“A altacostura é um negócio que nunca vai ser autossustentável do ponto de vista do capital”, explicou Erwan Rambourg, um analista financeiro do grupo HSBC, ao jornal britânico Daily Telegraph.
A declaração vem em boa hora: com a ruína iminente do império criativo de Christian Lacroix, o mercado da moda volta a debater o papel da altacostura sob uma ótica mais realista e menos sonhadora. Das 100 maisons de haute couture que existiam nos Anos 40, somente uma dezena sobrevive, com extrema dificuldade, nos dias de hoje. Para Rambourg, “investir na altacostura é muito parecido com investir em propaganda e marketing: se não houver uma boa retaguarda, não funciona”.
“A altacostura como um negócio rentável é algo que não existe há muito tempo. Hoje ela funciona como uma manifestação da moda que se aproxima do universo das artes”, completa Jean-Jacques Picart, co-fundador da grife Lacroix e que hoje trabalha como consultor para o grupo LVMH (Louis Vuitton Moët Hennessy). Para Picart, a altacostura deve ajudar na venda de subprodutos, como acessórios e perfumes, mas nunca ser o core business da grife. “Em 2009, a Lacroix vendeu 70 vestidos de noiva – todos de altacostura – a um preço médio de €35 000/cada. Mas isso nem de longe basta para sustentar uma linha de haute couture”. A maior evidência? Só em 2008, Lacroix apresentou perdas da ordem de €10 milhões.
O perfume “Angel”, da grife Thierry Mugler: se não fosse pelo sucesso comercial do produto, a marca teria encerrado seus negócios há muito tempo ©Divulgação
Sendo assim, para sobreviver, uma grife de altacostura deve operar no esquema de uma pirâmide: altacostura no topo, seguida das bases de prêt-à-porter, perfumes e acessórios. No caso de Lacroix, a bomba-relógio estava pronta pra explodir: o seu perfume, chamado de “C’est La Vie”, foi um dos maiores fracassos de vendas de toda a história. Sem o backup dos cosméticos e acessórios, o rombo deixado pela altacostura de Lacroix é como um buraco negro cuja força gravitacional engole todo o restante da grife.
Para Julie El Ghouzzi, diretora do centre du luxe et de la creation, “a altacostura deve ser tratada como a pesquisa e o desenvolvimento são tratados pela indústria tecnológica: o retorno não é imediato, mas o valor agregado ajuda a potencializar os produtos finais que são consumíveis”.
E o que será da grife de roupas Lacroix? Os especialistas indicam algumas saídas: encarar os mercados de nicho, como fizeram Thierry Mugler e Azzedine Alaïa; ou desenvolver uma linha de prêt-à-porter mais refinada, como faz Alexander McQueen. Do futuro imprevisível, resta uma certeza: se Lacroix não colocar a sua criatividade em prática agora, vai permitir que qualquer outro estilista copie seu legado e ocupe o lugar que ele ocupou, durante mais de vinte anos, no mundo da moda.
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