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    FFW ENTREVISTA: o Estilista Antonio Castro da Foz

    O jovem designer fala sobre saudade do mar, bairrismo, trajetória, processos e sua próxima coleção, que será desfilada na SPFW

    FFW ENTREVISTA: o Estilista Antonio Castro da Foz

    O jovem designer fala sobre saudade do mar, bairrismo, trajetória, processos e sua próxima coleção, que será desfilada na SPFW

    POR Vinicius Alencar

    Antes mesmo de conhecer Antonio e a Foz, eu a imaginei por alguns segundos, enquanto tocava o cobogó do artesão Eduardo Faustino, que fez as vezes de convite para a abertura da loja, localizada na Galeria Metrópole, em São Paulo. As sinuosidades vazadas entregavam esse olhar terrestre, poético e íntimo. Semanas depois, fui ver de perto e, ao conhecer Antonio pessoalmente, tudo se confirmou e expandiu.

    Não há espaço para impessoalidade, ele recebe, troca, olha nos olhos, sorri e fala sobre processos com naturalidade, sem afetações ou com termos rebuscados – o que, em nenhum momento, diminui a sensibilidade e entrega vistas em seu trabalho. Da porta para dentro, ali, o tempo passa ao seu modo e irradia uma presença solar, que não queima, mas aquece. Na sequência, falamos de diversos assuntos que foram da sua formação até sua a estreia física na SPFW, que acontece em novembro, com a coleção Alambique Fantasia.

    Qual sua idade? Onde nasceu?

    Tenho 28 anos, nasci em Maceió, capital de Alagoas. 

    Como iniciou ou descobriu sua relação com a moda?

    Acho que como toda criança que se sentia desencaixada na escola, o campo da criatividade sempre foi um espaço de conforto pra mim. Explorei diversas possibilidades durante minha infância onde imaginação e criatividade eram meu lugar seguro, até encontrar as ferramentas que me levaram até a moda, ali por volta dos 13 ou 14 anos que vieram muito carregadas das descobertas da adolescência e da expressão da minha identidade através das roupas, aliado ao fato de vir de uma família onde todas as mulheres tinham suas próprias máquinas de costura em casa, era como um eletrodoméstico comum, a gente tinha geladeira, liquidificador e uma singer doméstica que era da minha mãe, assim foi natural explorar esse lugar. No início, muito em uma investigação pessoal de como traduzir como eu me sentia através do vestir, vivendo em uma cidade com pouca oferta em informação de moda, as revistas passaram a ser minhas melhores amigas e a acompanhar meus livros de escola dentro da mochila.

    Qual a sua formação?

    Sou designer de moda por formação, graduado no Centro Universitário Senac aqui em São Paulo, turma de 2018 e pós-graduando em Empreendedorismo e Gestão pela PUC-PR.

    E quando a Foz ganhou vida?

    Eu digo que a Foz é um desdobramento maduro do meu projeto de TCC. Durante os anos de faculdade tive essa aproximação com os traços culturais do lugar de onde eu venho, numa tentativa consciente de olhar de fora a minha bagagem e o repertório que me fazia diferente dos meus colegas de sala. Um dia visitei uma exposição no Museu A Casa aqui em São Paulo e dei de cara com uma frase escrita na parede que dizia “Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia”, entendi ali que olhar para o lugar de onde eu venho, para a história da minha família e do meu lugar seriam de fato o caminho pra descobrir quem eu era enquanto designer. Nesse ponto, eu já tinha uma afeição pelo feito à mão, ainda que nos ateliês do Senac onde executava os projetos das aulas, mas também das experiências em estágios como no trabalho que desenvolvi dentro do ateliê da Fernanda Yamamoto na coleção Histórias Rendadas (junto as artesãs de renascença do interior da Paraíba), assim as coisas começaram a se costurar e eu fui entendendo onde se guardava minha paixão na moda, que ia além da roupa e sendo somente ela não fazia mais sentido pra mim. A Foz só vem surgir alguns anos depois da minha formação, depois de algumas experiências no mercado e já trabalhando com artesanato e design, mas sinto que ela começou a se formar ali naquela época. 

    Você sempre que nos falamos, mesmo em momentos informais, sempre fez associações entre a moda e outras áreas, como o design e a arquitetura. O que eu acredito que se reflete muito no trabalho final, não?

