Por décadas, o mercado inventou e construiu artistas pop com características bem marcantes: meninas lindas, femininas e sexy com suas roupas curtas e coreografias sensuais, perfeitas cheerleaders. Os meninos eram fortes e sedutores, sem fragilidade aparente.
Cenas como a em que Britney Spears pedia “hit me baby one more time”, vestida como uma Lolita colegial, hoje parecem tentativas preguiçosas de emplacar alguém apelando à uma única lógica de gênero.
E quando há cansaço na repetição, há também espaço para outros comportamentos surgirem, como é o caso da moda sem gênero que tem tomado passarelas, comércios e ruas mundo afora.
Todo movimento tem seu porta-voz, e Jaden Smith certamente fala para essa geração que se recusa a ser um estereótipo. O ator de 19 anos também passa por uma transição: de filho de estrelas de Hollywood a miniator prodígio e criança mais rica do mundo para um dos embaixadores de um novo momento da identidade de gênero. “Desde muito pequeno eu me questiono: quem criou todas essas regras? Quem estava aqui e inventou tudo isso? Porque posso pensar que sou tão esperto quanto eles e não necessariamente concordo com essas condições que eles impuseram”, disse Jaden em uma entrevista à FFWMAG.
Ao aparecer vestindo roupas femininas na campanha da Louis Vuitton Verão 16, com as modelos Jean Campbell, Sarah Brannon e Rianne Van Rompaey, Jaden e sua imagem de menino dos “novos tempos”, seguido por quase 5 milhões de pessoas no Instagram, ganharam força e o colocaram na ponta desse movimento. “Smith representa uma geração que assimilou os códigos da liberdade, livres de manifestos e questões sobre gêneros. Usar uma saia é tão natural para ele como para uma mulher”, disse Nicolas Ghesquière, diretor criativo da marca.
A roupa sempre foi parte importante para comunicar a identidade de uma pessoa e, ao usar saia, vestido ou flores atrás da orelha, Jaden só reafirma que gênero e sexualidade não têm o mesmo significado que tinham há dez anos. Masculinidade é algo bem mais flexível hoje. “Em relação às normas de gênero, acredito que não há mais necessidade de fazer distinções, mas as pessoas simplesmente não entendem isso. Eu não vejo roupas de mulheres e de homens, eu vejo apenas pessoas com medo e pessoas confortáveis com elas mesmas, fazendo do que gostam.”
Uma das estrelas da série The Get Down, da Netflix, Jaden sempre flertou com a moda por achar que é um campo aberto para experimentações. “Gosto de me divertir com a moda. Você tem que testar, sentir-se tranquilo fazendo coisas com as quais as pessoas não concordam e se sentir confortável em fazer coisas em que pode eventualmente falhar. No universo da moda, sinto que posso expressar tudo isso.”
Jaden é um dos jovens mais estilosos hoje e considerado um ícone não binário, termo em que se encaixam outras identidades de gênero que não sejam exclusivamente homem ou mulher.
Não é o caso dele. Jaden é um menino e namora uma menina (Sarah Snyder), porém discorda que tantas regras ainda sejam necessárias para definir quem somos. “A forma como me visto é apenas uma maneira de expressar como me sinto. E todos os dias posso mudar o que sinto em relação a mim e ao mundo. Então, faço o que tenho vontade e tenho orgulho de mim mesmo por isso”, diz. “Espero que, em uns cinco anos, quando um garoto for para a escola usando saia, ele não apanhe e as outras crianças não briguem com ele. Estou carregando o peso disso agora para que os meus filhos e as crianças das gerações por vir possam achar isso normal.”
Essa é uma questão que ainda tem vida longa, mas a semente já foi plantada: como as pessoas incorporam seus gêneros em um momento em que o significado disso está mudando tão rápido? Para Jaden, ser honesto com você mesmo já é uma conquista. “Acho que acabo sendo uma influência para as pessoas que estão ao meu redor. Posso desfrutar de trabalhos diversos, com pessoas diferentes, mas sempre sendo eu mesmo. Essa foi a melhor lição que aprendi com meus pais: ser eu mesmo, a qualquer custo, não importa o que os outros pensem.”
+ Direto da FFWMAG
Entrevista com Eduardo Berliner
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