Nos últimos tempos, sua timeline das redes sociais pode ter sido invadida por conteúdos sobre Fórmula 1, corridas e motos. Com a moda não foi diferente. Em meio à temporada de desfiles Resort em diferentes locações, a Chanel optou por apresentar sua nova coleção em Mônaco, sede do mais famoso Grand Prix da Fórmula 1, e não por acaso. A nova coleção de Virginie Viard busca inspiração no universo do automobilismo, com macacões completos de corrida em vermelho e cinza sendo desfilados, junto aos bonés, com modelos que carregavam capacetes nas mãos como bolsas. Inclusive, uma mini-bag em formato de capacete também foi apresentada pela marca.
Mas a tendência não começou por aí, na temporada de Inverno 22/23, desfilada no início do ano, as jaquetas inspiradas no automobilismo e no motocross também tomaram conta do desfile da Balmain, junto a looks completos inspirados nesse universo, como vestidos e macacões. Mesmo na Dior, que sumariamente foca em vestidos mais românticos e rendados, alguma inspiração no universo biker, com luvas emborrachadas e esportivas também se fez presente. Por sua vez, a Ferrari também lançou sua própria marca de moda de luxo no ano passado, e vem apresentando coleções consistentemente desde então.
E é impossível deixar de mencionar Motomami, álbum da cantora espanhola Rosalía, que, com o primeiro single, SAOKO, traz um universo todo inspirado nas motos e no automobilismo, de forma bastante marcada e até caricata em alguns momentos. Como sempre, Rosalía estendeu sua estética para além dos materiais visuais do álbum e tem sido vista frequentemente com óculos escuros esportivos, além de carregar capacetes de moto para lá e pra cá.
No mais recente clipe do mega-hit de Jack Harlow, First Class, nossa Anitta também aparece como uma motoqueira destemida, de capacete e tudo – mesmo que a música faça referência à aviação. O último álbum de Charli XCX ‘CRASH’, também traz o conceito de uma batida de carro como catalisadora, uma referência que é frequente ao longo de sua carreira.
Vale dizer que as peças de corrida, automobilismo e motocross nunca saíram de moda, as jaquetas biker de couro sempre foram um grande símbolo de moda e peças-relíquia em brechós, com alta demanda e procura. Chamadas da jaqueta Perfecto, o item, criado em 1928 e muito utilizado por motoqueiros se tornou um ícone da cultura pop eternizado por Marlon Brando em 1953 e desde então nunca desapareceu, com idas e vindas. A peça se tornou ícone de clubes de motocicleta, de subculturas como o movimento punk e se tornou item essencial no armário de qualquer fashionista. Ou mesmo a motorcycle bag (2004), da Balenciaga, bolsa marcante de Nicolas Ghesquière para marca e recentemente reinterpretado por Demna na Le Cagole, que rapidamente se tornou uma das it-bags mais queridinhas e valorizadas da atualidade.
Não é surpresa, portanto, que na mesma temporada em que vimos inspirações no motociclismo e na Fórmula 1, o couro apareceu como um dos tecidos predominantes nas passarelas.
Parece que agora que esse tema está ainda mais presente no nosso imaginário e pode fazer uma invasão mais ferrenha e literal nos nossos armários. Mas, por que aqui e agora?
Existe algo muito atraente no universo do motociclismo e da corrida. A sensação de adrenalina de correr a altas velocidades com os cabelos aos ventos e a liberdade ligada aos clubes de motociclismo sempre foram alvo de admiração e configuraram por anos filmes de Hollywood – quem não se lembra do filme Easy Rider, do diretor Dennis Hopper, de 1969? – e clipes de música como expoentes da tão almejada liberdade e jovialidade do século XIX.
Falando de moda, no Inverno 2022/23, o Sportswear reapareceu como uma forte tendência, quase substituta ao streetwear, que foi englobado naturalmente na moda. Dentre os esportes reverenciados pelas marcas nessa temporada, estava a Fórmula 1 e o Motocross, ao lado de esportes como o Hipismo, Golfe e Tênis. Esses três últimos, tradicionalmente permeiam as referências estéticas de marcas como Chanel e Hermès, sendo alguns dos esportes mais tradicionais das altas burguesias e aristocracias do passado, quando grande parte das grifes que conhecemos hoje se fundaram.
Esses esportes são parte do universo dessas marcas, que se tornaram até simbologias do DNA delas, em peças como botas, chapéus e casacos. Já a Fórmula 1 também não é um esporte exatamente ligado às classes baixas, apesar de ter um apelo popular muito maior. Aqui, a Fórmula 1 e o Motocross aparecem ainda como esportes da alta-sociedade, reverenciados pelas grifes e pela alta-moda, mas com uma estética muito mais descolada e jovem do que os esportes tradicionais do “Old Money”, como o hipismo e o tênis, e o próximo esporte pela qual a moda está fixada.
“Quando olhamos os produtos oficiais da F1, eu não tenho tanto interesse. Os produtos oficiais não tem uma grande imagem de moda, é apenas um produto, e aí as marcas de moda vêm e vinculam uma imagem de moda para atrair esse público, como a Rhude, que uniu os dois em suas últimas coleções e colaborações” opina Harry Cioto, criador de conteúdo e aficionado por Fórmula 1 que tem postado com frequência sobre o esporte em seu Instagram “Por isso que isso normalmente acontece nas coleções de transição, como de Resort, com um viés mais comercial, e porque não dá para dedicar uma coleção principal a uma comunidade específica como a da F1.” continua, referenciando a coleção de Inverno 2021 da Rhude, que buscava inspiração no universo do automobilismo e das corridas e também na coleção masculina do Inverno 22, além de apresentar uma coleção cápsula com a McLaren.
Por sua vez, a Fórmula 1 também tem tentado de seu lado uma maior aproximação ao público geral e “furar a bolha do esporte” como bem afirma Harry Cioto. A própria abertura de uma marca própria por parte da Ferrari demonstra esse interesse, além de coleções cápsulas de equipes de Fórmula 1 com marcas de moda. Até questões mais mercadológicas, como o surgimento da Sprint Race, semelhante às corridas de domingo, mas aos sábados e de forma mais curta, buscando atrair outros públicos. Grandes eventos da F1, como o Grand Prix de Miami contaram com shows de nomes como Anitta e Kygo em um modelo quase Superbowl.
A receita tem tudo para dar certo. Existe um interesse tanto do esporte quanto da moda sobre essa vinculação, além de um appeal estético muito forte sobre o vestuário de corrida e motociclismo, que sempre existiu, mas ganha contornos mais literais agora. Se antes usávamos biker jackets como itens de moda, sem pensarmos sobre sua história e significado, pode ser que daqui para frente vamos buscar macacões de corrida e jaquetas de motocross com logotipos de equipes de corrida. Veja bem, até Juliette postou uma foto de capacete, sobre uma moto e com a legenda “Motomami” nos últimos dias.