Raquel Ferraz, 35, e Fernanda Veríssimo, 32, estão à frente da Yes I Am, marca de jeans que tem sido usada por meninas e mulheres de idades e corpos diversos e que gostam de vestir uma roupa que sustenta ou dialoga com uma causa.
A marca que começou há alguns anos atendendo em uma garagem de carro no bairro de Perdizes, hoje está em um dos quarteirões mais legais de São Paulo, que representa um novo varejo e uma nova cena de marcas nacionais. São grifes independentes e de nicho, que vai desde a masculina Cutterman & Co e a designer de joias Fabi Malavazi, à multimarcas super cool Casa Diária e a básica de qualidade Oriba.
No meio delas todas está a Yes I Am com sua decoração e atmosfera clean e intimista que nada lembra uma loja tradicional de jeans e suas prateleiras com calças empilhadas. “Às vezes você entra numa loja de jeans com todas as modelagens possíveis e ainda não encontra o que precisa”, observa Fernanda. Na Yes I Am ocorre o oposto: o foco é na cintura alta para todos os modelos, levando em conta diferentes alturas de cintura e abertura de pernas.
A dupla tem uma história de empreendedorismo, de duas profissionais que trocaram a segurança de empregos em grandes empresas grandes para iniciar sua própria história, com os altos e baixos que vêm com a liberdade. Hoje, mulheres do circuito cinema/música/moda usam os jeans da Yes I Am, que busca alinhar verdade, propósito e qualidade a um preço justo.
O FFW visitou a loja em uma tarde quente, pouco antes do Carnaval, para conversar com Raquel e Fernanda, que transformaram uma história de amor em um negócio bem sucedido e em crescimento. O escritório com visão para a loja faz com que elas mantenham a atenção em tudo o que acontece por ali.
Abaixo, Raquel e Fernanda falam sobre suas origens, os mercados de jeans e plus size, a importância de se posicionar e desmistificam as falsas verdades em torno da cintura alta.
Qual é a história de vocês pré Yes I Am e como foi esse encontro?
Raquel: Sou formada em moda e venho do de mercado de moda. Trabalhei como estilista em marcas de jeans grandes, como VR, Mandi e Reserva. Em algum momento senti que faltava um jeans básico com tecido de alto padrão e bom caimento. E também tinha uma desilusão com o mercado de moda, desde preço até pensar nos modelos de negócio vigentes: produção muito grande com muitos modelos para um público que você não vê com fornecedores que você não vê… Então você fica no meio de uma coisa fazendo o que pra quem? E a Yes veio fazendo esse sentido pra mim.
Daí você decidiu parar de trabalhar em empresas grandes para abrir sua marca?
Raquel: Comecei em 2012 já com o nome Yes I Am. A ideia era fazer roupa sem gênero, não só no jeans. Mas eu só fiz jeans a vida inteira. Então abri mão da história do roupa sem gênero porque a Yes começou a tomar forma como uma marca de jeans com caimento perfeito para o corpo da mulher brasileira.
E a Fernanda?
Fernanda: Sou formada em publicidade e entrei na marca em 2014. na época eu trabalhava em agência, mas comecei uma relação amorosa com a Raquel. Eu ajudava, dava uns pitacos até que comecei a me apaixonar completamente pela marca…
Raquel: Ela deixou de se apaixonar por mim pra se apaixonar pela marca (risos).
Fernanda: Até que entendemos que se a gente se unisse a coisa ganharia mais força.
Raquel: O universo do denim é muito rico, desde a produção, a lavagem, até social e culturalmente. É uma peça que veste absolutamente todo mundo. É fácil se apaixonar por esse universo.
Fernanda: E eu queria algo que fizesse sentido, abordar assuntos além da roupa, usar a marca como uma ferramenta para abordar outros assuntos. A gente inclusive se posiciona politicamente na marca. Cai seguidores, mas é isso.
Raquel: Às vezes a gente faz campanhas que não são as que alavancam em todos os âmbitos. A gente perde alguns seguidores? Perde.
