Uma maré de plástico que sobreveio uma praia paradisíaca foi a gota d’água para que a artista visual Renata Chebel, 34, e o cineasta Felipe Dall’Anese, 38, criassem a NU Cosméticos, marca artesanal de produtos de beleza e higiene pessoal, baseada em São Paulo. Com óleos, pasta de dente e esfoliantes feitos naturalmente e em pequena escala, a NU não apenas propõe-se como uma iniciativa sustentável de produção e consumo de cosméticos como também resgata um senso de comunidade, disponibilizando a venda de tais produtos apenas em feiras e sob encomenda e também incentivando as pessoas a fazerem seus próprios cosméticos. A delicadeza, simplicidade e o cuidado com o qual os produtos são feitos são traduzidos ainda na identidade visual e embalagens da marca, todas reutilizáveis.
Em entrevista ao FFW, Renata e Felipe contam sobre o surgimento e propósito da NU, o processo de desenvolvimento dos produtos e de suas embalagens e a importância da produção artesanal hoje.
Como surgiu a NU Cosméticos?
A NU surgiu naturalmente como um desdobramento da nossa consciência em relação ao que colocamos em nosso corpo: à medida que fomos nos preocupando em ter uma alimentação mais saudável, com menos alimentos processados, veio também a consciência da necessidade de cosméticos mais naturais, livres de químicos agressivos não só pra nossa saúde como também pro meio ambiente.
A pele é o maior órgão do nosso corpo e absorve os produtos que usamos. A mucosa dentro da nossa boca é super sensível e permeável. Com isso em mente, começamos a fazer nossos próprios cosméticos. Há alguns anos que já pesquisamos e usamos estes produtos. Os resultados são excelentes e estamos sempre buscando melhorar. Então a NU surgiu desse aprendizado e da vontade de dividir isso com amigos, e amigos de amigos e assim por diante.
Qual a filosofia da marca?
Cultivar a beleza e higiene pessoal de forma simples e natural, em harmonia com o corpo e o meio ambiente.
Como vocês desenvolvem, produzem e testam os produtos? Como se dá esse processo?
Os produtos surgem da necessidade de uso como, por exemplo, pasta de dentes ou bloqueador solar, que são de uso diário. Depois de muita pesquisa, testamos em nós mesmos e pessoas próximas que nos dão feedback. Assim vão surgindo as receitas. As matérias-primas que coletamos mundo afora em nossas viagens ou que adquirimos de produtores locais abrem sempre um novo mundo de possibilidades para nossos produtos.
As embalagens são lindas e podem ser devolvidas para reuso, certo? Podem nos contar um pouco sobre essa questão?
Essa foi outra questão que impulsionou a NU: o problema do lixo. Andando por uma praia paradisíaca no México eu me deparei com uma maré de plástico. Analisando todo aquele lixo eu notei que grande parte vinha de produtos cosméticos: garrafinhas de protetor solar, desodorante, pasta de dentes. São coisas que usamos constantemente pela vida toda. Imagina bilhões de humanos mensalmente jogando fora esses tubos de plástico. É um desastre.
A gente quer trazer consciência a respeito disso, utilizando embalagens de vidro que podem ser reutilizadas ou retornadas para que a gente possa reciclar. Nós também estamos tentando encorajar as pessoas a reutilizarem embalagens que elas mesmas possuem: você pode trazer aquela embalagem linda de um creme que já acabou e reutilizá-la para colocar sua pasta de dentes, por exemplo – sugerimos que você tente fazer sua própria pasta de dente também!
Quais são os produtos mais vendidos e quais as qualidades e eficácia deles?
Temos o Superóleo, um de nossos primeiros produtos, um óleo multiuso para pele e cabelos que tem em sua fórmula vários óleos brasileiros, como andiroba e copaíba, por exemplo.
Temos também o Pele Boa, um óleo facial. Resultado de uma longa pesquisa pessoal, tenho a pele mista, com tendência a ter muita acne e tambem a ficar ressecada algumas vezes. O que esse óleo faz é equilibrar a oleosidade da pele, trazendo ácidos graxos que faltam nas peles com acne e óleos essenciais com propriedades bactericidas, o que naturalmente vai harmonizando e deixando a pele mais bonita.
E finalmente nossa pasta de dentes. Sem adoçantes e detergentes, você acaba escovando os dentes por mais tempo: lembrando que qualquer pasta é apenas um cosmético, o que realmente importa é a escovação. Adicionamos então óleos essenciais que promovem hálito fresco e a saúde das gengivas.
Onde vocês vendem os produtos da NU?
Por enquanto vendemos em feiras e por encomenda. É uma maneira de mantermos as coisas simples e diretas. O foco é na economia de produtores locais, e gostamos de conversar com nossos clientes, queremos que eles testem os produtos e possam tirar suas dúvidas com a gente.
Também temos uma estrutura bem pequena e artesanal e gostamos que seja assim. Fazendo por encomenda garantimos que os produtos estejam sempre frescos, já que não usamos conservantes, emulsificantes e outros químicos usados pelos grandes players da indústria para otimizar sua produção e seus lucros, mas que não são necessariamente seguros para sua saúde.
A gente percebe um movimento crescente em torno de pequenos produtores e consumo de produtos artesanais. Há mais gente interessada em produzir e também em conhecer e consumir tais produtos. A que vocês atribuem isso?
Com certeza, somos parte desse movimento, tanto como produtores como consumidores, e por isso gostamos tanto de estar nas feiras. Como dissemos anteriormente, a grande indústria tem outra agenda que não prioriza sua saúde e a do planeta onde vivemos. Acho que com o acesso a educação e informação, as pessoas estão se tornando mais conscientes disso. O sistema precisa mudar, é insustentável ter tudo disponível em todos os lugares a qualquer momento. Incentivar economias locais é grande parte da mudança de paradigma pela qual teremos que passar pra sobreviver à crise desse sistema.
Há quem diga ainda que esse é o caminho mais sustentável pra tirar a gente de mais uma lama de coisas como consumo desenfreado e mau uso de tecnologia.
Tecnologia é muito importante e, na verdade a gente precisa é de mais e melhores tecnologias, que nos possibilitem fazer as coisas de forma mais eficiente, com melhor aproveitamento de recursos, expandindo nossa consciência para que nosso consumo também seja mais eficiente e significativo.
E esse caminho é também mais verdadeiro e humano: economias locais promovem um maior senso de comunidade, produtos feitos em menor escala permitem que a gente atinja a qualidade inigualável das coisas artesanais, feitas com paciência, carinho e atenção. E isso não tem preço!
Vocês tem planos futuros para a marca? Em qual direção estão caminhando com ela?
Queremos continuar como pequenos produtores, uma linha de produção definitivamente não está em nossos planos. Acreditamos no poder de fazer as coisas artesanalmente – arte!, por isso fazemos tudo em lotes bem pequenos. Um nunca é exatamente igual ao outro, não somos nem queremos ser como outras empresas com foco no lucro a todo custo. Queremos viajar mais, entrar em contato, absorver e remixar conhecimentos científicos com conhecimentos empíricos de outras culturas em busca de ingredientes e produtos cada vez melhores.
E também queremos incentivar as pessoas a fazerem ao menos alguns de seus próprios produtos e simplificarem seu consumo de cosméticos, então temos em nosso site uma seção de cuidados pessoais e em breve planejamos usar esse espaço como uma plataforma para dividirmos receitas e obtermos feedback de nosso clientes, para nos tornarmos uma espécie de laboratório open source.