    Muito! Acho que se tornou natural pra mim porque foi para esse lugar que eu direcionei meu trabalho após sair da faculdade de moda, então de fato meu repertório profissional é 100% no campo do design, decoração e arquitetura, minha formação profissional foi através de muita convivência com arquitetos, designers de produto, artesãos e editores de revista de decoração, então acho que tenho essa herança muito forte comigo no dia a dia da produção. Tenho certeza que isso influencia demais não só meu processo criativo mas também minha metodologia de trabalho no escritório e no ateliê. Acho que naturalmente crio essas associações porque quero entender a moda como um braço do design, assim como todas essas outras áreas também são. Sinto que o mercado da moda historicamente se apartou das outras expressões de produto e se isolou nesse caminho, o que tento fazer é através do meu trabalho e das relações profissionais que estabeleço com ele, criar essas pontes entre o fazer de moda e os outros fazeres do design. Sinto que meu cliente é essa pessoa, que transita entre todos esses universos, que não necessariamente é apaixonado por moda mas busca um produto que dialogue com as outras expressões criativas da própria vida.

    Curioso que você optou por escolher um ícone bem paulistano para a primeira loja, né? Sei que já falamos sobre, inclusive na abertura, mas poderia nos dizer o motivo da escolha ser a Galeria Metrópole?

    Acredito que foi um encontro orgânico meu com a Galeria, eu moro no centro desde que me mudei pra São Paulo em 2014 e passava na porta da Galeria todos os dias no caminho da faculdade. Quando eventualmente entendi que era o momento de ter um espaço físico para a marca, naturalmente comecei a procurar pela região, entre o Ed. Louvre e o Copan, até que um dia entrei na Metrópole para visitar a exposição de um amigo na semana de design do ano passado e dei de cara com esse espaço, junto a um movimento de reocupação que se iniciava na época, principalmente por parte de escritórios de design e arquitetura.
    Acho que minha escolha por esse espaço na verdade tem muito a ver com o movimento de valorização de um patrimônio histórico tão importante, que é muito da forma como enxergo o que faço na criação do produto da Foz, quando incorporamos técnicas e saberes tradicionais do artesanato brasileiro que são patrimônio cultural do Brasil. Trazer iniciativas criativas para um espaço como esse é uma maneira de buscar relevância comercial e gerar tráfego em um espaço que por muito tempo foi marginalizado por políticas públicas irresponsáveis. Traço essa escolha como um paralelo ao trabalho da marca nesse movimento de buscar relevância contemporânea e comercial a técnicas e produções artesanais que no processo de industrialização do Brasil foram esquecidas ou que enfrentam dificuldade para permear as necessidades do consumidor contemporâneo.

    E ao se mudar para São Paulo, o que mais te atrai na cidade ou gosta no seu dia a dia? E o que mais sente saudade da sua cidade-natal?

    São Paulo me abriu um leque de possibilidades que nunca estiveram disponíveis pra mim vivendo em Maceió, acho que para o resto do Brasil em geral. A liberdade de ir e vir aqui e a forma como as pessoas transitam pela cidade é muito particular dessa cidade, ao mesmo tempo o ritmo não me contamina, vivo uma vida muito tranquila com uma rotina muito pouco paulistana, durmo cedo e acordo cedo, gosto de ficar em casa e saio muito pouco, acho que a cidade me ensinou a ser muito bairrista, que é um comportamento bem comum aqui no centro. Quando a saudade, sem dúvida o que mais sinto saudade é do mar, falo sempre que sinto saudade de olhar pra frente e ver o céu, naquela linha do horizonte onde mar e céu se encontram no infinito, aqui a gente não tem isso, pra ver o céu tem que olhar 90º pra cima.

    Como você descreve o consumidor da Foz? São mais homens, mais mulheres? 

    Sinto que venho conhecendo nosso cliente com o passar do tempo e a cada coleção me sinto mais íntimo dele(a), mas ainda é um processo e gosto que seja assim. Como começamos no online e em um período de pandemia ainda muito distante do contato físico, essa imagem do cliente da marca foi muito abstrata por algum tempo, em um imaginário de quem eu queria atingir mas não necessariamente quem de fato acessava o produto. Aos poucos passei a entender melhor quem era o nosso cliente, por onde ele transita, quais seus gostos pra além do que veste, mas muito disso veio com as experiências de venda física, a princípio com as lojas e eventos parceiros que abraçaram a marca e mais recentemente com o espaço na Metrópole, que justifica muito da escolha do lugar por identificar nosso cliente já transitando por esse espaço.

