formas de ajudar as lutas.
Sobre os planos de curto prazo
Continuo trabalhando em todas minhas marcas, pois já tenho lançamentos agendados até 2022. Me mudei fisicamente de escritório e voltamos este mês a trabalhar em nosso novo espaço. A M.I.L. abrirá suas portas na segunda quinzena de Outubro, e os produtos com a assinatura Pedro Andrade serão lançados no primeiro trimestre de 2021.
Como vejo o futuro da criação de moda…
Lindo para quem é flexível, duro para quem é duro. :)
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@pietcollection
@m.i.l.workshops