Por Guilherme Meneghetti
Com certeza você já se deparou recentemente com algum trabalho do modelo britânico Wilson Oryema. Ele é um dos queridinhos de Grace Wales Bonner, um dos nomes mais promissores da moda britânica (que ele acredita ser sua irmã mais velha), cruzou a passarela da Maison Margiela e de marcas jovens da semana de Londres como A Cold Wall e Ashish, estrelou campanha da HUGO (linha mais jovem da Hugo Boss), Versus Versace e Calvin Klein, editoriais de revistas como Another, W e Pop, além do calendário Pirelli deste ano.
Na verdade, ser modelo é apenas uma parte do seu trabalho. O britânico de 24 anos foi mais um desses casos cujo foco não era exatamente trabalhar com moda, mas foi descoberto inesperadamente durante seu horário de almoço com uma proposta para ser modelo e os trabalhos foram acontecendo naturalmente. Ele era administrador de uma fundação de caridade em Stockwell, sul de Londres.
A caridade, aliás, é um de seus focos, que surgiu através dos pais: ambos ugandeses, hoje sua mãe vive em Londres e já trabalhou em instituições como Cruz Vermelha e Exército da Salvação e, seu pai, com quem tem menos contato, continua na Uganda trabalhando na área. “Acho que isso deu o tom para mim desde muito novo. Foi aí que fiquei sabendo o quanto as organizações realmente podem fazer por outras pessoas”, aponta ele, que já trabalhou no Fórum da Juventude dos Arquivos Culturais Negros, a fim de preservar a herança negra no Reino Unido, e também como influencer voluntário para a instituição Raise the Roof, que oferece assistência no gerenciamento de projetos administrados localmente no Quênia.
Com sua ideologia em mente na nova profissão, começou a desenvolver seu lado criativo, já que, segundo ele, foi o que a indústria da moda lhe trouxe. “Isso me dá muita inspiração criativa e motivação. Eu preciso estar perto de pessoas como designers e fotógrafos que vivem e respiram criatividade porque você consegue entender sua personalidade e seus processos”, diz ao The Guardian. “Na verdade, criar uma imagem é algo muito surpreendente. Isso me ajudou a entender como abordar minhas ideias com criatividade”.
Entender como lidar com suas ideias resultou, sequencialmente, num curta sobre sociedades matriarcais, num projeto em grupo que falava sobre ilusão do livre arbítrio e na exposição Wait – an elegant treatise on how humankind can wean itself off consumerism (Espera – um elegante tratado sobre como a humanidade pode se livrar do consumismo, em tradução livre), em que ele transformou lixo em mensagens que alertavam sobre as armadilhas que o nosso consumismo e desperdício podem causar. Seguiu, então, essa linha de raciocínio e escreveu o livro homônimo, um manifesto anti-consumismo com contos e poemas que trazem à tona as consequências do consumo humano em detrimento à poluição, dependência, hábitos destrutivos e dificuldade em diminuir o ritmo, tudo isso sendo abordado com suas respectivas complexidades – também, pudera, Oryema fez um voto de celibato 16 meses antes de começar a escrever o livro, a fim de levar todo o seu foco à publicação.
Se o perguntam qual é sua profissão, ele responde: “Escritor e artista”. Natural, portanto, que as pessoas o questionem como carregar esse discurso se, embora seja principalmente escritor e artista, também trabalha em uma das indústrias que mais polui. “Eu sou uma contradição humana”, brinca. “Até certo ponto, todos nós somos. Em todo caso, sou muito exigente com os trabalhos de moda que faço. Se não é uma marca que eu acredite em sua filosofia, recuso o trabalho, perco o cachê e tudo bem, isso não me causa problema”, conta. Afinal, ele não quer que sua imagem seja usada num espaço em que seus valores não são compactuados.
Acima de tudo, seu grande objetivo é trocar ideias. “Quero que tudo que eu faça seja para iniciar conversas. Quero que todos me digam o que pensam”, deseja. “Claro, não vou alcançar todas as pessoas do planeta, mas definitivamente sinto que as pessoas estão alienadas e não estão cientes do que está acontecendo”.