Recentemente a Burberry anunciou que vai encerrar todas as suas linhas e, ao final de 2016, todos os produtos levarão na etiqueta apenas um nome: Burberry.
Se para alguns, a ação pode mostrar que a empresa passa por dificuldades, para o cliente parece a coisa certa a fazer. A Burberry, em muitas lojas, vendia no mesmo espaço todas as suas linhas: Prorsum, Brit e London. Mas não são todos os consumidores que entendem as diferenças entre elas ou até mesmo que sabem de sua existência. Eles entram na loja atrás da Burberry. “O comportamento do consumidor está evoluindo, seu estilo é mais fluído e isso se reflete na forma como ele compra”, diz ao “Telegraph” Christopher Bailey, CEO e diretor criativo. “Unificando todas as linhas, podemos oferecer uma experiência mais consistente”.
Compradora da Selfridges, Lydia King dá um bom exemplo. Em um evento na loja que tinha a Burberry como parceira, ela precisou ter um time explicando aos clientes o que era cada uma das linhas. “Você precisa prestar atenção se as linhas de difusão são reconhecidas entre os consumidores para que elas possam ficar de pé por conta própria. Senão simplesmente vão gerar confusão”.
O mercado mudou e hoje é imprescindível que as marcas enviem uma mensagem clara ao consumidor. Segundo Bailey, ninguém ligava para as linhas. “Nós acreditamos que isso vai tornar tudo mais simples para o consumidor. Não é uma mudança simplesmente cosmética. Para a gente, é uma mudança enorme”, disse Bailey ao BoF.
Pensando que Dolce & Gabbana e Marc Jacobs também encerraram suas segundas linhas, é mesmo o momento de se perguntar se elas ainda são necessárias ou até mesmo se há espaço para elas.
A ideia por trás das chamadas linhas de difusão, é vender roupas com tecidos menos exclusivos, com aparência mais jovem e preço inferior ao das linhas principais para atrair o consumidor que não pode comprar a marca mãe.
Por um tempo, elas funcionaram e chegaram até a ser essenciais para suas empresas. Mas hoje, se não tiverem uma estratégia própria, podem desaparecer em meio a tanta oferta de grifes que são originais e concorrem com elas por preço e público, como Alexander Wang e 3.1 Phillip Lim, por exemplo. Sem falar em gigantes como a Michael Kors, a Coach e nas colaborações com o fast fashion.
Ter uma segunda linha demanda planejamento, logística, equipes, comunicação e produção tão eficiente quanto o das marcas principais e o custo é muito alto. Só o fato de incorporar a marca menor na principal, já elimina uma estrutura grande com gastos pesados, como lojas espalhadas pelo mundo, estilistas, campanhas, desfiles e showrooms.
Então é fato que numa necessidade de enxugar, as linhas de difusão as primeiras a cair. Outro fato é que, hoje, com tanta concorrência, está mais difícil fidelizar o cliente, que não compra mais simplesmente porque a linha é da família da marca x. Ou seja, se custa caro e o consumidor nem percebe, qual o sentido de manter?
Em 2011, a Dolce&Gabbana anunciou que estava encerrando a D&G, lançada em 1994. “A linha se tornará parte da Dolce & Gabbana, emprestando ainda mais força e energia às coleções”, disseram os estilistas na ocasião. Dois anos antes, com a crise no mercado de luxo, as vendas já tinham diminuído 13%.
Em 2013, as estilistas Katie Hillier e Luella Bartley foram chamadas para dar energia nova a Marc by Marc Jacobs. As duas já trabalharam em marcas como Chloé, Luella já teve sua marca própria e são respeitadas da cena de moda. O primeiro desfile pareceu um sucesso, mas apenas dois anos mais tarde, a grife deixou de existir. Os produtos, que sempre tiveram um apelo mais comercial e bem jovem, passaram a ser incorporados à marca Marc Jacobs. Essa foi uma das mudanças que vem ocorrendo dentro da empresa sob o novo CEO Sebastian Sehl, que entrou em 2014. Hoje, as meninas têm sua própria marca, a Hillier Bartley.
A Marc by Marc é um caso de sucesso. Seus desfiles eram disputados e ficava claro que tinha uma personalidade própria, além de produtos desejáveis e com preços bem mais amigáveis. “Nós acreditávamos que a moda poderia existir em lotes de diferentes preços. Poderia ter chinelos por US$ 30, uma camiseta com bom preço; poderia haver uma honestidade e integridade em diferentes tipos de roupas. Não era para ser uma segunda linha ou o parente pobre. Estamos olhando para o que a grife era inicialmente e como se afastou dessa ideia. A maneira certa de fazer isso é embaixo de uma marca só”, disse Jacobs.
Com outras grifes ocorre o oposto. A linhas de difusão foram retrabalhadas e atualizadas para se manterem vivas neste mercado feroz.
Dona Karan deixou a empresa que fundou, a marca que leva seu nome foi fechada e a linha jovem DKNY ganhou investimentos com a contratação dos estilistas da descolada Public School, Dao Yi Chow e Maxwell Osborne, visando uma reviravolta. O primeiro desfile foi em setembro, na temporada de Verão 16 e dá uma pista do novo caminho que a marca vai tomar.
A Versus é outro caso de sucesso. A linha foi criada em 1989 por Gianni Versace como um presente para sua irmã Donatella. Foi encerrada em 2005, mas ressurgiu em 2009 com uma abertura para novos estilistas criarem coleções cápsulas. O primeiro foi o britânico Christopher Kane. Por lá passaram nomes respeitados como J.W. Anderson, a cantora M.I.A e Anthony Vacarello (atualmente diretor artístico da Versus).
Hoje a marca é conhecida como filha da Versace, mas tem vida própria e é usada por garotas da mídia, como Alexa Chung e Leighton Meester. O CEO da Versace Gian Giacomo Ferraris disse ao WWD que espera que a receita da grife em 2015 chegue aos US$ 41 milhões, quase o dobro dos US$ 21 milhões de 2014. Ao lado de Donatella, Ferraris criou um novo modelo para a Versus, menos focada em estações, mais atemporal e digital, com as roupas da passarela sendo vendidas imediatamente no dia seguinte, tanto no site quanto em algumas lojas selecionadas.
Este ano, a Versus abriu uma loja em Tóquio, uma em Nova York, no Soho, e outra em Paris, em Saint German, totalizando 22 lojas próprias.
A Emporio Armani, que nasceu no início dos anos 8o, começou como uma sub-marca da Giorgio Armani. As duas respiram o mesmo ambiente, compartilham uma mesma visão, mas têm uma divisão clara de estilo, público e faixa etária. Enquanto a Giorgio está posicionada no mercado de alto luxo, a EA fala diretamente com mais consumidores – e mais novos. Para isso, já contratou David e Victoria Beckham, Rafael Nadal, Cristiano Ronaldo e Rihanna para estrelarem suas campanhas. Recentemente, criou o Emporio Armani Sounds, um evento de música que roda o mundo com performances ao vivo e um aplicativo bem feito.
A Miu Miu foi reposicionada de segunda linha da Prada para uma marca irmã que hoje é independente, construiu uma estética própria e faz desfiles e campanhas tão bonitos quanto os da Prada. E tem muita gente que já prefere a Miu Miu. Esse é um excelente exemplo de um trabalho de construção de marca.
Tem lugar para vários tipos de business. O fundamental é enxergar as direções do mercado de antemão para poder atualizar os negócios em questão, seja a manutenção de uma linha de difusão ou sua incorporação pela marca mãe. Visão, planejamento e sangue frio para decisões e mudanças rápidas.