Vamos começar pelo fim: os modelos entram na fila final, circulando pelo vão interno do MASP: concreto, vidro, vermelho e Lina Bo Bardi. Os convidados aplaudem de pé e então invadem a passarela – celulares na mão – atrás das melhores imagens.

+ Veja a coleção completa aqui

Voltamos no tempo quando, em abril, vimos a estreia no SPFW da À La Garçonne, marca de Fabio Souza e Alexandre Herchcovitch, que trabalha a criação de suas coleções de maneira livre, aproveitando conceitos do upcycling, sem amarras, num exercício de renascimento e amadurecimento. Se no primeiro desfile eles apresentaram uma edição mais enxuta de sua então nova marca, desta vez decidiram mostrar todos os seus recursos e habilidades.

O olhar e a mão do Fábio

Ele não vê desfiles. Suas inspirações estão nas ruas e em fotos de 1930, 1940. “Detesto ver moda, só vejo street style”, diz em uma conversa no camarim. Seu processo de criação parte do vintage para depois ser misturado a informações novas. Fabio faz uma pesquisa de imagens enorme e participa do desenvolvimento das peças ao lado de Alexandre. Quando tudo está pronto, entra em cena o stylist Mauricio Ianês, que então interfere com o seu olhar. “Tem sempre um choque quando o stylist mostra a versão dele. Quando a gente cria a roupa, não imagina as peças combinadas e eu converso quando acho que um look está muito distante do que imaginei para ele.” Neste desfile, seis looks foram revistos para chegar na equação “agradou a todos”.

O olhar e a mão do Alexandre

Com toda sua experiência em 20 anos de marca própria, Alexandre sabe bem o que quer e o que não quer. E agora, se dá ao luxo de fazer um trabalho que mais parece um playground criativo, não fosse pelas responsabilidades que a À La Garçonne exige como marca relevante. Então, não são temas muito menos tendências que startam a coleção. As coisas acontecem de forma mais orgânica, como por exemplo, uma visita ao um brechó pode despertar ideias e desejos. “Essa é a história. Será um experimento a vida inteira, senão perde o espírito da marca”, conta. Herchcovitch usa seu know how técnico, seu conhecimento de tecido, modelagem e costura, para criar peças que misturam passado, presente e futuro e que são contemporâneas em qualquer lugar do mundo.

Inspirações

O esporte é uma das paixões de Fabio e também um dos combustíveis poderosos da moda recente. O motocross aparece com força, não apenas em jaquetas originais, mas em elementos como números e cores em camisetas e jaquetas. A dupla garimpou jaquetas vintage e fez intervenções de pintura à mão por cima, que na hora de vender, estão entre as peças mais especiais e caras. A pegada esportiva no geral é forte e aparece por todo o desfile, principalmente na forma como as peças são combinadas e misturadas a outras ideias de elegância. É muito mais uma questão de atitude. É engraçado notar que os looks masculinos se assemelham à forma como o próprio Fabio se veste, com calças amplas pretas e jaquetas. Revendo o desfile, vemos que de fato ele não tem um tempo, mas muitos deles.

Raridades

Foto: Agência Fotosite

Algumas peças são únicas pela forma como foram feitas. As jaquetas de couro são vintage e receberam pinturas manuais por cima. Vale destacar a pintura (linda) de um leão albino em uma jaqueta branca. No abrigo de neoprene (foto 7), foram usados pedaços de guipure vindos de um vestido de 1800. As peças com os pequenos florais são feitas de algodão suíço e sua delicadeza é quebrada com sobreposições e jaquetas vintage militar. No final, são os momentos mais especiais da coleção e que refletem 100% os conceitos da marca, de transformar roupas e tecidos antigos e misturar (ou não) a materiais e peças novas.

Parcerias

Um dos braceletes feitos em parceria com Hector Albertazzi. Foto: Agência Fotosite

A marca aumenta seu leque de parcerias. A Hering continua e amplia sua participação, fazendo não apenas moletons e camisetas, mas também vestidos e abrigos. Com a Colombo, os meninos desenvolveram a alfaiataria; com a Converse, os tênis; com Hector Albertazzi, fizeram joias a partir de sucatas que ele tinha em seu estoque. Uma foto que eu vi mostra um bracelete composto por mais de 5 peças. Não sabemos onde começa, onde termina, nem o que junta com o quê; virou uma coisa nova.  Foram 101 peças únicas feitas para o desfile. “Estamos indo para o que achamos que é o melhor de cada ramo. É um jeito novo de trabalhar e que tem funcionado para a gente”, conta Herchcovitch.

Trilha

O produtor Max Blum fez uma trilha só com hits pop cantados acapella. Diamonds e Umbrella, de Rihanna; Halo, de Beyoncé; Paparazzi e Alejandro, de Lady Gaga, e A Piece of Me, de Britney, estão entre as músicas tocadas. “Fabio queria música pop, então fomos conversando, alinhando até chegar nas versões acappella”, conta Max. E não foi fácil encontrar faixas com esse nível de limpeza. Ele acabou descobrindo gravações oficiais de estúdio que existem na internet. Escolha acertada, as vozes das cantoras preenchiam o espaço e, sem aquele bate-cola-dance-de-rádio, trouxeram poesia à apresentação.

Leila e Katia; estamos atrás do rapaz! Foto: Agência Fotosite

Turma nova

Casting hiper bem feito por Bill Macintyre, com novos rostos vindos de diversas agências, inclusive a Squad, que trabalha com modelos de perfis variados, e belezas particulares não aproveitadas pelas agências tradicionais. Vale destacar Beatriz Gimenez, que abriu o desfile, Leila Zandonai, que desfilou para a Prada na temporada passada, Katia, que está na nossa lista de aposta para a temporada, e Angelica Erthal, eterna preferida de Gloria Coelho que viu sua carreira renascer após desfilar e fazer a campanha da Prada. E não teve como não notar dois meninos negros, com beleza bem africana. Já estamos atrás de saber quem são, de onde vêm e para onde vão!

As peças chegam na loja da A La Garçonne a partir desta segunda (camisetas e moletons) e quarta (todo o resto).