    Hoje entendo que quem compra nossa roupa é alguém apaixonado por cultura popular, expressões criativas do povo brasileiro que vão da arte ao design passando, claro, pelo artesanato, não necessariamente alguém ligado a moda ou que consome informação de moda, mas que entende a roupa como uma expressão de design e escolhe por vestir marcas que comunicam seu estilo de vida e as bandeiras que levanta. Percebo que nosso cliente entende o tecido que usamos, as escolhas de acabamento, valoriza o corte das peças e tem uma espécie de mistura de bom humor com espírito solar, uma essência que é muito do que as peças que fazemos carregam. 

    Você revelou também que estreia de forma física no SPFW no final do ano. Como está sendo isso? 

    Tem sido intenso! Sem dúvida é um momento muito importante pra marca e queremos entregar uma apresentação que realmente traduza nosso universo na passarela. Muito da construção da loja e da forma como pensamos cada detalhe, das araras a cor do chão, é como meu processo de execução das coisas acontece, então quero levar pra passarela um pouco desses elementos que contextualizam a coleção para além das roupas. Claro que muito disso ainda está em planejamento e numa fase muito prematura de execução, então vamos ver como tudo acontece até novembro [risos]. O que posso garantir é que será uma coleção mais madura, com mais experimentação no corte e na modelagem que sempre foi uma paixão minha mas que na execução comercial das coleções acabou ficando um pouco de lado para dar espaço às interferências têxteis (bordados, rendas, etc.), a coleção se chamará “Alambique Fantasia” e falará da cultura da cachaça como efeito colateral da cultura da cana no Brasil, pra mim é uma maneira de olhar pra formação do Nordeste por um viés lúdico que brinca com os signos da cachaçaria popular através das técnicas artesanais e das estampas que criamos a cada coleção.  

    Se tivesse que descrever a Foz em uma palavra, qual seria?

    Acho que despretensiosa, não só no tipo de roupa que fazemos mas na forma como levantamos temas e narrativas através das coleções. Eu gosto de dizer que faço roupas pra se usar nos sábados pela manhã, acho que quem compra meu produto vive nesse estado de espírito permanente, é roupa feita pra vestir sem grandes pretensões nem grandes ocasiões, sem muitas preocupações, pra deixar o corpo respirar e movimentar. 

    E, sei que muito se fala sobre processo criativo, mas como você lida com o seu?

    Do meu jeito bem capricorniano [risos]. Acho que o processo criativo é mais uma etapa do trabalho, tento não sucumbir a ele e entender que é só mais uma ferramenta pra viabilizar meu trabalho. Falo sempre que a Foz é o emprego que eu procurei no mercado e não encontrei, então criei ele pra mim, o que quer dizer que empreender nunca foi minha intenção, não tinha esse sonho, mas já que chegamos a isso então tento todos os dias trabalhar com objetivo de manter a marca funcionando como um negócio, por mim e por todo mundo que está envolvido nisso, das costureiras as artesãs. Vejo o lado criativo como o processo que acontece nos intervalos do dia a dia, estou sempre atento às ideias que atravessam minha cabeça pra conseguir capturá-las no momento certo e eventualmente me dedico a isso por um bom tempo, mas também sou bastante pragmático na rotina da empresa pra não me apartar das necessidades básicas do negócio, dos prazos e das etapas de produção, pra quando necessário, também tomar decisões que acabam por interromper o lado criativo pelo bem dos outros processos, assim vou tentando encontrar esse equilíbrio. 

    E dentre tantos sonhos se tornando concretos, quais você ainda está prestes a realizar e pode nos contar?

    Para mim é ver a consolidação da Foz como uma marca de moda, tem sido uma experiência muito bonita. Sempre tive esse receio de não ser entendido como uma marca de moda pelo tipo de produto que fazemos, pela relação direta com o artesanato. Ver como estamos permeando o mercado e conseguindo trilhar um caminho paralelo ao design junto a iniciativas que já fazem essa ponte entre design e artesanato nos abraçando no processo, mostra que o trabalho está sendo compreendido e absorvido pelo mercado, esse sempre foi meu objetivo. Em outubro estaremos no circuito da Semana Criativa de Tiradentes, iniciativa de Simone Quintas que promove esse intercâmbio entre artesão e designer pra dividir experiências com o trabalho junto a artesãos. É um trabalho diário e de consistência que vai construindo aos pouquinhos a imagem da marca como a imagino, mas acho que estamos no caminho e espero que no futuro a Foz possa ser compreendida como uma iniciativa que, junto a muitas outras, contribui para construção da nossa moda nacional com a abordagem que acredito ser nossa missão.

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