Nesta semana, foi anunciado pela VF Corporation, holding dona de 18 marcas de calçados e acessórios, incluindo Vans, The North Face, Timberland, Kipling e Dickies, que a empresa suspenderia a aquisição de couro brasileiro até que seja garantido o respeito às práticas ambientais de produção. “A VF Corporation e suas marcas decidiram não seguir abastecendo diretamente com couro e curtume do Brasil para nossos negócios internacionais até que haja a segurança de que os materiais usados em nossos produtos não contribuam para o dano ambiental no país”, diz o comunicado.
A suspensão teria sido motivada devido à repercussão internacional das queimadas na Amazônia e da possível associação dos incêndios com a indústria da pecuária.
A ação fez com que o presidente do Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil (CICB), José Fernando Bello, enviasse uma carta do Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles pedindo atenção especial ao caso. Porém, um dia depois, a CICB voltou atrás dizendo que a suspensão não ocorreu e que “está recebendo questionamentos sobre rastreabilidade dos animais, além de estar trabalhando a imagem do setor”, segundo O Globo.
Porém, jornais e sites do mundo inteiro, como New York Times e Reuters, noticiaram a suspensão por parte da VF.
Owner of Timberland, Vans stops buying Brazilian leather as Amazon burns https://t.co/kLdavx0Eu8 pic.twitter.com/CMaEIcJjXC
— Reuters Top News (@Reuters) August 29, 2019
Segundo a Reuters, a VF disse que retomará a compra de couro brasileiro quando “tivermos a confiança e a garantia de que os materiais utilizados em nossos produtos não contribuem para danos ambientais no país”.
De acordo com o CICB, o país exportou US$ 1.44 bilhões de couro bovino em 2018. Seus maiores mercados são Estados Unidos, China e Itália que, juntos, consumiram 60% da exportação do couro brasileiro em 2018. Marcas de luxo como Hermés e Gucci usam couro brasileiro em seus produtos.
Um estudo da ONG Global Canopy publicado no site internacional Mongabay, focado no meio ambiente, mostra que os principais varejistas e fabricantes de produtos oriundos do gado que buscam materiais no Brasil, podem estar usando carne e couro ligados ao desmatamento. A Global Canopy analisou as políticas de desmatamento de 43 empresas envolvidas no comércio de carne e couro do Brasil via China e descobriu que marcas como Adidas, Nike, BMW, General Motors e Volkswagen não conseguiram garantir que o couro que usam não era associado ao desmatamento. “O fato é que, em alguns casos, a situação de sustentabilidade na cadeia de suprimentos de couro não é satisfatória e, portanto, todos os atores envolvidos precisam continuar sendo responsáveis por promover melhorias”, diz o Dr. Günther Scherelis, disse o porta-voz da Volkswagen em um comunicado. “Nós reconhecemos essa responsabilidade e aumentaremos nosso compromisso e atividades nas próximas semanas e meses”.
Dos 15 importadores identificados, apenas três compraram produtos de fabricantes chineses que haviam assumido o compromisso de desmatamento. “É difícil entender por que algumas dessas empresas não possuem políticas – elas podem não estar cientes dos riscos ou podem não vê-las como prioritárias ”, disse André Vasconcelos, pesquisador da Global Canopy e co-autor da análise, à publicação.
O que acontece é que nem sempre a marca rastreia o couro que usa. O couro que é exportado para a China vira produtos de marcas não necessariamente chinesas e de diversos segmentos, de estofamento de carro a bolsas e sapatos. “Algumas empresas podem nem estar cientes de que poderiam estar comprando produtos vinculados ao desmatamento. Outras empresas estão claramente cientes de que possuem políticas para algumas áreas – mas não para todas as áreas de fornecimento”, diz André.
As commodities provenientes de áreas desmatadas ilegalmente no Brasil atingem os mercados globalmente por meio de cadeias de suprimentos complexas e que muitas vezes podem obscurecer sua rastreabilidade.
Ainda de acordo com os dados levantados pela Global Canopy, muitas empresas de mobiliário, como Ikea, também estão expostas ao couro ligado ao desmatamento. Muitas delas compram produtos de couro feitos pela fábrica chinesa HTL International Holdings, que compra de dois curtumes brasileiros sem compromisso de desmatamento. “É importante deixar claro que há uma diferença entre ter uma política e implementá-la”, diz André. “Vimos no passado como algumas empresas globais com políticas de desmatamento continuam a obter gado de áreas embargadas devido ao desmatamento ilegal, por exemplo. As empresas precisam garantir que eles tenham sistemas para implementar suas políticas, se quiserem fazer a diferença”.