Fernanda: Mas nunca tivemos interesse em crescer e ser conhecidos pela massa. Nosso caminho sempre foi crescer organicamente, passo a passo. E o que acho mais legal é que quem entra aqui e compra um jeans está buscando uma modelagem legal, mas também veste uma causa.
Raquel: O consumidor que vem aqui tem uma outra consciência.
Fernanda: 90% das pessoas que compram aqui sabe que a marca é construída por duas mulheres, sabem que começamos numa garagenzinha. Há três anos, a gente abria a porta da garagem, tinha que matar três baratas (risos). Era roots. Não tinha nem banheiro…
Essa garagem era onde?
Raquel: Na minha casa. Era uma garagem de carro, que da noite pro dia a gente fez acontecer e virar a nossa loja.
Quem era o público naquela época?
Fernanda: A gente recebeu o diretor da Topshop, que na época chamou a gente pra vender lá. Chegava madame, jornalista, gente da moda. Faz pouco tempo que eu e Raquel saímos da frente da loja, de atender os clientes. Até pouco tempo atrás nós duas fazíamos absolutamente tudo.
Por que Yes I Am?
Raquel: A parte mais difícil é nomear uma marca e, na vida, eu tive que me afirmar muitas vezes pra mim mesma, pra familia, pros outros. Então vem de uma afirmação que eu brincava pra muitas coisas: sim, eu sou! Hoje usamos como uma forma de empoderamento. Eu sou e eu estou o que quiser. A gente também começou a levantar bandeiras que fazem sentido pra gente como marca.
Por exemplo?
Raquel: Feminismo, empoderamento… Na nossa campanha atual fotografamos a Liniker e trouxemos uma palestra sobre gênero e diversidade pra dentro da loja. Somos uma marca feita por duas mulheres lésbicas e a gente tem que, todos os dias, se empoderar e lembrar disso.
E vocês acompanham a produção, buscam reduzir a quantidade de água e química?
Raquel: Muito. A lavanderia que usamos tem homologação, certificados e aproveita água de reuso. Desde o começo trabalhamos com a mesma fábrica com quem temos uma relação familiar. Nossos processos são reduzidos em produto químico, mas ainda tem um pouco.
Onde fica?
Raquel: Minas Gerais. É um polo pequeno com lavanderia e confecção. Todos os fornecedores que eu ligava quando abri a Yes, sentia um tom de deboche por parte deles. Eu falava: ‘oi, eu saí da coordenação da Reserva e estou abrindo uma marca de jeans’. Isso há sete anos, ninguém acreditava.
Fernanda: Não se falava em empreendedorismo. Hoje a história é outra.
Raquel: E temos uma linha de jeans 100% algodão. São peças que vão durar pro resto da sua vida. Nos anos 90, quando paramos de usar calça bag, veio a necessidade de usar o elastano. Então você entra numa loja de departamento que também vende jeans e vai achar uma calça que vai te vestir, mas ela tem muita borracha e vai perder essa forma com o tempo. O jeans 100%, que é aquele Levi’s, Lee e Wrangler que a gente comprava lá atrás, vai se adaptar ao seu corpo, não vai encolher e seu tempo de vida é infindável.
Fernanda: Quando a gente compra uma calça na Zara, Forever 21, etc, tem muito elastano, então não tem nenhum trunfo na modelagem. É uma legging jeans que vai se adaptar ao seu corpo. Só que elas duram muito pouco porque o elastano vai arrebentando.
Raquel: Nossa gama de 100% algodão tem uma calca pantalona, que é um hit da marca, e alguns cortes de modelo reto, que alonga o corpo e deixa o bumbum bonito.
Qual o tamanho da marca de vocês?
Raquel: Até um ano e meio atrás, quando chegamos na loja de rua, éramos somente a Fê e eu. Fazíamos tudo. Vendi o carro e comprei uma moto pra fazer as entregas.
Fernanda: Até brincavam porque era assim: abre a porta, tá lá a japonesa, tira o capacete, é a japonesa, entra na loja é a japonesa.
Raquel: Virei a caricata da marca (risos). Mas agora a gente tem um setor de financeiro e hoje estamos em seis funcionários. Em termos de modelagem, temos 15 modelos o ano inteiro em tecidos diferentes. E agora entramos com a parte de cima, que é a jaqueta tipo trucker, bem básica. A marca é muito atemporal, então não temos aquela necessidade de fazer grandes viradas de inverno e verão, mas claro que oferecemos produtos temporais, que é o shorts no verão e uma calça de veludo no inverno.
Vocês trabalham bem com e-commerce?
Raquel: A marca começou como uma loja online e até pouquíssimo tempo atrás era bem inexpressivo porque é difícil que alguém compre um jeans pela internet sem conhecer a marca. Mas nosso cliente é recorrente e hoje ele já conhece a modelagem e faz essa compra também online. Então atendemos o Brasil inteiro e queremos começar a vender fora do Brasil também.
Já estão pensando nisso?
Raquel: Sim. Em viagens de pesquisa em Nova York e Lisboa a gente entende que tem que estar lá e não é difícil chegar. Não sei se é uma loja própria ou multimarcas, mas a ideia é sair pro mundo e também atingir outras praças do Brasil. A gente tem uma concentração muito forte em São Paulo.
Fernanda: Ano passado nosso grande esforço em meta era crescer o e-commerce e conseguimos alcançar isso. Esse ano nossa meta é crescer no atacado e chegar em outros pontos do Brasil.
Estão em alguma multimarcas?
Raquel: A gente também vende na Shoptogether, além das nossas lojas física e online.
Como é a faixa de preço da Yes I Am?
Raquel: Aqui na loja um jeans está em torno de R$ 359. Uma das ideias era fazer um jeans democrático e hoje a gente vê que esse preço é um valor baixo e a gente se sacrifica muito internamente pra manter esse preço. Deveríamos estar vendendo acima desse valor porque a gente faz uma grade que vai do 34 ao 48. Você não encontra nenhuma marca de jeans com uma grade tão ampla, então para você picar a produção em tantos pedaços, ela encarece muito mais. Cada tamanho que a gente inclui, é uma conquista interna, porém pagamos mais caro, fazer uma grade ampla dessa gera mil problemas de estoque. A gente tem até o 48, mas o plus size começa a partir do 46 e a ideia é que a gente consiga subir mais. Somos bebê no plus size ainda, mas nosso plano é ter um corte pensado para uma grande que consiga atingir o maior número de pessoas possível.
E o plus size é um mercado forte.
Raquel: Fizemos uma pesquisa bem intensa e no final, as marcas não produzem porque acham que as pessoas não consomem; as pessoas não consomem porque as marcas não produzem e gera um ciclo ruim.
Fernanda: Existe estudo de modelagem pro plus size. Então uma marca que não tem esse foco dificilmente vai fazer. Quando começamos a aumentar a grade, começamos a aumentar na modelagem que já fazíamos. E não é assim que funciona. Deu tudo errado. Perdemos um monte de peças. Porque tem que parar, estudar o mercado, os corpos, fazer um estudo de modelagem. Então acho que há essa dificuldade por parte do mercado, mas também falta de visão e preguiça. O mercado tá ai, mas temos dificuldade de fazer com que as pessoas encontrem a gente.
Eu, por exemplo, nunca vi uma foto de uma menina com o corpo parecido com o meu de cintura alta. Então cria-se uma imagem viciada que a gente toma por verdade.
Raquel: A gente lida com mulheres o dia inteiro. Tem esse ideal, mas tem os distúrbios da imagem. eu não vejo o que você vê.
Eu não “posso” usar cintura alta.
Fernanda: Ao contrário.
Me explica essa conta.
Raquel: A gente tem uma falsa ideia de que cintura alta é para mulheres muito altas ou muito magras e a verdade é que a cintura cria uma perna, então alonga o corpo. O que talvez a gente tenha que encontrar é o tamanho de cintura pro corpo.
Fernanda: O que você não vai encontrar aqui é uma cintura muito baixa, mas temos diversas alturas de cintura e abertura de perna. e o jeans 100% algodão permite um trabalho muito bom de modelagem. venha experimentar, tenho certeza que vai encontrar a sua calça!
Yes I Am
Rua Artur de Azevedo, 1.295, Pinheiros, São Paulo